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26 DE ABRIL DE 1999 2773

Mudanças se reclamam, pois, perante um desafio novo, num registo historicamente inédito.
O desafio que liberte o Planeta mas também cada país, cada comunidade, cada cidadão, da armadilha de paradigmas ultrapassados.
O desafio que implica a responsabilidade de cada um em dar novas respostas aos problemas colocados.
O desafio que nos propõe uma nova solidariedade face às gerações futuras.
O desafio que nos impõe uma ética na relação do homem com a natureza e do homem consigo próprio.
O desafio do futuro que nos compromete, envolve e de cada um de nós exige uma ética de responsabilidade.
O futuro que começa agora, não é para amanhã, perante uma responsabilidade que não se decreta, aceita-se ou não, assim se concebe em democracia!
A democracia que, em nome de Abril, em cada dia terá de se reinventar, recusando o conformismo. A democracia que, inquieta sobre si própria, terá de ser capaz de se interrogar. A democracia que agora já não é dos outros mas é de todos e de cada um e está em nós, na nossa participação, na nossa vontade, no nosso dia-a-dia, saber moldar e animar.
Recuperando hoje, como ontem, o sonho e construindo a utopia. Em nome de Abril! Como o começo, como a aventura colectiva de um povo, que hoje, em 25 de Abril, é dia de celebrar.

Aplausos gerais.

O Sr. Presidente: - Para uma intervenção, em representação do Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português, tem a palavra o Sr. Deputado Lino de Carvalho.

O Sr. Lino de Carvalho (PCP): - Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Presidentes do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional, Sr.ªs e Srs. Convidados, Sr. Presidente da República de Moçambique, Sr. Presidente da Assembleia Nacional Popular da Guiné Bissau, Homens e Mulheres de Abril: Faz hoje ,25 anos. Sensivelmente a esta mesma hora, sentado na borda da cama de um quarto-prisão do Hospital Miguel Bombarda, para onde havia sido transferido de Caxias, às ordens da PIDE, ouvi, do outro lado da janela, no pátio, alguém gritar «Marcelo caiu». Tendo em conta o local onde estava, e apesar das informações existentes, dei comigo a pensar que se tratava de um caso psiquiátrico. Afinal não era! A Liberdade, duramente conquistada, entrava-nos finalmente portas e janelas dentro. Até hoje.
Ao comemorarmos este quarto de século em liberdade, acodem-me à memória os nomes e as imagens dos que, com a sua luta, o seu sacrifício e o sacrifício dos seus familiares, por vezes a morte, na prisão, na clandestinidade ou no exílio, construíram as estradas que fizeram a liberdade. Comunistas, meus camaradas de partido, seguramente, mas também republicanos, socialistas, católicos, radicais de esquerda, estudantes, operários, assalariados agrícolas do Alentejo, camponeses, intelectuais, povos das então colónias em luta pela independência, mulheres e homens, todos - mas todos! -, desde os mais mediatizados e para sempre registados nas páginas da bibliografia de Abril até aos mais anónimos militantes da liberdade, com a sua luta, com a sua intervenção, construíram as «portas que Abril abriu». Todo um povo que deve ser convocado à nossa memória, à nossa homenagem, nesta hora, e que constituiu o fermento que adubou o campo onde floresceu a consciência dos militares, «dos Capitães de Abril», que, organizados no Movimento das Forças Armadas, arrombaram e escancararam as portas da Liberdade e da democracia. Como recordava Ary dos Santos, «Quem o fez era soldado/homem novo capitão/mas também tinha a seu lado/muitos homens na prisão». A eles, a todos eles, as nossas mais intensas saudações.

Aplausos do PCP, do PS, do PSD e de Os Verdes.

Tanto mais necessárias quanto, numa época de memórias dissolvidas e seleccionadas na diária mediatização da História, alguns, muitos, procuram branquear o passado e os responsáveis desse passado. Contra esse branqueamento, pela formação cívica das gerações posteriores e para que não volte, é preciso reafirmar sempre e sempre que o fascismo existiu em Portugal, que o nosso País foi palco de perseguições, de prisões por delito de opinião, de torturas, de censura, de guerra colonial, de proibições muitas e que o fim do fascismo não foi dádiva do regime, não foi o resultado de um simples «piparote», foi o resultado de muita luta, muito sangue, muita coragem cívica, muita paixão. Como dizia Hegel, «nada de grande se faz sem paixão».
Sr. Presidente da República, Sr. Presidente da Assembleia da República, Srs. Deputados, Srs. Convidados: Valeu a pena a luta pela Liberdade e pelas liberdades, mesmo quando muitas das esperanças de Abril estão por construir; mesmo quando o emprego com direitos não é um direito efectivo de todos e está quotidianamente ameaçado nos locais de trabalho e na legislação laboral do Governo; mesmo quando a pobreza e a marginalidade alastram, apesar do rendimento mínimo garantido; mesmo quando mais de 70% dos reformados continuam a ter de viver com pensões inferiores a 32 800$; mesmo quando as mulheres e os jovens continuam a ser discriminados; mesmo quando se agrava a injusta distribuição da riqueza para valores idênticos aos anteriores a 25 de Abril; mesmo quando o pensamento único, neo-liberal, por vezes polvilhado com contristadas devoções fingidas, domina os modelos de Estado e governos socialistas e sociais-democratas, impondo a desvalorização das políticas públicas, tudo submetendo à lógica da competitividade a todo o preço, da privatização e do lucro; mesmo quando, por isso mesmo, a sociedade hoje não é a sociedade da solidariedade com que sonhámos. Apesar de todos estes défices, valeu a pena, valeu incontestavelmente a pena fazer Abril, porque não há nenhum bem mais precioso do que a liberdade, sem a qual não há democracia política, e porque, em Liberdade, melhor se pode lutar pela democracia económica, social e cultural que ambicionamos.
Mas as celebrações deste quarto de século em liberdade ficam marcadas, estão marcadas, por factos dolorosos da maior gravidade: a brutal e irresponsável guerra de agressão dos Estados Unidos, da União Europeia e da NATO contra a Jugoslávia; a continuação da guerra em Angola, movida por Savimbi, em violação das resoluções da ONU; a violência, os