17 DE FEVEREIRO DE 1995 1531
oito anos, assolou todos os tribunais portugueses em cada sala de audiências, foi instalado um aparelho de gravação. No entanto, Sr. Secretário de Estado, nenhum funcionou, porque não há funcionários especializados para trabalhar com eles, e foram gastos centenas de milhares de contos! Cobriram-se todas as salas de audiência do País e lá estão aqueles «monos», tapados com umas «luvas de cabedal», sem funcionar. O senhor sabe isso tão bem como eu, portanto não me fale em aparelhos, não me fale sequer em leis. Em matéria de justiça, não é de mais leis que O País precisa mas, isso sim, que, rapidamente e bem, se apliquem as que existem. Disso os senhores não foram capazes, como sabe e como eu também sei, para mal do nosso país.
Aplausos do PS
O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Odete Santos.
A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados, Sr. Secretário de Estado: A proposta de autorização legislativa em debate suscita-nos três ordens de questões.
Em primeiro lugar, está em causa - e já coloquei essa questão na pergunta que fiz - saber se em todas as alíneas do artigo 3.º estará suficientemente definida a extensão da autorização legislativa, ainda que se esteja no segundo - e não no primeiro - nível de exigência feito pelo artigo 168.º da Constituição. A Assembleia da República compete definir o regime geral (e não só as bases gerais) das contra-ordenações.
A segunda questão consiste em saber se o amplo movimento de descriminalização a que assistimos não fez aflorar, numa ou noutra medida proposta, um reforço de sanções que as aproximam das sanções criminais, como contrapeso daquela ampla e, em nosso ver, exagerada descriminalização, um pouco à laia de desculpa pelos excessos. Propostas que, aliás, conflituam contra outras medidas existentes na autorização legislativa pedida, através das quais se procura atenuar o peso de sanções que se aproximam, pelo seu rigor, das sanções criminais.
Por último, e relacionada com a questão antecedente, a proposta de lei não pode deixar de colocar o problema de sabermos se, através da mesma, quer o Governo obter o perdão por continuar a insistir na exclusão, da área do Direito Penal, de condutas que atacam a personalidade do homem em actuação, ou seja, o homem enquanto fenómeno social.
A proposta de lei acata, nalguns pontos, as críticas nos vícios que já tinham sido detectados no Decreto-Lei n.º 433/82.
A detenção, em flagrante delito, do agente da contra-ordenação, por período que poderia ir até 24 horas, era, obviamente, inconstitucional, não havendo, assina, outro remédio senão o de suprimir o inciso em novo texto.
A previsão de que uma contra-ordenação podia ser imputada independentemente do carácter censurável do facto colocava dúvidas quanto à sua constitucionalidade, por violação do princípio constítucional segundo o qual ninguém pode ser sancionado sem culpa. Culpa que, neste caso, não tem a ver com a censura ético-social relativamente à conduta praticada mas, sim, relativamente à conexão desta com uma proibição legal.
Assim, o n.º 2 do artigo 1.º do actual diploma coloca, pelo menos, dúvidas quanto à sua constitucionalidade e merece, de facto, a revogação que se pretende fazer.
Dizíamos, no entanto, que, apesar de se tratar de uma matéria em que à Assembleia compete apenas autorizar o regime geral, nos parece que, relativamente às alíneas que citei, a autorização legislativa não cumpre, de facto, o preceito constitucional.
Na realidade, quando diz, por exemplo, no ponto II) da alínea s) do artigo 3 º «Rever as regras processuais aplicáveis à impugnação judicial da decisão administrativa respeitante à «Retirada da acusação e do recurso», ficamos sem saber em que sentido, porque já hoje o diploma prevê a retirada da acusação e do recurso.
Também na alínea u) do mesmo artigo se refere «Aperfeiçoar as regras sobre a revisão das decisões judiciais transitadas em julgado e das decisões definitivas». Não sabemos em que sentido é feita esta proposta, uma vez que hoje isto já e possível.
O mesmo dizemos relativamente à alínea x) do mesmo artigo, que diz apenas «Rever as regras sobre o processo de apreensão e respectiva impugnação..» quando, hoje, já há um processo de apreensão e outro de impugnação.
Cito estas alíneas a título de exemplo, para dizer que a proposta de lei não define, de facto, a extensão e o verdadeiro sentido da alteração, da revisão, do aperfeiçoamento que se pretende fazer. Em nosso entender e preciso dizer mais, porque não estamos a falar nas matérias relativamente às quais a Assembleia apenas estabelece as bases gerais e a que, depois, o Governo dá, em relação aos regimes comuns e aos regimes especiais, o desenvolvimento que entender.
A segunda questão por nós enunciada diz respeito ao reforço de sanções, que coloca o regime contra-ordenacional, pelas sanções graves, no mesmo plano, ou em plano muito semelhante, do Direito Penal.
Estamos a referir-nos, como e óbvio, à alteração - e também já me referi a isto na pergunta que fez - que se pretende introduzir relativamente às sanções dos concursos de crimes.
Enquanto, presentemente, a prática de várias contra-ordenações pela mesma conduta é punida com a sanção pecuniária mais elevada, pretende-se, agora, que se possam acumular, somar as sanções pecuniárias, até ao dobro do limite máximo da coima mais elevada. Aliás, o mesmo regime é previsto para o concurso real. De facto, no actual diploma não está claro o que é que se passa em relação ao concurso real.
No entanto, em nosso entender, isto poderá originar sanções pecuniárias de tal modo elevadas que representam uma punição muito maior do que aquela que resultaria da aplicação do Direito Penal, com a substituição da prisão por multa, da prisão remida a dinheiro Isso vai dar somas fabulosas, mais graves do que as que estão previstas no Direito Penal para outras actuações.
Esta situação, em meu entender, e sobremaneira chocante no que toca ao concurso ideal, em que uma única conduta infringe várias normas sancionatórias.
Por outro lado, no que toca ao cúmulo jurídico - Sr. Secretário de Estado, permita-me que discorde de si, quando disse que isto clarificava tudo -, a remissão para dispositivos do Código Penal que continuam a dividir a doutrina e a jurisprudência, em relação à fornia como se faz o cúmulo jurídico quando a decisão que comina uma das penas já transitou em julgado, faz adivinhar duras pelejas em torno desta questão nos tribunais.
Neste aspecto, entendemos que a proposta se contradiz, já que, tomando em consideraçâo as críticas dos que apontam as sanções acessórias, nomeadamente a interdição do exercício da profissão, como verdadeiras sanções criminais, pretende limitar u aplicação dessas sanções Mas, depois, tem previsões contrárias, no sentido de agravamento