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0178 | I Série - Número 06 | 28 de Setembro de 2001

 

A grande diferença está em que a primeira reforma agrária foi merecidamente apodada de «tractorista», enquanto que a que hoje nos é proposta é uma reforma agrária de «colarinho branco», com todos os cuidados de imagem e de lei, por forma a que se adeqúe ao momento político e social que vivemos.
Mas a verdade é que o projecto de lei do PCP, visto mais de perto, põe em causa, hoje, como há 25 anos, o valor da propriedade privada e os direitos individuais dela decorrentes. Poderíamos mesmo dizer que, salvaguardadas as devidas distâncias, particularmente de carácter semântico, «assentaria como uma luva» no intróito deste projecto de lei do PCP o que consta da parte equivalente do famoso Decreto-Lei n.º 406-A/75, no passo em que afirma «Os dispositivos legais contidos no presente diploma constituem apenas um quadro geral de ataque à grande propriedade e à grande exploração capitalista da terra. (…) Enquanto momento estatal, deve sublinhar-se ainda o carácter deliberadamente parcelar do presente diploma, já que se limita, praticamente, a prever e regular o processo de desapossamento da grande propriedade da terra e da grande exploração capitalista (…)».
À luz da coerência e persistência comunista, é fácil de compreender este projecto de lei, mas esta compreensão torna-se ainda mais fácil se tivermos em linha de conta que o PCP joga aqui boa parte da sua sobrevivência, tentando dramaticamente recuperar «bandeiras perdidas» e reencontrar uma causa partidária que lhe dê novo fôlego e novo alento.

Protestos do Deputado do PCP Rodeia Machado.

Mas se é fácil compreender tudo isto, não é fácil aceitar. Mais: quanto melhor se compreende mais inaceitável se torna.
Para o PSD o presente projecto de lei é absolutamente inaceitável.
Não temos uma visão sacralizada da propriedade; defendemos que a terra tem uma função social e aceitamos claramente os limites de interesse e utilidade pública que lhe são apostos na lei na e Constituição. Mas não podemos aceitar que, de uma penada, talhando a direito, se expropriem milhares de hectares, sem reconhecer que o interesse público pode ser prosseguido sem sacrifício dos interesses e dos direitos individuais.
O projecto de lei do PCP, para cúmulo, usa o expediente da declaração de utilidade pública de urgência para passar por cima de algumas das garantias jurídicas e legais dos particulares, e para se assegurar de que o Estado não terá de promover, previamente, outras formas de aquisição.
Cumpre ainda dizer, que não nos opomos à ideia, por si só, da existência de um banco de terras que está, aliás, prevista na Lei de Bases do Desenvolvimento Agrário, a Lei n.º 86/95, de 1 de Setembro. Não podemos é aceitar que se avance para a sua criação sem saber previamente: primeiro, qual é a área de que o Estado dispõe, efectivamente, no perímetro de Alqueva, para afectar a este banco de terras; segundo, quantos são os agricultores credenciados pela sua competência técnica, para a exploração de empresas agrícolas com níveis de produtividade e rendimento adequado, realmente interessados na aquisição de terra dentro deste perímetro; terceiro, que meios alternativos à expropriação foram efectivamente equacionados, em ordem à aquisição de terras para a criação do referido banco de terras. A responsabilidade é, nesta matéria, cometimento do Governo que revela não ter respostas nem estar preparado para encarar o problema, criando alternativas reais ao projecto de lei do Partido Comunista Português.
O debate de hoje é centrado nas medidas de reestruturação fundiária, mas a Lei de Bases do Desenvolvimento Agrário prevê, a par do banco de terras, medidas como o emparcelamento. Interessaria saber se o Partido Comunista Português, sabendo - com certeza, sabe! - que cerca de 30% do perímetro de rega de Alqueva é integrado por prédios com áreas entre os 0 e os 20 ha, encara, para estes prédios, o emparcelamento, já que está de facto, como alega, apenas interessado na produtividade e na rentabilidade das explorações agrícolas, para as quais decidiu que a medida adequada seria a de 50 ha.
Interessaria igualmente saber se o Partido Comunista sabe que cerca de 60% dos 110 000 ha de área a beneficiar pelo Alqueva é composta por prédios com área superior a 50 ha. Qual será a estrutura e o custo financeiro desta operação massiva de expropriação? Srs. Deputados, 70 000 ha é muita terra! 70 000 ha é um custo financeiro muito elevado para esta operação.
Mas o Partido Comunista Português também sabe que os 70 000 ha que ficariam sujeitos à expropriação representam, divididos em explorações com a área máxima de 50 ha, a necessidade de encontrarmos 1400 novos agricultores que ali fixassem as suas explorações.
A minha maior preocupação, em relação ao Alentejo, passa pela sua desertificação. Mas será que poderemos encontrar de facto 1400 agricultores que queiram fixar-se no perímetro de rega de Alqueva?
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a distância que nos separa do projecto de lei do PCP é abissal, situa-se no plano dos princípios, como no campo da prática política. Não renunciaremos, nunca, à nossa matriz de valores, em que se inscreve o respeito pela propriedade privada, como um entre outros direitos individuais. Não desistiremos, nunca, do desenvolvimento económico do País, designadamente da modernização do sector agrícola e do desenvolvimento global do Alentejo. Mas além disto, não permitiremos, nunca, que, em nome de valores superiores, em que não nos revemos, ou do desenvolvimento agrícola ou do desenvolvimento económico de uma região ou do País, alguns queiram apenas fazer um manifesto de sobrevivência política, buscando novas causas partidárias.

Aplausos do PSD.

O Sr. Presidente (Manuel Alegre): - Sr.ª Deputada, é sempre bom ouvir ler Camões aqui, na Assembleia da República, mas, se não me leva a mal, o último verso do soneto que leu é «Que não se muda já como soía» - o «já» estava fora de sítio.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Miguel Ginestal.

O Sr. Miguel Ginestal (PS): - Sr. Presidente, Sr. Ministro da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, Srs. Secretários de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: A discussão que, em boa hora, somos hoje convocados a fazer, incide sobre um dos eixos prioritários de qualquer política agrícola nacional, em concreto, a água.
Para o PCP, a política da água para fins agrícolas em Portugal é o Alqueva. Para nós, é o Alqueva, mas não só: é todo o País.