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2286 | I Série - Número 041 | 22 de Janeiro de 2004

 

Senão, vejamos.
Disse o Governo que ia regularizar os brasileiros que cá estivessem em situação irregular, com base no Acordo de Contratação Recíproca entre o Estado português e o Estado brasileiro, procurando contornar as regras estabelecidas na Lei de Imigração, que exigem que os vistos de trabalho sejam concedidos nos consulados do país de origem dos imigrantes.
Foi anunciado que os imigrantes brasileiros poderiam, então, obter visto de trabalho junto de outros consulados portugueses, nomeadamente em Vigo ou Sevilha. Mas - e esta é a primeira fraude - são exigidos vários documentos que têm de ser obtidos no Brasil, cuja obtenção depende de procuração ou de uma ida ao Brasil. Inúmeros imigrantes foram a Vigo ou a Sevilha e voltaram para trás sem ver a sua situação regularizada.
Resultado: de 31 000 imigrantes que se inscreveram no recenseamento estão regularizados, até ao momento, apenas 76 imigrantes. Repito, apenas 76 imigrantes! O acordo com o Presidente Lula, assinado com tanta pompa e circunstância, deu, até agora, isto: 76 imigrantes legalizados. O Governo deu esperanças a estes imigrantes. O Governo enganou estes imigrantes. Mais uma vez se prova que o Governo disfarça, com retórica PSD, a aplicação do programa do CDS.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Insiste a maioria nos acordos bilaterais, que, mais do que constituírem instrumentos de regulação das relações entre Estado, passam agora a constituir instrumentos de discriminação de imigrantes ou potenciais imigrantes em função da sua nacionalidade, o que fere de morte qualquer imperativo constitucional de igualdade.
Há uma agravante nesta possibilidade de adopção de uma política de selectividade de origens nacionais. A experiência de Portugal, com tradição migratória, tem demonstrado que a tendência é para que os fluxos migratórios se avolumem exactamente na ausência de mecanismos de promoção da migração legal e para que, nestes casos, se verifiquem processos de constituição de estruturas informais e clandestinas de recrutamento de mão-de-obra com intenção de defraudar, mais uma vez, estes imigrantes. Esta situação concretizar-se-á facilmente se forem levadas a cabo as intenções de celebrar acordos bilaterais apenas com alguns países da CPLP, enquanto a realidade recente é a do incremento de fluxos migratórios das mais diversas origens, nomeadamente dos países de Leste.
Que critérios serão estabelecidos para a concessão de vistos de trabalho ou de residência a nacionais de países com os quais Portugal não estabeleça qualquer acordo? Terão possibilidade de acesso a um visto ou sobrar-lhes-á apenas a clandestinidade, mesmo que camuflada num visto de turista, como solução para efectuar qualquer percurso migratório?
Diz a maioria que garante o acesso à saúde e à educação para crianças estrangeiras, ainda que filhas de imigrantes legais. E a protecção jurídica e social, quem a garante? E a licença de maternidade e paternidade, em caso de doença destas crianças, quem as garante? E a protecção laboral dos pais? E o direito à estabilidade e dignidade de vida nas suas mais variadas dimensões, quem o garante? É que as crianças não vão ao hospital sozinhas, não estudam sozinhas, não vivem sozinhas.
Como pretende a maioria fazer a articulação desta medida com a iminência de expulsão dos pais? Pretende aceitar os filhos na escola para, depois, expulsar os pais? A hipocrisia não tem limites.

Vozes do BE: - Muito bem!

O Orador: - Nada diz a maioria sobre o reagrupamento familiar restrito apenas aos que possuam autorização de residência há mais de um ano, nem sobre as dificuldades de obtenção de autorização de residência autónoma, por exemplo, por uma mulher imigrante que seja vítima de violência doméstica. Nem sobre a lastimável situação dos familiares de imigrantes com autorização de permanência que vêem dificultada qualquer possibilidade de trabalhar em condições de protecção legal.
Nada diz a maioria sobre como prevê regulamentar os mecanismos de cancelamento de vistos, de autorizações de permanência e de autorizações de residência, nem sobre quais os critérios de renovação destas últimas. Basta o imigrante ficar desempregado para perder o direito aos seus documentos? Quais os critérios que serão estabelecidos para a comprovação dos "meios de subsistência" e das "condições de alojamento"? Quais as taxas aplicadas para o caso de renovação de documentos?
Diz a maioria que outros imigrantes, para além dos brasileiros, serão regularizados. Só que os critérios são confusos.
Um primeiro critério é claro: entrada antes de Março de 2003. O outro critério - descontos à segurança social e ao fisco - faria todo o sentido se garantisse o acesso automático à legalização, mas é acrescido da exigência de registo criminal referente ao nosso país e ao país de origem. Tentem tratar