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3352 | I Série - Número 060 | 06 de Março de 2004

 

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - É isso mesmo!

A Oradora: - Acontece, porém, que o projecto lei, ao consagrar um regime específico para a mutilação genital feminina, acaba, embora sem o pretender, por tratar a questão do consentimento de forma mais leve e menos grave do que a que resulta do regime actualmente vigente, já que ao invés de punir o agente, que conhece o consentimento da mulher, com pena idêntica ao que realiza a prática sem esse consentimento, ou seja, prisão de 2 a 10 anos, o pune apenas com uma pena de prisão até 3 anos, o que é substancialmente inferior e não nos parece adequado.

A Sr.ª Odete Santos (PCP): - Exacto!

A Oradora: - Acresce que, face à pequena expressão que o problema tem entre nós, é duvidoso que deva merecer uma tipificação específica.
Pode, inclusive, essa atitude ser interpretada como discriminatória pelas minorias que muito respeitamos e prejudicar o processo de integração de algumas comunidades imigrantes, em que todos estamos empenhados e que pretendemos plena e pacífica.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Pelas razões expostas, o Grupo Parlamentar do PSD, reconhecendo e aplaudindo a importância desta iniciativa legislativa, que teve, desde logo, o grande mérito de trazer a debate e alertar para esta problemática, propõe a reanálise do projecto de lei na 1.ª Comissão, a fim de que se encontre a solução mais adequada, até no quadro global das alterações ao Código Penal, que, como é sabido, estão em apreciação na mesma Comissão.

Aplausos do PSD, do PS e do CDS-PP.

O Sr. Presidente: - Igualmente para uma intervenção, tem a palavra a Sr. ª Deputada Isabel Castro.

A Sr. ª Isabel Castro (Os Verdes): - Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A mutilação genital feminina é um acto de violência, que não pode, em caso algum, ser aceite ou ser justificado.
A mutilação genital feminina é uma violação dos direitos humanos e, como aqui já foi referido, os direitos humanos são universais, não têm diferentes interpretações em diferentes latitudes.
A mutilação genital feminina significa, a par do apedrejamento, da punição em praça pública, dos casamentos forçados, da escravatura, do tráfico e da exploração sexual, é um dos muitos crimes que são cometidos com base no género e em valores ditos de honra e que afectam mulheres de todas as idades, culturas e religiões. Não é uma realidade que possa ser tolerada de modo algum, já que, para além de atentatória da integridade humana e da saúde física e mental das mulheres, reflecte a discriminação de que, lamentavelmente, muitas e muitas mulheres são ainda objecto em todo o planeta.
A mutilação genital feminina é, pois, um atentado horroroso contra a integridade física da mulher, contra a sua dignidade e contra a plenitude dos seus direitos sexuais e reprodutivos, que não pode, em caso algum, ser aceite.
A realidade da mutilação genital feminina, tal como outras formas peculiares de violência contra as mulheres, tem sido objecto de cada vez maior atenção por parte dos diferentes fóruns internacionais. Sabe-se quais são os cerca de 28 países - situam-se, principalmente, no continente africano e em alguns países da península arábica, como o Iémen, os Emiratos Árabes Unidos, na Indonésia e na Malásia - onde esta violência contra as mulheres é perpetrada.
Sr. Presidente e Srs. Deputados, a questão que para nós se coloca na discussão desta iniciativa política, que compreendemos na sua bondade, é a de saber em que medida a procura de tipificação diferenciada se justifica para além daquilo que o Código Penal já contempla no seu artigo 144.º, que, do nosso ponto de vista, dá total enquadramento jurídico ao crime que a mutilação genital feminina tem implícito. Do nosso ponto de vista, não se justifica, e por isso temos imensas reservas em relação a esta iniciativa e à solução que ela preconiza.
Temos para nós que há um enorme trabalho a fazer, tal como é alertado em muitas das recomendações internacionais do Conselho da Europa e como também já foi referido em recomendação do Parlamento Europeu. Recordo, aliás, que a mesma recomendação do Parlamento Europeu, que chama a atenção para a necessidade de os países que não têm legislação - não é o caso do nosso - de punição da mutilação genital feminina a criem, exorta os países a que se abstenham de agir judicialmente contra as mulheres que tenham feito abortos ilegais. O problema que está colocado é, no mesmo plano e sempre em última análise, o velho problema, tão lentamente resolvido, da garantia da plenitude de direitos para as mulheres.
Em nosso entendimento, há um trabalho de prevenção e de informação a fazer no nosso país, é necessário que a cooperação portuguesa faça aquilo que ao longo de anos não tem feito, designadamente