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3268 | I Série - Número 058 | 04 de Março de 2004

 

Abstive-me na votação do projecto de lei n.º 405/IX, apresentado pelo PS, consciente do drama pessoal de muitas mulheres que obriga a encontrar soluções que garantam o respeito pela dignidade das pessoas, o combate efectivo ao aborto clandestino e o pleno cumprimento da legislação em vigor. Se a minha consciência moral condena o aborto, entendo que o Estado democrático deve proceder a uma correcta regulação da prática do aborto, o que passa pelo aperfeiçoamento do sistema em vigor de causas de exclusão da ilicitude. O projecto de lei em causa representa uma boa base de trabalho, cuja adopção obriga a um esforço no sentido da efectiva concretização da legislação já em vigor. A situação actual deve-se, no entanto, menos à falta de legislação do que à não aplicação ou à aplicação deficiente das leis. São assim o Estado de direito e a preservação de uma sociedade aberta que estão em causa.
Nesse sentido, deve proceder-se a um levantamento rigoroso sobre a efectiva aplicação do regime jurídico vigente, designadamente quanto às causas que levam ao seu incumprimento ou deficiente cumprimento. Trata-se de garantir o exercício pelas mulheres do direito e do dever inerentes a uma maternidade responsável digna e saudável. Prevê, assim, o projecto em causa o alargamento das causas de exclusão da ilicitude e procura ponderar a complexidade dos valores envolvidos nesta matéria. E as cautelas postas na elaboração do projecto de lei n.º 405/IX são evidentes e merecem ser assinaladas. Considera novas causas de exclusão da ilicitude. Criminaliza a publicidade ilegal à interrupção voluntária da gravidez.
A dignidade da pessoa humana deve ser salvaguardada, considerando o respeito equilibrado dos valores éticos em presença. O aborto é sempre um mal e uma solução indesejável e extrema, assumida tantas vezes dramaticamente, podendo não ser sujeita a uma sanção penal. Não basta, por isso, dizer que, na prática, as mulheres não são condenadas, ou que se deseja que não o sejam. É preciso tomar medidas consequentes que favoreçam a justiça. E não se confunda vida, vida humana e pessoa humana - como o fazem diversas vozes fundamentalistas. Eis por que a dúvida que me assiste tem ainda a ver com a eficácia das medidas de apoio à mulher, designadamente dos Centros de Acolhimento Familiar. A solução não é sancionar penalmente.
Não deve haver dois pesos e duas medidas. As dimensões ética e jurídica deverão salvaguardar a prevenção, a formação e o apoio e não o sancionamento. É necessário atender às circunstâncias de cada caso. Numa lógica de laicidade, o Estado de direito deve consagrar um conjunto de medidas de fácil e efectiva concretização, que vão desde a educação sexual (cujo retrocesso a que hoje assistimos é motivo de séria preocupação) até ao planeamento familiar e à actuação efectiva e eficaz dos Centros de Acolhimento Familiar. As esferas ética e jurídica devem ser vistas e consideradas na sua especificidade. Ao Estado democrático não compete, porém, realizar um julgamento moral de quem quer que seja. O que está em causa neste debate não é uma justificação social ou moral do aborto. Daí a necessidade de se prosseguir um caminho árduo e de sensibilização da opinião pública, no sentido do combate à exclusão e do apoio efectivo às mulheres postas perante situações-limite.

O Deputado do PS, Guilherme d'Oliveira Martins.

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Votei favoravelmente o projecto de lei n.º 405/IX, apresentado pelo PS, por entender que ele se situa no quadro do alargamento das causas de exclusão da ilicitude, em termos que procuram ponderar a complexidade dos valores envolvidos nesta matéria, de forma que se me afigura em geral equilibrada, e pela distinção que deve existir entre a lei penal e as convicções que cada um de nós tenha sobre esta matéria. O aborto é sempre uma solução indesejável, mas não pode ser sempre sujeita a uma sanção penal. O que está em causa com este projecto de lei não é a sua justificação social ou moral e muito menos a consagração de um direito ao aborto.
O projecto alarga a área da responsabilidade ética de quem em consciência ou movida pela necessidade entende dever recorrer à interrupção voluntária da gravidez. Fá-lo ao considerar novas causas de exclusão da ilicitude. Permite-o apenas nas primeiras 10 semanas para ter em conta a valoração do estado dos conhecimentos médicos, o que se me afigura ser um elemento fundamental a ter em conta sempre nesta matéria.
O projecto introduz uma inovação que se me afigura positiva: a criminalização da publicidade ilegal à interrupção voluntária da gravidez.
Um elemento essencial para uma prática equilibrada, responsável e consciente desta lei afigura-se-me ser o funcionamento dos Centros de Aconselhamento Familiar. A forma de funcionamento destes centros deve ser adequadamente regulamentada de forma a que seja possível evitar as gravidezes indesejadas e as mulheres informadas das opções que não impliquem o recurso à interrupção voluntária da gravidez.