29 | I Série - Número: 010 | 18 de Outubro de 2007
da Administração Pública integra-se na dita «reforma» mais ampla, o PRACE. Para concretizar o encerramento de serviços públicos, para desmantelar as funções essenciais do Estado, para promover a entrada do sector privado em novas áreas de negócios, o Governo necessitava de novos instrumentos legais.
Assim, surge o regime da mobilidade, o regime dos vínculos, o SIADAP, que estamos agora a discutir, para, no futuro, o Governo apresentar o novo regime de contrato de trabalho em funções públicas e, posteriormente, as alterações ao regime disciplinar dos trabalhadores da Administração Pública.
O Governo, nos diplomas que já apresentou, ataca um conjunto de direitos dos trabalhadores, nomeadamente o vínculo e a estabilidade no emprego, com o objectivo de desmantelar uns serviços e de entregar outros à «gula» do sector privado. É este o contexto em que é apresentado o SIADAP.
Analisemos algumas das propostas em concreto: o Governo mantém o absurdo sistema de quotas para as classificações mais elevadas, com o objectivo de limitar a progressão na carreira dos trabalhadores. Na verdade, a progressão na carreira, já fortemente condicionada no diploma dos vínculos, depende da obtenção de 10 pontos na avaliação. Ao limitar a classificação mais elevada a 25% dos trabalhadores, mesmo que haja mais trabalhadores a merecerem esta classificação, o Governo arreda a grandessíssima maioria dos trabalhadores da legítima pretensão de progredir na carreira.
Curiosa é a posição do Partido Socialista quanto às quotas. Na oposição, dizia-se contra o sistema de quotas, agora é um acérrimo defensor desse mesmo sistema. O Sr. Secretário de Estado teve mesmo a desfaçatez de dizer que não há qualquer contradição entre o que o PS dizia em 2004 e o que diz hoje.
Importa lembrar novamente nesta Assembleia, para que não passe em claro, o que, em 2004, a bancada do Partido Socialista — não era a bancada do PCP, mas a do PS — dizia: «Como vai ser concretizado o efectivo reconhecimento do mérito dos trabalhadores da Administração Pública, com a imposição de quotas que inibem e impossibilitam…» — o PS dizia «impossibilitam», Sr. Secretário de Estado! — «… uma avaliação autêntica?».
Mais, o PS questionava: «Como acreditar que se pretende implementar um modelo de excelência na função pública, se essa excelência não pode ser superior a 25%?…».
Afirmava, ainda, o PS (e não o PCP): «Não aceitamos um sistema, como o que acaba de ser aprovado, que impõe quotas com o único objectivo de condicionar a promoção e a progressão nas carreiras dos trabalhadores».
Se isto não é uma contradição com aquilo que o PS defende hoje, então, como dizia a Deputada Heloísa Apolónia, «vou ali e já venho!» Na verdade, o sistema de quotas não permite uma verdadeira avaliação, porque impõe artificialmente um limite à avaliação e apenas visa condicionar a promoção e progressão na carreira. Só que «palavras levamnas o vento» e as palavras do PS na oposição são leves e bastante aerodinâmicas, pelo que já estão muito longe das propostas do PS enquanto governo.
Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Esta proposta é dificilmente aplicável às autarquias locais. O Governo não teve em conta as especificidades e a autonomia do poder local, pelo que não podemos deixar de registar apreensão quanto às necessárias adaptações que têm de ser feitas.
O artigo 26.º da presente proposta estabelece, no seu n.º 4, que duas ou mais menções de «Desempenho Insuficiente» podem fundamentar a pertinência da existência do serviço. Ora, se tivermos em conta que o diploma sobre o regime dos vínculos cria a figura do despedimento colectivo e o despedimento por extinção do posto de trabalho, facilmente se percebe como os dois diplomas se articulam: um deles propõe o encerramento de um serviço, o outro trata de despedir os trabalhadores.
Um outro aspecto que suscita dúvidas e ao qual o Sr. Secretário de Estado não respondeu tem a ver com o sistema de interligações necessárias entre os diferentes subsistemas. Isto é, na avaliação do trabalhador não são tidos suficientemente em conta outros factores que condicionam o desempenho. Os trabalhadores podem, assim, ser penalizados e avaliados negativamente quando, por exemplo, o que determina o seu mau desempenho é um mau dirigente do serviço, o facto de o serviço não ter os meios materiais e humanos adequados, ou os trabalhadores não terem tido a formação adequada.
Por fim, o sistema de avaliação proposto pelo Governo é demasiado complexo, é um labirinto inaplicável de procedimentos e é demasiado moroso.
As nove fases do processo de avaliação, a sua complexidade e o facto de ser anual deixam sérias dúvidas quanto à exequibilidade da avaliação.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Jorge Machado (PCP): — Sr. Presidente, Sr. Secretário de Estado, Sr.as e Srs. Deputados: Este sistema de avaliação do desempenho dos trabalhadores da Administração Pública, proposto pelo Governo, não surge, na nosso opinião, para, de uma forma construtiva, melhorar os serviços e a qualificação dos trabalhadores. O seu verdadeiro objectivo, inserido num conjunto de acções que visam a implementação da política neoliberal do Governo, é, através da avaliação, fundamentar o encerramento de serviços, impedir a progressão na carreira, fundamentar o envio dos trabalhadores para o quadro de supranumerários e facilitar os despedimentos.