I SÉRIE — NÚMERO 30
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Quarto, abrir o sistema para soluções de reconciliação entre a ordem jurídica interna e instâncias jurisdicionais internacionais, tornando a nossa ordem processual civil mais adaptada à vida internacional contemporânea.
Cerca de 50% dos recursos conhecidos pelos tribunais da Relação são de natureza cível e no Supremo Tribunal de Justiça essa percentagem sobre para 60%.
Pode dizer-se que o Supremo Tribunal de Justiça está hoje ameaçado por uma tendência para a trivialização, com muitos processos a fazer um percurso típico pela primeira, segunda, terceira instâncias, até ao fim da «escada». Em consequência, o Supremo Tribunal de Justiça é levado a debruçar-se, muitas vezes, sobre questões repetitivas, de escasso valor jurídico-social.
Em pouco mais de uma década, duplicou o número de recursos cíveis que sobem ao Supremo Tribunal de Justiça. Desses processos, 50% versam dívidas civis e comerciais, que, assim, realizam esse percurso em três etapas. E 50% dessas dívidas que sobem ao Supremo Tribunal de Justiça têm um valor inferior a 30 000 €. Este afluxo de processos contribuiu para explicar a actual configuração do Supremo Tribunal de Justiça.
Apresentamos uma proposta que, claramente, favorece uma evolução do Supremo, não no sentido que a realidade tem vindo a seguir mas no sentido de um papel virado para a orientação e uniformização da jurisprudência.
A vida jurídica e a vida económica requerem um contributo mais intenso em matéria de previsibilidade do direito. Racionaliza-se, por consequência, o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça: por princípio, perante duas decisões concordantes sobre o mesmo caso e sem votos de vencido, o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, ainda que preenchidos os requisitos legais, deixa de ser automático. O mesmo acontece, aliás, em caso de conformidade com jurisprudência uniformizada.
Este princípio poderia oferecer riscos se desacompanhado de complemento adequado. Assim, abre-se a possibilidade de acesso ao Supremo Tribunal de Justiça quando esteja em causa uma questão que, pela sua relevância jurídica ou por versar interesses imateriais de particular relevância social, deva ser clara e necessariamente apreciada para uma melhor aplicação do direito.
Quanto à decisão preliminar sobre o preenchimento destes pressupostos, a opção vai na esteira daquela que, há pouco tempo, foi introduzida no contencioso administrativo, com alguns aperfeiçoamentos decorrentes dos contributos verificados nas audições já realizadas.
Na reforma agora proposta, adoptamos uma nova visão acerca dos conflitos de competência, isto é, conflitos que são responsáveis por uma grande parte do tempo despendido nos processos.
Nalguns anos, um terço dos recursos versaram conflitos de competência, isto é, conflitos em que se discute não o que deve decidir-se sobre um caso mas, sim, quem deve decidi-lo.
Ora, o que se propõe agora é que seja um juiz singular, num único grau e num processo com carácter urgente, a decidir quem é competente.
Vozes do PS: — Muito bem!
O Orador: — Foi simplificação e racionalização, do ponto de vista conceptual e prático, o que se pretendeu com a reformulação dos recursos ordinários e extraordinários, com o fim da existência autónoma do agravo e da oposição de terceiro e a consagração de um recurso para a uniformização da jurisprudência, em linha com o novo papel sistémico previsto para o Supremo Tribunal de Justiça.
A Sr.ª Sónia Sanfona (PS): — Muito bem!
O Orador: — As soluções preconizadas consagram, também, uma sensível redução do número de actos e intervenções exigidos de cada parte e do tribunal, através da concentração de peças e de despachos.
Prevê-se, por outro lado, a prática, em simultâneo, de actos que vinham sendo realizados sequencialmente, como a tecnologia de há décadas atrás podia explicar mas que hoje não tem fundamento. É o que se passa, por exemplo, com as vistas, que passam a processar-se preferencialmente por meios electrónicos e de forma simultânea.
Com tudo isto, recupera-se, para além de lógica e de simplicidade, no mínimo, semanas ou, mesmo, meses preciosos para a marcha dos processos.
Na proposta prevê-se, expressamente, que a gravação digital do julgamento possa ser em áudio ou, logo que possível, em vídeo e que haja uma identificação precisa e separada dos depoimentos. Isto de modo a permitir que as partes indiquem as passagens da gravação em que se fundam, sem prejuízo de poderem proceder, por sua iniciativa, à respectiva transcrição.
Estamos a prever que, durante o ano de 2007, ano em que a reforma deverá entrar em vigor, um terço dos tribunais sejam equipados com sistemas de gravação com a valência vídeo, de forma a que a realidade possa aproximar-se da previsão normativa.
Actualizam-se as alçadas. Na 1.ª instância, a actualização é inferior à que a inflação justificaria, pois entendemos que o primeiro grau de recurso não deve ser restringido mas, sim, reforçada a garantia de acesso em relação ao alcance de outras opções tomadas no passado. Na 2.ª instância, o valor é, pelo contrário,