3 DE ABRIL DE 1998 1909
e 7.º anos) e, em 1993/1994, para o primeiro ano do ensino secundário (10.º ano).
Segundo um estudo de uma especialista, a Dr.ª Isabel Menezes, publicado em 1995, a disciplina específica de Desenvolvimento Pessoal e Social continuava em regime experimental desde 1991 e só em 19 escolas, dado os professores terem de obter uma qualificação específica. Quanto ao programa de educação cívica, no 3.º ciclo, a situação era idêntica.
A autora desse estudo concluía assim: «Na globalidade pode dizer-se que, em Portugal, os objectivos de preparar os estudantes para a cidadania estão disseminados, por todas as disciplinas, são objecto de uma disciplina específica e estão presentes numa área de projectos e nas actividades de complemento curricular, mas a implementação destas estratégias curriculares está ainda num estádio inicial».
Outros estudos recentes têm confirmado as dificuldades em prosseguir os objectivos curriculares consignados na lei por causa desse carácter disseminado e da inerente diluição de responsabilidades e de sistematização pedagógicas.
Perante esta realidade, considerou o Grupo Parlamentar do Partido Socialista justificar-se uma iniciativa que, ganhando o peso e a dignidade de uma lei emanada desta Assembleia, contribuísse para uma convergência de vontades e de esforços no sentido de a educação para a cidadania se tornar uma realidade efectiva no nosso país, ocupando o lugar central que lhe cabe no sistema educativo de uma sociedade democrática.
Como consta no projecto de lei que apresentamos, importará reforçar o carácter nacional desse programa, enunciar de forma sistemática e clara os seus objectivos principais e responsabilizar o Governo, em conjunto com as escolas, no sentido de criar as condições para que esses objectivos sejam atingidos na fase particularmente importante do ensino básico obrigatório que é o 3.º cicio. Isto se se quiser, ainda, que, mantendo-se o espírito e a letra do Decreto-Lei n.º 286/89, de 29 de Setembro, no que se refere à educação cívica para o 3.º ciclo, a avaliação dos alunos quanto aos conteúdos de um programa como o que propomos seja considerada para a atribuição do diploma de escolaridade básica.
Esta iniciativa vai ao encontro das preocupações por várias vezes expressas sobre o assunto pela actual equipa governamental da Educação. Visa, assim, inscrever-se no processo que está em curso de revisão dos currículos, dos sistemas de avaliação e de redução da carga horária. Revisão que se espera seja simultaneamente realista e inovadora.
Por outro lado, a importância que atribuímos à educação para a cidadania está na linha das orientações repetidamente enunciadas e de projectos levados a cabo (penso, por exemplo, no CIVITAS, criado em 1995) por organizações supranacionais como o Conselho da Europa, para além de corresponder também às resoluções saídas da Conferência de Ministros de Educação dos 4O países membros desse Conselho, realizada na Noruega, em Junho último. A própria Declaração Final da II Cimeira dos Chefes de Estado e de Governo desses mesmos países, que teve lugar em Estrasburgo, em Outubro do ano passado, refere-se especificamente a tal questão.
É nossa convicção que, mais do que nunca, a escola tem de ser um lugar de socialização, com tarefas essenciais na preparação dos jovens para enfrentar os fenómenos desagregadores da sociedade que fomentam o individualismo cínico, o relativismo ético e a irresponsabilidade social. Fenómenos que, a todo o momento, nos lembram que a democracia não é um estádio irreversível de gestão civilizada dos conflitos e das diferenças em sociedades complexas e que, através das suas fragilidades, injustiças, aberrações, continua a ameaçar irromper a barbárie que, em diversas fases históricas, tem sinistramente marcado a História da humanidade.
Mas sabemos também que não cabe ao Estado, através das escolas, cair em tentações doutrinadoras ou pseudo-moralistas que, em vez de incentivarem ao sentido crítico e ao exercício responsável do livre arbítrio, geram o conformismo e a passividade cívica. Por isso, preferimos a designação de educação para a cidadania a outras designações que, normalmente, geram compreensíveis reacções de rejeição devido a experiências traumáticas de outros tempos.
Com efeito, há que colocar a noção de cidadão no centro do próprio acto educativo. Neste sentido, o objectivo pedagógico principal da educação para a cidadania não se pode esgotar na integração das crianças e dos jovens na ordem democrática. E fundamental também, e simultaneamente, prepará-los para a assunção plena da sua condição de futuros cidadãos, conscientes, informados, activos e participantes na vida da sociedade a que pertencem.
Toda a educação tem de ser educação para a cidadania, durante todo o processo educativo e em todas as fases, começando-se, desde logo, pela vida interna das escolas enquanto espaços de trabalho, de formação e de conviviabilidade, mas também de hierarquização de funções e de responsabilidades. Todavia, isto não elimina a necessidade da transmissão organizada e sistemática de princípios de civilidade para os mais novos e, para os demais, de instrumentos conceptuais e de conhecimentos que não se apreendem de forma espontânea e casuística, que permitam ao jovem conhecer a natureza e o funcionamento das instituições, assim como outros aspectos de carácter social, económico, cultural, histórico ou de outro tipo, relevantes para a vida na comunidade em que se insere.
Ou, dito ainda de outro modo, os direitos e os deveres do cidadão, valores como os da liberdade, da solidariedade, da tolerância, dever-se-ão aprender não só através de vivências e de práticas que a escola deve fomentar, como também através da aprendizagem teórica de matérias, referências, princípios como, por exemplo, os contidos na Declaração Universal dos Direitos do Homem de que se comemora o 50.º aniversário este ano.
Temos consciência, evidentemente, de que os melhores programas não passarão de letra morta se não se derem condições adequadas aos professores e às escolas, se não houver cargas horárias realistas, currículos equilibrados. Não desconhecemos que vários problemas se põem em relação à estruturação de um programa - não de uma disciplina - como o que propomos, nomeadamente no que se refere à avaliação dos alunos.
São aspectos que já debatemos em sede de Comissão de Educação, Ciência e Cultura, que poderemos ainda vir a debater mas que, de acordo, aliás, com o articulado do nosso projecto de lei, caberá ao Ministério da Educação, ao Conselho Nacional de Educação, às escolas e aos professores, equacionar com a necessária profundidade técnica para se encontrarem as soluções mais adequadas.
A aprovação deste projecto de lei deverá significar, primordialmente, e em nosso entender, o empenhamento desta Assembleia na concretização de um objectivo nacional em matéria de educação, objectivo de que ela não se deverá nem poderá alhear. Contamos, naturalmente, com uma