10 DE NOVEMBRO DE 2006
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3. Discordo igualmente da redução dos benefícios fiscais para os deficientes, medida que, não tendo
grande peso no acerto das contas públicas, tem um significado negativo do ponto de vista social. Não tenho
uma visão da justiça social que implique, nesta questão tão sensível, retirar a uns para dar aos outros.
4. Discordo profundamente das taxas moderadoras para internamentos e cirurgias, as quais, segundo o
Ministro, não representam mais do que 1% dos gastos do Serviço Nacional de Saúde mas constituem, em
meu entender, uma dupla tributação que contraria frontalmente a filosofia do Serviço Nacional de Saúde.
Como disse Constantino Sakellarides, Director-Geral de Saúde do governo de António Guterres, estas taxas
são «taxas de punição dos doentes» que apenas servirão para «pressionar o doente a pressionar o médico»
no sentido de reduzir o internamento. Um princípio subjacente ao SNS é o de que nós pagamos os nossos
impostos e fazemos os nossos descontos para podermos beneficiar do sistema quando estamos numa
situação de maior vulnerabilidade. A existência destas taxas moderadoras pode ser um primeiro passo na
alteração dos princípios fundamentais do SNS. Oxalá a discussão na especialidade permita reconsiderar este
risco.
5. A tributação efectiva aos bancos em Portugal, embora tenha vindo a aumentar desde 2003, ano que
registou um valor médio na ordem dos 12,46%, continua muito aquém dos 25% de IRC pagos por qualquer
pequena empresa — incluindo micro e pequenas empresas, que no fundo representam a larga maioria das
empresas portuguesas. Em 2004 estes valores eram da ordem dos 13,65%. Os valores médios actuais
situam-se nos 17%. Por outro lado, os lucros dos maiores bancos privados têm subido significativamente,
sobretudo nos dois últimos anos, muito acima dos valores médios atingidos noutros sectores. Este
crescimento fez-se, entre outras causas, à custa do fortíssimo endividamento das pessoas — sobretudo no
crédito à habitação e ao consumo — e num cenário económico de muito fraco crescimento ou quase
estagnação.
O Orçamento do Estado para 2007 prevê a criação de provisões específicas para o sector bancário
(cobertura de risco de crédito, de risco-país, para menos-valias de títulos de carteira de negociação e para
menos-valias de outras aplicações). E para as seguradoras prevê a criação de provisões técnicas e provisões
para prémios por cobrar. Em ambos os casos o efeito prático destas medidas é o de uma redução do imposto
a cobrar e uma efectiva perda de receita fiscal.
A banca e as seguradoras devem, em meu entender, pagar os mesmos 25% de IRC pagos por qualquer
outra empresa, limitando por completo o recurso ao «planeamento fiscal», estratégia legal normalmente usada
pelo sector para reduzir o montante de IRC pago.
O Primeiro-Ministro fez declarações interessantes em relação à banca. São um passo positivo com alguma
tradução neste Orçamento, em meu entender ainda insuficiente. Também o Bloco de Esquerda apresentou
uma proposta que fixa em 20% o mínimo de IRC a ser pago pela banca. Contudo, penso que a taxa efectiva
deve ser igual à dos outros sectores de actividade, ou seja, 25%. Nada justifica um tratamento privilegiado,
pelo contrário.
6. Considerado o Orçamento do Estado na sua totalidade, compreende-se a política de contenção
proposta, dado que o compromisso assumido com a União Europeia impõe a Portugal, para 2007, um défice
orçamental não superior a 3,7%. Não é grande a margem de manobra. Mas, como lembra Stiglitz, não há um
só modelo de economia de mercado, há várias escolhas possíveis e estas devem ser determinadas por
critérios políticos democráticos e não meramente tecnocráticos. Por muito grandes que sejam as limitações,
não é o Orçamento que deve comandar a política mas a política que deve comandar o Orçamento. Não se
pode, por outro lado, esquecer que o PEC privilegia a estabilidade face ao crescimento, valorizando o controle
da inflação e dos défices públicos orçamentais. Esta política tem gerado na Europa custos sociais elevados,
nomeadamente o aumento do desemprego. Aproveitando a presidência rotativa da UE, o Governo português
poderia propor uma revisão do PEC, sobretudo no que diz respeito à não inclusão das despesas de
investimento público nas contas do défice do Estado. Os países da zona euro são assimétricos, as realidades
são diferentes. Os Estados-membros não podem ser despojados de instrumentos que lhes permitam combater
as assimetrias e desigualdades, tendo em vista a coesão e a solidariedade. No caso português, o PEC não
pode desarmar o Estado, quer para combater a desertificação, objectivo que tem de ser considerado como um
imperativo patriótico, quer para promover o crescimento económico e garantir a coesão social, sem a qual a
própria coesão nacional fica em risco.
O Deputado do PS, Manuel Alegre.
Srs. Deputados que entraram durante a sessão:
Partido Socialista (PS):
João Cardona Gomes Cravinho
Partido Social Democrata (PSD):
António Paulo Martins Pereira Coelho
José Eduardo Rego Mendes Martins