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21 DE JUNHO DE 2001 11

trução civil, por exemplo, e outros, como o alojamento e a Quem conhece a negociação colectiva que se pratica restauração ou a saúde e a acção social, onde estes regimes em Portugal e nos restantes países da União Europeia sabe de trabalho estão muito presentes. que o grau de detalhe com que a organização do tempo de

Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Antes de ilustrar trabalho é tratado nas convenções colectivas de trabalho as razões que levam o Governo a discordar da iniciativa tende a diminuir quando se passa do acordo de empresa em apreço, quero sublinhar que, tanto quanto sei, nenhum para a convenção colectiva de trabalho sectorial. dos parceiros sociais se pronunciou a favor desta iniciativa Do ponto de vista do Governo, é bom que assim seja. do Bloco de Esquerda, enquanto que vários deles se pro- Primeiro, por respeito pela autonomia das partes con-nunciaram de forma muito crítica. tratantes. Depois, porque a experiência demonstra que

Feita esta constatação, a que o Governo atribui a maior existe, dentro e fora de Portugal, uma contradição, difícil importância, quero começar por evocar perante esta As- de superar, entre o grau de pormenor com que se pode sembleia as dúvidas de constitucionalidade que o projecto regular de forma adequada a duração e os regimes de or-de lei em questão suscitou. ganização do tempo de trabalho e a vastidão do âmbito de

Tais dúvidas radicam, antes de mais, no facto de o di- aplicação dessas mesmas normas. reito de contratação colectiva de trabalho ser, nos termos Também por isso, dentro como fora de Portugal, quer a dos n.os 3 e 4 do artigo 56.º da Constituição, um direito generalidade dos especialistas quer as mais importantes fundamental, a que é aplicável o regime dos direitos, liber- organizações sindicais convergem, quase sempre, na prefe-dades e garantias. E, como se sabe, o n.º 3 do artigo 18.º da rência pela regulação por contratação colectiva das ques-nossa Constituição impede que a lei diminua a extensão e tões relacionadas com a duração e a organização do tempo o alcance do conteúdo essencial dos preceitos constitucio- de trabalho. nais. Um outro exemplo dos motivos que levam o Governo a

No caso vertente, o Governo partilha das dúvidas que discordar das soluções propostas pelo Bloco de Esquerda é alguns parceiros sociais deram a conhecer, durante o pro- a proposta de que a remuneração por trabalho de turnos e cesso de consulta pública a que foi submetida a iniciativa por trabalho nocturno seja calculada (como prevê o artigo legislativa do Bloco de Esquerda, visto que, no seu enten- 17.º projecto) com a base na remuneração média dos traba-der, se está perante um articulado que, em várias matérias, lhadores ao serviço da empresa. não respeita o mínimo de liberdade que é inerente à capa- Trata-se, no entender do Governo, de uma das ilustra-cidade de autodeterminação que a ordem jurídico- ções, aliás, abundante no projecto, das escolhas ideológi-constitucional pretende ver reconhecida aos titulares do cas subjacentes a esta iniciativa do Bloco de Esquerda. direito de negociação colectiva, «expropriando» as asso- Refiro-me, evidentemente, ao intervencionismo legislativo ciações sindicais do seu direito de negociação colectiva, que, em nome de um igualitarismo radical, passa por cima constitucionalmente consagrado. da autonomia colectiva dos interlocutores sociais e do

próprio princípio — tão caro à esquerda europeia e ociden-A Sr.ª Odete Santos (PCP): — Essa teoria deve ser tal — do «salário igual, para trabalho igual».

mesmo só da CIP! Outra ilustração deste intervencionismo legislativo, quiçá de pendor autoritário, é dado pela já referida interdi-O Orador: —As dúvidas de constitucionalidade, por ção de trabalho nocturno ou em regime de turnos aos tra-

violação do direito ao trabalho na sua vertente de igualda- balhadores a tempo parcial, ou em regime de trabalho de de oportunidades, existem também a propósito de nor- temporário, ou, ainda, aos que têm as idades que já referi. mas como a que institui a proibição de trabalho por turnos Se se quisesse apenas proteger os direitos individuais e nocturno aos maiores de 50 ou 55 anos, consoante as ou colectivos dos trabalhadores, não se teria, como se faz situações, ou a que veda estes regimes de trabalho a traba- no projecto em apreço, interditado o trabalho nocturno e lhadores a tempo parcial ou em trabalho temporário. por turnos naquelas situações, o que, manifestamente,

Mas, ainda que as dúvidas de constitucionalidade já prejudica o direito ao trabalho e ao emprego daqueles mencionadas não fossem reconhecidas, a discordância grupos de trabalhadores. manter-se-ia já que, ao contrário do que se visa com o Poder-se-ia — como se faz, por exemplo, no ordena-projecto de lei em apreço, o Governo entende que uma mento jurídico espanhol — ter optado por reconhecer ao intervenção legislativa neste domínio só se justifica se, trabalhador por turnos um direito de preferência na ocupa-como acontece na generalidade dos países europeus, ela ção de um posto de trabalho diurno para o qual disponha tiver um carácter supletivo e se restringir — como, aliás, de capacidades de adaptação. Ou poder-se-ia, talvez, ter propõem quer as associações sindicais que se pronuncia- ido mais longe e prever que, em circunstâncias a fixar por ram quer a própria Confederação Europeia de Sindicatos convenção colectiva de trabalho, a partir da verificação de — a prever os aspectos que a contratação colectiva de determinados pressupostos, o trabalhador teria o direito de, trabalho não pode regular de forma adequada. querendo, deixar de trabalhar à noite ou em regime de

Ora, o projecto de lei n.º 420/VIII tem um carácter vin- turnos. cadamente regulamentador, que não tem em conta nem as Nas convenções colectivas de trabalho portuguesas, há consequências das especificidades tecnológicas e organi- exemplos vários de opções deste tipo. zacionais das diferentes empresas e sectores económicos Os Srs. Deputados do Bloco de Esquerda optaram por nem, sequer, os interesses e as preferências dos trabalhado- propor a pura e simples interdição do trabalho nocturno res, que podem variar em função de características tão àqueles grupos de trabalhadores. importantes como a localização da empresa, a qualificação É, certamente, um direito que lhes assiste. Mas não ou a composição social do emprego. podem esperar que o Governo os acompanhe, pelas razões