I SÉRIE — NÚMERO 38
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da comunidade, exercendo um trabalho permanente na promoção da saúde e na prevenção da doença, com elevada proximidade dos lugares onde as pessoas vivem e trabalham, está a ser substituída por uma mera assistência médica primária, exclusivamente centrada no tratamento da doença e em cuidados ocasionais prestados quando procurados pelos utentes.
É esta, obviamente, a solução que convém à lógica de privatização, por ser facilmente mensurável para efeitos de remuneração.
Esta é, aliás, a lógica aplicada à importante área da saúde pública. O Governo anunciou ser esta uma das áreas a transitar para as autarquias locais. Desta forma, o Governo alivia o Orçamento central de mais uma responsabilidade, transferindo um conjunto de serviços fortemente depauperado ao longo dos anos e prosseguindo, assim, a conveniente desfragmentação dos cuidados primários de saúde.
A medida foi anunciada — pasme-se! — pelo Ministro da Administração Interna, presume-se com o conhecimento do Ministro da Saúde. Mas a verdade é que a saúde pública não pode ser entendida como a gestão do canil municipal!… É uma especialidade fundamental em qualquer moderno sistema de saúde, tem um papel crítico em situações de emergência ou de epidemia e pandemia, como a insistentemente anunciada gripe das aves. Uma medida deste tipo constitui uma regressão de cem anos e o regresso ao modelo dos médicos municipais do século XIX. Tal é a «modernidade» deste Governo e da sua política!
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — O acesso aos cuidados de saúde é cada vez mais difícil: mais de 200 000 pessoas estão em lista de espera para cirurgias, não se conhece a outra lista de espera para consultas de especialidade, mas é igualmente elevada; verifica-se a manutenção de muitas centenas de milhares de utentes sem médicos de família, problema que não pode ser resolvido com o mero aumento do número de utentes por médico de família mas, sim, com uma aposta séria (que não existe) na Medicina Geral e Familiar; e a saúde oral continua ausente do Serviço Nacional de Saúde, entre tantas outras matérias.
Sr. Presidente, Srs. Deputados: Se há coroa de glória que este Governo quer para si não é a da melhoria do acesso à saúde mas, sim, a do sucesso da operação de restrição orçamental a que se entregou.
O Governo vangloria-se de ter controlado, finalmente, a despesa pública.
A Sr.ª Maria Antónia Almeida Santos (PS): — É importante!
O Orador: — Mas a que preço! A poupança foi obtida quer com a compressão dos direitos dos trabalhadores da saúde, quer com uma crescente transferência de custos para os utentes. Mas não houve ganhos significativos onde o Governo pode poupar: na transferência de recursos para o sector privado sem esgotar a capacidade instalada do SNS ou de forma ineficiente.
De facto, os dados das últimas contas do SNS, por exemplo relativamente à despesa nos cuidados primários de saúde, mostram que mais de 50% são gastos com medicamentos e meios de diagnósticos e terapêuticos. Entretanto, sabemos que continua a haver capacidades por explorar nos hospitais públicos e que seria possível utilizar essa capacidade para dar resposta aos centros de saúde.
Sabemos igualmente que em matéria de política do medicamento, onde devia haver medidas de contenção da voracidade dos agentes económicos desse sector, o que temos são cedências protocoladas aos seus interesses.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Orador: — Para além da restrição dos direitos e remunerações ao nível dos trabalhadores da saúde, do corte brutal no investimento e nos orçamentos das unidades, esta poupança assentou, em grande medida, na transferência de mais custos para os utentes, que suportam já de forma directa mais de 30% das despesas com a saúde.
Os portugueses pagam mais taxas moderadoras, pagam medicamentos mais caros, pagam cada vez mais consultas e tratamentos no sector privado por falta de resposta no sector público.
Em matéria de medicamentos, o Governo fez uma verdadeira razia nas comparticipações, e não vale a pena invocar a redução de 6% no preço dos medicamentos para justificar todas as outras medidas! De resto, está por fazer a avaliação do efeito destas reduções administrativas, designadamente em relação à estratégia adoptada pela indústria. O que é certo é que, enquanto a diminuição das comparticipações veio para ficar, não haverá certamente mais reduções de preços.
Protestos do Deputado do PS Manuel Pizarro.
Entretanto, o Governo aboliu a majoração na comparticipação dos medicamentos genéricos, condicionou administrativamente o acesso ao regime especial de comparticipação para os idosos de rendimentos mais baixos.