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1253 | I Série - Número 32 | 21 de Dezembro de 2000

 

uma política. Deste ponto de vista, este debate é a segunda ronda do debate orçamental. Neste, o Governo deveria ter começado, por uma questão de clarificação e de rigor, por resolver as políticas de preços de combustíveis. Assim não aconteceu, como se sabe, tendo este tema sido um dos tabus desse debate. Na sua falta, compete-nos, agora, esclarecer a coerência ou incoerência da política do Governo e verificar que alternativas lhe podem ser apresentadas.
O nosso ponto de partida, neste contexto, é o de não estarmos dispostos a manter e a suportar uma política que penaliza os mais pobres, nem a manter e a suportar uma política de preços dos combustíveis que foi, e continua a ser, errada. Sobretudo, não podemos aceitar esta demagogia que esconde a verdade da injustiça fiscal marcada por estas opções que o Governo tomou ao longo do tempo. Ao longo deste ano, os que não andam de automóvel pagaram pelos muitos que andam e os muitos que andam pouco pagaram muito pelos poucos que andam muito. Durante este período, 110 milhões de contos foram deduzidos das receitas fiscais, o que quer dizer que cada português contribuinte pagou cerca de 25 contos para suportar uma política absolutamente insustentável.
É a este respeito que vos apresento duas grandes ordens de alternativas.
Em primeiro lugar, a que está relacionada com políticas sociais. A razão pela qual no momento da discussão do Orçamento se deveria ter discutido a política de preços de combustíveis é a de que, naturalmente, ela afecta a determinação dos rendimentos no País. Ora, não é depois de se fecharem as negociações com a função pública, que são um sinal para todas as negociações contratuais no País, que se pode, como se não houvesse qualquer influência desta alteração dos preços, vir declarar que agora esta política se aplicará com os aumentos entretanto anunciados. De todos os pontos de vista, e, em primeiro lugar, do ponto de vista da clareza negocial, teria sido indispensável que este aumento estivesse na mesa do debate político do Parlamento e na mesa do debate contratual com os sindicatos.
Mas o problema essencial que esta política levanta é, mais uma vez, o facto de se abdicar de uma estratégia coerente. Porque este facto acresce ao agravamento dos aumentos dos preços de outros combustíveis, que não estiveram limitados por políticas demagogicamente facilitistas, temos uma situação que é fundamentalmente prejudicial aos rendimentos dos sectores populares mais pobres neste país.
Por isso, queria, no verdadeiro sentido da expressão, interpelar o Sr. Primeiro-Ministro e o Sr. Ministro da Economia sobre a sequência e a continuidade dos aumentos que agora nos anunciam. Queria, em particular, saber que política é que o Governo vai desencadear em consequência destes aumentos quanto aos passes sociais ou quanto aos preços de outros combustíveis, que são tão importantes na formação do rendimento disponível das famílias.
O que o Bloco de Esquerda propõe é que, como medida de contenção e como resposta elementar a este aumento agora anunciado, a Assembleia da República delibere, através de uma resolução - que hoje depositámos na Mesa e que será apreciada tão brevemente quanto possível -, que os aumentos dos passes sociais não possam ultrapassar o limiar de 2,5% e que a correcção dos preços do gás propano, do gás butano e do gás natural seja feita de modo a permitir imediatamente a sua redução em 12,5%. Devo, aliás, lembrar que o gás de cidade aumentou 12,5% em Outubro, depois de sequencialmente ter aumentado ao longo do ano, e que a média do aumento do gás natural para todo o ano já ultrapassa os 17,5%.
Entendo que a limitação do aumento dos passes sociais e a determinação da correcção dos preços do gás de consumo doméstico são medidas essenciais que devem ser recomendadas por esta Assembleia da República para uma política coerente sobre os preços dos combustíveis.
Há razões fundamentais para uma orientação deste tipo: a primeira é a de que é preciso responder e minorar os impactos gravosos do aumento dos combustíveis; a segunda é a de que é preciso que a política de preços seja coerente e que tenha uma estratégia.
Por isso, deve obter-se na política de preços dos combustíveis aqueles recursos que permitem combater a injustiça fiscal e, ao mesmo tempo, obter ganhos de eficiência no sistema de transportes públicos, com qualidade, com acessibilidade e com outras regras de mobilidade, de tal modo que o desenvolvimento do sistema público de transportes seja dissuasor, alternativo, e permita abrir outras vias, que não as do uso intensivo do transporte privado.
Enquanto o nosso regime de preços favorecer o gásoleo e estimular o uso intensivo dos combustíveis mais poluentes, enquanto o nosso sistema de preços mentir sobre o que será o seu futuro, enquanto tudo isto consolidar um padrão de consumo e de mobilidade assente no transporte privado, não há alternativa energética e ambiental que se possa conjugar com uma política social séria em relação a estes problemas.
Por isso mesmo é que este conjunto de medidas que o Bloco de Esquerda propõe neste debate e na resolução que submete à Assembleia da República devem igualmente atalhar contra a demagogia.
O Governo tolerou, permitiu ou incentivou que, recentemente, se estabelecesse um bilhete diário intermodal entre a Carris e o Metro em Lisboa. Cito este caso, porque há poucos meses tivemos na Área Metropolitana de Lisboa uma experiência única, que foi a do «Dia sem carros», a 22 de Setembro. Nesse dia, como é sabido, instituiu-se um bilhete multimodal, que custava 300$, que permitia a utilização pela CP, pela Fertagus, pela Carris e pelo Metro, ou seja, no essencial dos fornecedores de transporte colectivo na área da Grande Lisboa, instituiu-se um regime de comunicação estimulado desta forma. Dois meses depois, a Carris e o Metro instituíram um bilhete intermodal a 500$, que não tem sequer vantagens comparativas do ponto de vista económico quanto à utilização rotineira dos preços comuns destes meios de transporte.
Em contrapartida, o que este exemplo trágico mostra é o limite da demagogia, porque, se se quiser ter uma política consistente na interpenetração e na comunicação entre todos os modos de transporte nas áreas metropolitanas da Grande Lisboa e do Grande Porto, tem de se corrigir esta deficiência, que é a de haver mais de 100 títulos de transporte na área da Grande Lisboa e algumas dezenas de títulos na área do Grande Porto. Tem que se fazer essa interpenetração através de uma política de transportes coerente, o que significa um passe multimodal acessível e alternativo.