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2778 I SÉRIE - NÚMERO 80

As transformações sociológicas entretanto operadas, por força das transformações económicas e do desenvolvimento do liberalismo, conferindo à mulher um novo estatuto no mercado de trabalho, e a progressiva transformação da família de unidade económica em unidade de consumo acabaram por introduzir alterações na própria instituição "casamento", o qual perdeu o carácter perpétuo, imposto pelo Estado, para passar a ser apenas presuntivamente perpétuo, como aconteceu na 1.ª República.
E se embora a 1.ª República, pelo seu carácter burguês, não conferiu à mulher o estatuto de plena cidadania, a verdade é que, a nível do Direito da Família, muitos direitos estabelecidos nas leis da família vieram conferir uma nova dignidade às mulheres e às crianças. O carácter apenas presuntivamente perpétuo do casamento trouxe inevitavelmente a estatuição legal do divórcio como causa de dissolução do casamento, prosseguindo-se, assim, o objectivo de atingir a verdade nas relações familiares, com o que se ganhou muito em termos de compreensão da conjugalidade como factor da felicidade individual.
O Estado abdicava, assim, do seu papel de interventor em defesa de relações familiares familiares degradadas, em nome de um pseudo-interesse público na defesa da família como instituição. Caminhava-se para uma menor publicização do Direito da Família.
A história é, no entanto, feita de fluxos e refluxos. E, também nesta matéria, a história fez-se com a regressão a que se assistiu no regime fascista.
Confundindo-se o Estado com a Igreja, a proibição de dissolução dos casamentos católicos, celebrados depois da Concordata com a Santa Sé, viria a ser de tal forma causa de convulsões sociais, de infelicidades, de discriminações, de que foram especialmente vítimas as crianças e as mulheres, que um poderoso movimento nacional pró-divórcio afrontou o regime, reivindicando o direito de casais, não unidos entre si pelo vínculo matrimonial, à felicidade e o direito das crianças a não serem tituladas de ilegítimas ou de filhos de mães incógnitas.
O Código Civil de 1966 trouxe algumas modificações positivas ao estatuto da mulher na família, como era inevitável. Mais uma vez, as transformações económicas, acompanhadas pela guerra colonial, catapultaram as mulheres para um novo estatuto na sociedade e aceleraram a transformação da família numa unidade afectiva e de consumo.
Mas estes aspectos foram acompanhados pelo reforço da presunção da perpetuidade do casamento, restringindo o Estado o direito ao divórcio. Desta feita, em relação ao regime constante na lei do divórcio, é de assinalar que o Código de 1966 proibiu o divórcio por mútuo consentimento e, assim, reforçava-se a intromissão do Estado nas relações familiares. Ao mesmo tempo, o Código continuou a assegurar, através do Estado, o carácter perpétuo do casamento católico.
A realidade sociológica da instituição família comprovava, no entanto, o afastamento das soluções legais em relação àquela.
E foi com os diplomas de 1975 e 1976, diminuindo o papel do Estado na sua intromissão nas relações familiares, que se correspondeu à necessidade de conferir transparência e verdade àquelas relações, surgindo a conjugalidade mais relacionada com o seu objectivo de prossecução da felicidade individual.
A transparência e a verdade foram prosseguidas, nomeadamente com a alteração da Concordata com a Santa Sé. Foram também prosseguidas, com o retorno ao divórcio-
ruptura, que impede a manutenção das relações familiares, quando é óbvio que as mesmas já não traduzem laços de afectividade.
A reforma do Código Civil de 1977 manteve, no essencial, o quadro legislativo post 25 de Abril.
Entretanto, os indicadores demográficos, a nível de Portugal e da União Europeia no seu conjunto, traduzem a realidade por todos apreendida, dia-a-dia: a diminuição da taxa de nupcialidade é acompanhada de um aumento da taxa de divorcialidade. Na União Europeia, no seu conjunto, um terço dos casamentos arriscam-se a terminar em divórcio, segundo revela o EUROSTAT.
Esta realidade demonstra que os casais entendem o casamento, e a família daí resultante, como uma forma de realização pessoal através da afectividade, que deverá terminar quando a família assim constituída já não represente a unidade que traduz a afectividade.
O projecto de lei em debate, apesar de, na especialidade, merecer algumas sugestões e críticas, reflecte as mutações já havidas e dá mais um passo no sentido de uma menor intromissão do Estado no direito à intimidade da vida familiar.
Merecem a nossa concordância soluções como a da redução do prazo da separação de facto de seis para três anos; merece também a nossa aprovação a revogação do requisito da duração mínima do casamento para que se possa requerer o divórcio por mútuo consentimento.
De facto, penso que as críticas que foram aqui feitas, para a necessidade de estabelecer um prazo, não têm razão de ser. Devo dizer que gostava até de saber em que estudos psicológicos se fundamentam as soluções para dizer que ele é de dois e não de três anos, para dizer que é de três e não de quatro anos... Não se entende! Então, devia ser de quatro, porque parece que há quem diga que, ultrapassado o quarto ano, está salvo o casamento!... Mas tenho muito receio que isto não passe daquela apreensão popular, com base numa amostrasinha...
Julgo que, proposta a acção no tribunal, com o período de reflexão de três meses - e penso que não deve passar para seis -,...

O Sr. Strecht Monteiro (PS): - Melhor!

A Oradora: - ... se, de facto, se trata de um amuo ou de um arrufo, até à primeira conferência ou depois dela, têm todo o tempo para se tornar a reconciliar. Portanto, sinceramente, não vejo por que hão-de estar aqui a fazer finca-pé para que seja três anos e não outro período qualquer, até porque haverá muita diversidade de casos em que, então, tínhamos aqui de explicitar que um psicólogo diria se aqueles cônjuges precisavam de mais tempo para reflectir.
Agora, já não entendo - e já o disse - aquela solução da separação de facto por um ano. É que o Sr. Deputado, aí, não me respondeu, ladeou a questão e chegou a dizer que o cônjuge que propunha a acção se munia de um documento de não oposição do outro. Só que isso não é viável, a não ser que alteremos - e, nesse aspecto, também estou disposta a meter mãos à obra - a definição destas acções e o regime que devem seguir.

O Sr. Strecht Monteiro (PS): - Claro!

A Oradora: - É que, em minha opinião, com a diminuição da intervenção do Estado dentro da família, numa pseudo-defesa do interesse público em manter situ-