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3 DE ABRIL DE 1998 1913

ção. Uma geração de responsabilidade, onde cada um pergunta primeiro o que pode fazer pelos outros antes de perguntar o que os outros podem fazer por si. Uma geração de ambição, onde cada um desafia a situação, combate o conformismo, combate o imobilismo e combate a resignação.
Educação para a cidadania significa enraizar um sentimento apurado de pátria, significa respeitar a sua história, significa conhecer a sua história. Mas mais importante do que conhecer a história é assumir a responsabilidade de escrever a própria história. Queremos e desejamos uma geração de actores onde não haja lugar para espectadores. Queremos uma escola que, mais do que um espaço de informação, se assuma como um espaço de formação, formação académica, formação cívica e formação cultural.
Só é possível despertar o estatuto de cidadão se cada um se descobrir a si próprio, se descobrir as suas vocações, as suas aptidões, as suas ambições. A descoberta de si próprio é o primeiro passo para descobrir o seu papel na sociedade. Por isso, a escola é, por excelência, a plataforma de afirmação da cidadania. E escola deve ter o engenho e a arte de despertar o desejo de intervir, a vontade de construir e a ambição de participar num país que, sendo de todos é, também, de cada um de nós.
Srs. Deputados, o projecto tem o mérito de ter trazido a debate esta questão que tem pertinência e toda a oportunidade, mas, em boa verdade, este projecto não é um projecto de lei, é um projecto de intenções. Teve, repito, o mérito, que reconhecemos, de trazer à luz do dia um debate que julgo importante não apenas na Assembleia da República mas na sociedade portuguesa, nas escolas seguramente, nas universidades, onde quer que pretendemos estar.
Sr. Deputado, parabéns por isso, mas há um caminho a percorrer para que o projecto não seja apenas letra morta.

Vozes do CDS-PP: - Muito bem!

O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.

O Sr. António Filipe (PCP): - Sr. Presidente, Srs. Deputados: Esta iniciativa legislativa, que preconiza a criação de um programa de educação para a cidadania no 3.º ciclo do ensino básico, coloca uma questão que vale a pena discutir: Sendo inquestionável para nós que a formação escolar dos jovens deve ter como uma das suas componentes fundamentais a educação para o exercício consciente dos direitos de cidadania, importa reflectir até que ponto a escola consegue cumprir hoje esse objectivo e importa também reflectir, em todo o caso, qual o melhor caminho a seguir para que esse objectivo seja efectivamente cumprido.
Temos consciência de que a escola não pode ser, permita-se a expressão, o bode expiatório de todas as carências sociais. Não podemos aspirar a que a escola possa dar a todos os cidadãos tudo aquilo que a sociedade em geral lhes pode e deve dar. Mas não temos qualquer dúvida de que a escola - o sistema educativo a todos os níveis - através da vivência que permite, através do seu funcionamento, em todas as disciplinas sem excepção, é uma componente fundamental na formação integral de todos os que a frequentam e não pode por um só momento perder de vista que está a formar cidadãos.

Vozes do PCP: - Muito bem!

O Orador: - A escola transmite conhecimentos e valores. Bem ou mal, queira ou não queira. Consideramos por isso que a preocupação com a formação para a cidadania no sistema escolar é louvável e algo de que a escola não se pode alhear.
Dito isto, não podemos fugir também a algumas observações que a apresentação desta iniciativa legislativa suscita.
A primeira observação é a de que este projecto de lei reflecte um profundo mal-estar em relação à situação do sistema educativo e redunda, afinal, numa grave acusação à política educativa do actual Governo. É que, como não se ignora no preâmbulo do próprio projecto de lei, a Lei de Bases do Sistema Educativo contempla amplamente a educação para a cidadania. Desde logo, nos princípios gerais, onde se estabelece que «A educação promove o desenvolvimento do espírito democrático e pluralista respeitador dos outros e das suas ideias, aberto ao diálogo e à livre troca de opiniões, formando cidadãos capazes de julgarem com espírito crítico e criativo o meio social em que se integram e de -, e empenharem na sua transformação progressiva».

A Sr.ª Luísa Mesquita (PCP): - Exactamente!

O Orador: - Mas também nos princípios organizativos, onde se estabelece que o sistema educativo se organiza, de forma a, nomeadamente: «Contribuir para a defesa da identidade nacional e para o reforço da fidelidade à matriz histórica de Portugal, através da consciencialização relativamente ao património cultural do povo português. Contribuir para a realização do educando, através do pleno desenvolvimento da personalidade, da formação do carácter e da cidadania. Assegurar a formação cívica e moral dos jovens».
Mais se inscrevem, nos objectivos do ensino básico, o de proporcionar aos alunos experiências que favoreçam a sua maturidade cívica e sócio-afectiva, criando neles atitudes e hábitos positivos de relação e corporação, quer no plano dos seus vínculos de família, quer no da intervenção consciente e responsável na realidade circundante». Bem como, «proporcionar a aquisição de atitudes autónomas, visando a formação de cidadãos civicamente responsáveis e democraticamente intervenientes na vida comunitária».
E também no que respeita ao desenvolvimento curricular, a Lei de Bases estabelece que «os planos curriculares do ensino básico incluirão em todos os ciclos e de forma adequada uma área de formação pessoal e social, que pode ter como componentes a educação ecológica, a educação do consumidor, a educação familiar, a educação sexual, a prevenção de acidentes, a educação para a saúde, a educação para a participação nas instituições, serviços cívicos e outros do mesmo âmbito».
A educação para a cidadania está, portanto, consagrada amplamente na Lei de Bases do Sistema Educativo, está presente na reforma curricular de 1989 através da disciplina de desenvolvimento pessoal e social, está presente nos objectivos da área-escola e, no entanto, os Srs. Deputados do PS sentem-se na obrigação de apresentar este projecto de lei.
Resulta daqui uma questão óbvia: se os objectivos propostos neste projecto constam da Lei de Bases, da reforma curricular, da área-escola, da disciplina de desenvolvimento pessoal e social, qual é a ideia de propor uma nova disciplina?