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2196 I SÉRIE - NÚMERO 68

O Sr. Presidente: - Sr. Deputado Narana Coissoró, peço desculpa por interrompê-lo, mas gostaria de dizer que acabou de esgotar o tempo regimental atribuído, nesta fase, ao CDS-PP e que o utilizado a partir de agora será descontado no tempo que lhe foi atribuído para o debate propriamente dito.
Faça favor de continuar, Sr. Deputado.

O Orador: - Muito obrigado, Sr. Presidente.
Temos dito frequentemente que, para nós, esta escala de valores de referência não pode ser invertida sob pena de transformar em preocupação fundamental a salvação dos criminosos, desvalorizando o sofrimento, os direitos e a reparação devida às vítimas dos crimes, quaisquer que estes sejam e não apenas às dos crimes violentos.
Por influência da escola de Coimbra, do Mestre Eduardo Correia e seus discípulos, é assim que o Estado tem abordado, desde 1982, esta matéria, o que é fácil de confirmar, se observarmos que é praticamente nulo o gasto que o Estado português tem efectuado para indemnizar ou apoiar as vítimas de crimes, mesmo quando violentos, únicos que na actual legislação, e esta muito recente, mereceram a atenção do legislador.
Esta concepção, que tende a negar o efeito dissuasor das penas e portanto o seu agravamento, continua a inspirar-se na ideia do crime como um reflexo de problemas sociais que responsabilizam a própria sociedade e todos os seus membros pela existência do «mal», mas que de certo modo justificam a existência dos «marginais» e dos seus actos, pela não formação adequada da personalidade do agente para ser o normal membro da sociedade. É esta concepção, à qual não negamos certa nobreza, que inspira o Sr. Ministro da Justiça nos seus propósitos despenalizadores, recordando-se a propósito a versão do Código Penal apresentada pelo Sr. Ministro e que, ao cabo de um processo muito agitado e não muito claro e com algum secretismo, deu lugar à versão actual, onde as molduras penais para alguns crimes acabaram por ser mais graves do que as anteriormente previstas no projecto submetido ao Conselho de Ministros.
Esta é a contradição fundamental. É inegável, para todos nós, que as más condições sociais e os fenómenos como a pobreza, o desemprego, a promiscuidade nas habitações, o insucesso escolar, fomentam e possibilitam o aumento do número de crimes. Mas, enquanto seguidores de concepções humanistas de raiz cristã, que perfilhamos, não ignoramos que o crime é sempre um acto de exercício de liberdade individual inerente à condição de ser humano.
Por outras palavras, uma célebre frase: «Se a pobreza é a mãe do crime, o juízo (a escolha para não evitar o mal) é certamente o seu país.
Foi precisamente por considerarmos ser essencial a não desvalorização do factor dissuasor das penas que o Partido Popular opõe-se à ideia de trocar penas de prisão pelo pagamento em dinheiro com a extensão com que essa opção surge na parte especial do Código Penal.
Em última análise, esta opção pode levar, em muitos casos, a que os mais abastados paguem multas mesmo pesadas, acabando por só estarem sujeitas a prisão efectiva os deliquentes mais pobres.
É necessário pôr fim, em Portugal, ao sentimento de que os tribunais não fazem justiça ou não a fazem a tempo útil; que as prisões são meros centros de reciclagem e aperfeiçoamento de criminosos entre criminosos; que as forças de segurança são incapazes de proteger os cidadãos; que o fenómeno da droga é uma batalha perdida, não restando outra solução senão a despenalização progressiva; e que não resta outra solução aos cidadãos senão a organização em milícias ou a realização da chamada «justiça popular».
Estes últimos fenómenos referidos existem lamentavelmente no país, devem-se a uma certa sensação de incapacidade e ingenuidade e só podem merecer uma resposta que seja enérgica e eficaz para os eliminar.
Ao contrário da etiqueta que alguns conhecidos e habituais fabricantes profissionais de rótulos caluniosos nos têm procurado colar, não somos pessoas com uma visão estritamente securitária do problema da criminalidade. Exactamente. Somos o contrário.
Na questão da droga, temos a certeza do papel fundamental que a prevenção e a educação podem desempenhar. O que não é aceitável é que o Governo e os dois ministros responsáveis mostrem hesitações ou se recusem a expressar opinião sobre uma matéria de tanta gravidade, remetendo para opções meramente técnicas e tácticas. As questões e os dramas humanos relacionados com a droga são tudo menos questões técnicas e operações tácticas, exigem opções políticas claras que se revelem ser suficientes ou possam, de imediato, ser revistas.
Por último, ainda em relação ao problema da droga, queremos interpelar o Governo, de uma forma mais directa, sobre as medidas e os resultados esperados no âmbito do «branqueamento» de capitais provenientes do narcotráfico e dos esforços desenvolvidos para adaptar a administração e os órgãos competentes a prosseguirem de forma eficaz as suas competências neste domínio. É uma matéria essencial a que os organismos internacionais têm dado maior importância, mas que, em Portugal, apesar da legislação já em vigor, parece, ainda, estar longe de obter resultados minimamente satisfatórios.
Se a questão da droga é a pedra de toque de uma qualquer interpelação sobre este problema, terminar a análise que fazemos da situação de insegurança em que vive o país sem nos referirmos a duas reformas e a outros tantos fracassos empreendidos por este Governo seria uma forma incompleta de a fazer. Refiro-me, obviamente, à reforma das polícias e do sistema prisional.
A reforma das polícias em curso está baseada num argumento de racionalização de meios e de efectivos e centrada num conceito difundido pela comunicação social como sendo de «superesquadras» é um fracasso previsível. A reforma, podemos dizê-Io hoje com alguma propriedade, ajudou unicamente a que a sensação de insegurança das populações aumentasse, dado o fecho de inúmeras das tradicionais esquadras de bairro, já que as populações sentem que as ruas são menos policiadas e que a polícia está cada vez mais distante delas, ao contrário do que seria necessário numa qualquer reforma nesta área, especialmente numa fase em que a criminalidade aumenta.
Chegámos à conclusão de que o número de efectivos policiais não é o suficiente para responder às necessidades de policiamento da sociedade. O número de polícias por habitante pouco significa se a maior parte do tempo de que dispõem for gasto na realização de tarefas burocráticas e administrativas, fazendo notificações por ordem dos tribunais, no cumprimento de tarefas de regulamentação do trânsito ou de perseguição dos vendedores ambulantes.
Não é possível garantir mais segurança com menos efectivos, caso em que precisaríamos não de superesquadras mas, sim, de supermeios ou talvez de super-heróis no desempenho das funções policiais.