O texto apresentado é obtido de forma automática, não levando em conta elementos gráficos e podendo conter erros. Se encontrar algum erro, por favor informe os serviços através da página de contactos.
Não foi possivel carregar a página pretendida. Reportar Erro

2194 I SÉRIE - NÚMERO 68

ram com utilidade visível para debelar as causas ou atenuar os efeitos conjugados e perversos daqueles flagelos. O fenómeno, em vez de retroceder, mostra teimosamente sinais de progressão, que se expande, criando nos cidadãos em geral receios, temores e intranquilidade sobre a segurança de suas pessoas e bens, a tal ponto que mesmo as individualidades que se encontram nos escalões superiores dos corpos de segurança, em privado e algumas vezes em encontros com dirigentes políticos, produzem comentários em nada coincidentes com os discurso soporíferos, que, por dever de ofício, os dois ministros patrioticamente produzem nos diversos «foros» ou nos mass media para minimizar tais preocupações.
Bastaria esta circunstância e uma espécie de anomia que se alastra das grandes metrópoles para as zonas suburbanas e destas para o interior do país, para qualquer partido político consciente da sua responsabilidade na defesa do interesse nacional estar atento e trazer para este Plenário as legítimas queixas e reivindicações das populações.
É verdade que diminuíram entre nós os índices de criminalidade grave - não temos nas nossas estações de metropolitano o uso do gás sarim, não se conhecem seitas tenebrosas como a «Verdade Suprema», nem temos bombismos de Oklahoma, embora no último fim-de-semana, o que mostra o cuidado e a brandura postas no acto, tenha sido assaltada a Faculdade de Letras de Lisboa e há duas semanas o intrigante fenómeno do roubo numa esquadra de polícia! Mas o narcotráfico em todas as suas formas, intercontinental, intereuropeu e interno, está presente entre nós, atingindo já as escolas das pequenas vilas, e sabemos que somos actualmente a placa giratória, ou de paragem, de enormes quantidades de dinheiro sujo que segue as rotas transnacionais a caminho da Europa e de outras paragens, a oriente e a ocidente, tanto da Ásia como da América.
Estão domiciliados no nosso território, segundo diz a comunicação social, alguns altos dirigentes das organizações mafiosas do comércio das armas, dos veículos roubados noutros países e traficantes de obras de arte retiradas dos museus, dada a fragilidade dos meios de combate de que dispomos para reforçar a vigilância nas nossas fronteiras marítimas e terrestres. O país é mais vulnerável para os ataques de toda a sorte de associações de malfeitores, que dominam as técnicas mais sofisticadas para iludir os vigilantes e os sistemas de segurança.
Mas o que queremos tratar hoje é de uma fenomenalidade diferente, quer seja o incómodo sentimento de insegurança que se instalou no colectivo dos cidadãos que atrás referi, sentimento este provocado pela ocorrência diária, que se vai avolumando em número de casos e vítimas, transformando o mal-estar em receio, e receio em medo - medo de andar na rua depois de certas horas, medo de sair de casa, medo de deixar as crianças brincar despreocupadas em sítios públicos, medo dos jovens andarem sozinho quando frequentam cursos nocturnos, ou mesmo o risco, que os comerciantes julgam ter-se tornado habitual, de encontrarem os seus estabelecimentos, situados em plena baixa citadina, quer seja Lisboa, Porto ou qualquer outra cidade, arrombados durante a noite ou mesmo em pleno dia por via de operações relâmpagos de pequenos grupos de banditismo organizado.
Foi em face deste estado de insegurança que o presidente do meu partido calcurreou pelo país fora, no que chamou «semana da segurança», visitando as instituições privadas de recuperação de toxicodependentes, as escolas de ensino secundário, contactando comerciantes, juntas de freguesia e presidentes de algumas câmaras municipais de zonas mais afectadas, associações de taxistas, centros de apoio às vítimas de criminalidade, associações académicas e, como não podia deixar de ser, teve encontros institucionais com todas as autoridades de segurança, tais como o Comando Geral da Guarda Nacional Republicana, o Comando Geral da Polícia de Segurança Pública, o Director da Polícia Judiciária e também o Bastonário da Ordem dos Advogados. Organizámos colóquios e debates públicos em que intervieram o Presidente do Sindicato do Ministério Público, advogados, juizes jubilados, professores e estudantes de Direito, individualidades com reputada experiência e ciência neste domínio, e aqui a comunicação social deu o devido relevo.
Esta interpelação representa, por isso, a tradução parlamentar das experiências relatadas, realidade vivida e as impressões colhidas no terreno, e por meio dela apresentar no Governo, no uso legítimo do direito que nos assiste, as nossas conclusões, pedir as explicações que certamente os membros do Governo têm a obrigação democrática de nos prestar e, por esta via institucional, levar ao conhecimento de todos os portugueses, de variados sectores e condições, que nos acompanharam e participaram desta campanha de segurança os resultados desta nossa iniciativa.
A primeira reacção do Sr. Ministro da Administração Interna foi, face a essa «semana de segurança», de que se tratava de uma campanha de alarmismo. Quis, assim, atemorizar-nos com o subtil convite para estarmos quietos ou as entidades sob sua tutela não colaborarem nas acções por nós programadas e dizer aos portugueses que não havia qualquer sinal de insegurança, sendo uma invenção nossa - do Partido Popular - falar nestes fenómenos, que entram pelas nossas casas dentro, e de todos os que sofrem as suas nocivas consequências.
Esqueceu-se o Sr. Ministro da Administração Interna de que a análise dos documentos que se ocupam desta matéria e, em particular, do relatório da segurança interna vindo recentemente a público dão-nos a média dos índices de crescimento da criminalidade. Em função dos 12,2% referidos pela Polícia Judiciária, dos 13,7% pela PSP e dos 9,9% pela GNR salda-se a média de crescimento global da criminalidade, se é que se pode fazer essa média, em 12%. Este número é conhecido e representa um aumento de 5 pontos percentuais em relação aos últimos três anos, que é um aumento substancial, sobretudo se o compararmos com os dados de 1993.
Se nos reportarmos aos dados referentes aos grandes centros urbanos - por exemplo, ao caso de Lisboa -, a preocupação aumenta significativamente, sendo a taxa de crescimento nesta cidade de 16%, ou seja, 4 pontos percentuais acima da média nacional. Se nos detivermos, então, num tipo específico de crime - como, por exemplo, os assaltos à mão armada -, o aumento foi da ordem dos 40%, número ainda perturbador.
Ao fim de alguns anos de regressão, Lisboa atinge agora um valor de crescimento superior a 40% do total da criminalidade.
Ao referirmos estes números, que estão publicados e pensamos serem conhecidos, não nos queremos centrar numa análise estatística do problema. Os números podem sempre ser manipulados, segundo os interesses de quem os utiliza. Os ministros podem sempre aqui demonstrar que, em vez de 40%, são 4% ou até dizer que a criminalidade diminuiu e que Lisboa vive mais feliz e em maior segurança do que no ano de 1993.