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20 DE JANEIRO DE 1995 1187

factor justificativo dos seus fracassos, da crise que tenazmente havia negado até para lá da evidência. Acolhesse agora ao frágil balão de oxigénio da retoma. Mas como esta ameaça não invadir tão cedo a dimensão conjuntural da crise, receia que a opinião pública lhe ponha o pé no tubo.
O seu raciocínio é, no fundo, este: uma nova vitória por maioria absoluta nas próximas eleições está fora de causa. Uma vitória por maioria relativa, ainda que teoricamente possível, será sempre um presente envenenado para quem se habituou a reger toda a orquestra e não apenas os violinos Quem quer que venha a ser a maioria, e o dono dela, o próximo mandato estará longe de ser uma rosa sem espinhos. Daí que, na perspectiva hamletiana, prosseguir infundado receio.
Decidido a partir - se é esse o caso - e sem uma boa razão para tanto, queixa-se do filhote, enjeita-o, põe-no na roda e deserda-o da sua mais-valia eleitoral. Se asam for, já não é a primeira vez que parte, forma gentil de dizer que foge. Já em 1981, quando a conjuntura apontava para os piores indicadores económicos de sempre, a caveira lhe segredou o regresso à beatitude da Passárgada universitária, de olhos e ouvidos atentos aos vaivéns do poder.

Vozes do PS: - É verdade!

O Orador: - Fugir é assim, no seu caso, uma propensão. Com o tempo, acabará por se tornar um hábito.

Vozes do PS: - Muito bem!

O Orador: - E como não há duas explicações sem três, não falta aí quem proponha uma síntese: Freud entraria com o medo, Maquiavel com o cálculo. O medo guardaria a vinha da ambição, preservando-a; o cálculo jogaria no fracasso da alternativa encontrável e num seu regresso glorioso abençoado pelas inerentes desilusões.
E assim, de hiper-criticismo em hiper-criticismo, não faltou sequer, vinda do azimute de Aveiro, uma sentença de mau gosto: quem bate no filho bem amado, moldado à sua própria imagem e semelhança, «cospe nele». E vá de desenterrar a alcunha - «o cospe nele» - de uma sátira do jornalista Homem Cristo, que assim qualificou o masoquismo de uma vítima da sua verrina.
Acho eu, no meu prosaísmo beirão, que se o homem se quer ir embora, pois que vá. Mas que, por favor, «nos deixe trabalhar»! A despeito de o «Hamlet» ser um drama genial, não consigo levar a sério este seu Ersatz de cordel.
É talvez por isso que não vibro. Se vibrasse, era de indignação. Chega de menoridade política e cultural! Já se sabia que somos um país economicamente pouco desenvolvido. Mas, lá por sermos humildes, não se segue que sejamos parvos!
Mais interessante para nós é apurar até que ponto se justifica o medo do Primeiro-Ministro em continuar a governar. Será que o País está tão doente que o conhecimento do diagnóstico faça pensar três vezes?
Se o Primeiro-Ministro é tão bom como diz, ir-se embora é desperdício; se é tão mau como da situação do País decorre, ir-se embora é um alívio. Para onde quer que os portugueses se voltem só encontram perda de velocidade, ausência de estímulos, desencanto. Aparte a melhoria relativa das infra-estruturas, induzida pelos subsídios da Europa, em tudo o mais o País encolhe, se atrasa e se degrada.
O Primeiro-Ministro jogou afoitamente no crescimento económico, sacrificando tudo o mais a esse escopo. Confiava no crescimento induzido pelas ajudas comunitárias - cerca de dois pontos/ano - e em que as pessoas não dessem conta disso. Estamos recordados das pesporrências do maior crescimento económico do Mundo, depois reconvertidas na garantia de crescimentos superiores à média europeia. Estávamos a aproximar-nos da Europa!
Não tardaria que passássemos a crescer abaixo do crescimento induzido, logo depois abaixo do crescimento médio europeu. Por fim, abaixo da própria linha de água. Eram palavras, não políticas. Entre 1990 e 1995, o produto terá aumentado 6.ª em Portugal e 8.ª na União Europeia. Em vez de convergência real, agravamento significativo do nosso atraso.

O Sr. Guilherme Silva (PSD): - E a crise internacional?

O Orador: - O referido período - «suma injúria»! - ter-se-á equiparado ao quinquénio de 1981 a 1985, ambos em disputa do campeonato do pior quinquénio do último meio século. O PSD, dispondo de maioria absoluta e confortado por todos os sacramentos de uma conjuntura financeira de luxo, conseguiu fazer pior do que as sequelas do PREC, o FMI, a AD, o alto preço do petróleo e a exponencial cotação do dólar, todos juntos.

Aplausos do PS.

Se a isto somarmos a explosão do desemprego e o facto de, a partir de 1991, a produção agrícola e industrial terem caído como nunca se tinha visto, a conclusão que se impõe é a de que ao Primeiro-Ministro não faltam boas razões para fugir. Mas, se se der o caso de não vir a consumar a ameaça, só nos resta o extremo recurso de o despedirmos com justa causa: a derrota da economia, que derrotada o há-de derrotar a ele!...

O Sr. Ferro Rodrigues (PS): - Muito bem!

O Orador: - E que a loa da retoma nos não amoleça o ânimo. O que fica para trás não será, em caso nenhum, apagado pelo que tivermos pela frente. O facto de a exportação de produtos industriais ter animado um pouco, só testemunha a recuperação da economia dos países importadores. Não a nossa! Os dados mais fiáveis de que dispomos vão no sentido de que não há ainda sinais de recuperação atribuíveis a factores internos. Infelizmente, assim é!
Por isso Cavaco Silva foge. No fundo, foge de si mesmo: na aparência, do partido que moldou de facto, da oportunidade que perdeu.
E agora sim, Sr. Presidente e Srs. Deputados, já desabafei, já posso preocupar-me de novo com os vidreiros da Marinha Grande, os mineiros do Pejão, os trabalhadores da Renault, os desempregados efectivos e potenciais para quem o risco da miséria, quando não a própria, é um presente sem futuro ou um futuro sem esperança. E não menos com as vítimas da guerra na Bósnia ou na Chechénia, ou com o Terramoto do Japão, já que a universalização do dever de solidariedade me proíbe de só ter preocupações com o calcanhar da Luizinha Carneiro.
Acabo de fazer a minha cura de desintoxicação.

Aplausos do PS, de pé.

O Sr. Presidente: - Inscreveram-se, para pedir esclarecimentos, os Srs. Deputados Carlos Pinto, Manuel Queiró e Octávio Teixeira.
Tem a palavra o Sr. Deputado Carlos Pinto.