578 I SÉRIE - NÚMERO 17 578
dos: O pedido de autorização para o Governo legislar em matéria de prevenção e investigação de acidentes envolvendo aeronaves advém do facto de as competências a atribuir aos responsáveis pela investigação técnica serem susceptíveis de interferir com o exercício de direitos, liberdades e garantias individuais.
Portugal, enquanto contratante da Convenção de Chicago, já se encontrava vinculado a um conjunto de obrigações no âmbito da segurança aérea. Estas obrigações passavam, necessariamente, pela investigação de acidentes com a finalidade da sua prevenção. No entanto, em 1994, o Conselho de Ministros da Europa aprovou uma nova directiva, a Directiva n.º 94/56/CE, que tem o objectivo de reforçar e aperfeiçoar a eficácia da investigação e prevenção de acidentes.
Ora bem, a transposição desta directiva para a legislação nacional visa um conjunto de princípios orientadores da investigação de acidentes aeronáuticos, bem como autonomizar a responsabilidade pela investigação relativamente às entidades reguladoras do sistema, na medida em que estas, ao terem a capacidade de licenciar e credenciar empresas, podem ser parte interessada ou pode ser-lhes imputada alguma responsabilidade nesta matéria. Assim, neste caso, o facto de as atribuições da entidade responsável pela investigação de acidentes poderem interferir com a matéria que é da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República fez com que o Governo apresentasse este pedido de autorização legislativa, o qual já se fez acompanhar do próprio projecto de decreto-lei, para que o Parlamento pudesse balizar o pedido de intervenção do Governo nesta matéria.
O Sr. Presidente (João Amaral): - Tem a palavra, o Sr. Deputado Rodeia Machado.
O Sr. Rodeia Machado (PCP): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado dos Transportes, Srs. Deputados: O Governo pretende, através da presente proposta de lei, que a Assembleia da República lhe conceda autorização para legislar sobre os princípios reguladores da investigação de acidentes e incidentes com aeronaves civis.
Na realidade, o que se pretende, através desta autorização legislativa, é transpor para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 94/56/CE, aprovada em 21 de Novembro, que, desde logo, no seu artigo 12.º, estabelece que «Os Estados membros adoptarão e publicarão as disposições legislativas, regulamentares e administrativas, necessárias (...), o mais tardar em 21 de Novembro de 1996. (...)».
A pergunta que legitimamente daqui decorre é a seguinte: por que razão é que o Governo não procedeu há mais tempo ao envio de um pedido de autorização legislativa sobre esta matéria? Naturalmente, seria o mais correcto.
A ausência, no nosso país, de normas regulamentares deveria ter merecido, de facto, desde há muito, uma preocupação da parte do Governo, no sentido de adoptar legislação para que os inquéritos se realizem até à exaustão, no tocante a acidentes e incidentes aéreos, e que os resultados encontrados sirvam exactamente para prevenir futuras situações, funcionando, estes, como recomendações ou normas de comportamento a seguir. Porque é disso que efectivamente se trata, ou seja, o que se pretende implementar, em Portugal, é um instrumento jurídico, isto é, o estatuto jurídico do inquérito, com regras de uniformização de critérios e procedimentos administrativos, no sentido de tornar célere e eficiente qualquer inquérito que, porventura, seja necessário mandar fazer, em caso de
acidentes e incidentes aéreos. E isto porque, quanto ao apuramento de responsabilidades, apenas o poder judicial tem essas competências.
Esses procedimentos e critérios já estão, no entender do PCP, devidamente qualificados e enumerados na directiva sobre esta matéria, que, como se disse, foi aprovada em 1994.
No entanto, no pedido de autorização legislativa, não é afirmado pelo Governo qual a entidade que vai superintender nesta matéria e, do ponto de vista de eficiência e celeridade do processo, tal deveria estar devidamente identificado. Isto, porque, para além do factor decisão, que se quer rápido, existe toda uma complexidade de meios, quer administrativos, quer técnicos e de apoio logístico, que deverão ser obrigatoriamente cometidos a uma entidade.
Na exposição de motivos, o Governo refere a criação de um gabinete mas nada é dito sobre quem tutela esta entidade ou, pelo menos, de quem ficará dependente, em termos financeiros, administrativos ou logísticos. É necessário e fundamental, em nosso entender, que, após a aprovação do estatuto jurídico do inquérito, seja rapidamente definida qual a entidade e que meios tem para desempenhar a tarefa que lhe é conferida, para que seja dada eficácia ao próprio estatuto.
Pese embora esta ressalva, entende o Grupo Parlamentar do PCP que o pedido de autorização legislativa vem criar condições para eliminar uma lacuna ou ausência de lei sobre esta matéria e, estando salvaguardado o exercício de direitos, liberdades e garantias individuais dos cidadãos em sede de inquérito, votará favoravelmente o pedido de autorização legislativa.
Vozes do PCP: - Muito bem!
O Sr. Presidente (João Amaral): - Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Falcão e Cunha.
O Sr. Falcão e Cunha (PSD): - Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Srs. Deputados: Como é sabido, até este momento, as matérias a que diz respeito a autorização legislativa que estamos a discutir, competiam ao Gabinete de Prevenção e Segurança Aeronáutica da Direcção-Geral da Aviação Civil, entidade responsável pela investigação de acidentes e incidentes com aeronaves civis em território nacional, nomeadamente participando em inquéritos e colaborando com comissões de inquérito que fossem constituídas.
A Directiva n.º 94/56/CE veio apontar noutro sentido, definindo claramente que esta matéria deve ser assegurada, em cada Estado membro, por organismos ou entidades aeronáuticas permanentes, sob controlo de entidades aeronáuticas permanentes, e que estes organismos devem funcionar de modo independente, nomeadamente em relação a outras autoridades nacionais responsáveis pela navegação aérea, pela certificação, pelas operações aéreas, pela manutenção e concessão de licenças, etc. Isto, naturalmente, para evitar situações de conflito.
A proposta de autorização legislativa apresentada vai no sentido de transcrever para o direito português a directiva que acabei de referir e de definir bem a formulação a que a investigação técnica de acidentes ou incidentes aéreos deverá obedecer, para ser útil e contribuir para uma maior segurança do tráfego aéreo, que é o que todos pretendemos.
O meu partido dará o seu acordo a este pedido de autorização legislativa na convicção de que o gabinete que irá ser criado terá garantidos meios financeiros e técnicos