26 | I Série - Número: 020 | 3 de Dezembro de 2007
Uma, aponta no sentido da adequação do quadro farmacêutico. Outra, aponta no sentido de não violentar as instituições do sector social da economia através da criação absolutamente artificial de sociedades comerciais. Finalmente, outra tem a ver com uma melhor precisão do limite à propriedade da farmácia.
Por elas, e sempre pela defesa dos superiores interesses dos doentes, nos bateremos em Comissão.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bernardino Soares.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: O decretolei que está em apreciação é uma compensação, embora insuficiente, pelo facto de esta importante matéria da propriedade das farmácias não ter sido debatida, com suficiente tempo e ponderação, na Assembleia da República.
O Governo decidiu optar por uma autorização legislativa e não por apresentar uma proposta de lei material, em resultado do que, depois, a Comissão de Saúde teve de realizar um seminário, bastante participado, sobre esta matéria, durante o qual ficou efectivamente denunciada a falta de participação e de profundidade em termos do trabalho que foi permitido à Assembleia da República.
A política do Governo para a área dos medicamentos é conhecida: transferência de custos para os utentes; abertura do mercado a grupos económicos privados muito interessados em questões, como, por exemplo, a da venda de medicamentos fora das farmácias, que, segundo dados do Governo, é hoje controlada, em 46%, por um mesmo grupo económico, o grupo SONAE; a questão de privatizar novas farmácias dentro dos hospitais, farmácias essas que podiam ser o desenvolvimento útil da farmácia pública hospitalar mas que, agora, são convoladas para um muito lucrativo negócio privado, a operar dentro dos próprios hospitais e com aproveitamento das sinergias dos mesmos.
É neste quadro que aparece este diploma de liberalização da propriedade das farmácias, em cuja votação o PSD se absteve e, à excepção do PCP, penso que nenhum outro partido votou contra. É importante dizer-se isto,…
O Sr. Manuel Pizarro (PS): — Tem toda a razão! Exactamente!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — … porque, após esse debate, houve muitas evoluções, mas, na verdade, quando foi dada esta autorização legislativa, só o PCP votou contra, o que, repito, é preciso que seja recordado agora.
É preciso dizer ainda que este debate tem uma mistificação.
É evidente que a existência de um tipo de negócio cujo proprietário só pode ser alguém que exerça uma profissão específica é uma singularidade jurídica. Não há nenhuma dúvida acerca disso.
Vozes do PCP: — Muito bem!
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Só que a legislação não pode ser feita ou alterada em função de as situações jurídicas serem ou não singulares, tem de se ver quais são as consequências das alterações.
Ora, a alteração desta legislação, ao possibilitar que não farmacêuticos sejam proprietários de farmácias, tem como consequência que a propriedade de farmácias e até a concentração dessa propriedade passe a ser detida por grandes grupos económicos e, designadamente, multinacionais produtoras de medicamentos. Esta possibilidade é o que mais desaconselha a alteração plasmada neste diploma, pois — e já sei que vão argumentar com isso —, mesmo estabelecendo o limite de quatro farmácias por proprietário ou sociedade proprietária, todos sabemos que, na prática, não vai ser eficaz.
Aliás, o Ministro da Saúde já disse que, antes da entrada em vigor desta legislação, quando apenas era possível ser-se proprietário de uma farmácia, havia e há pelo menos 400 farmácias em situação de propriedade irregular, assim violando, na prática, tal regra. Portanto, perguntamos como vai garantir que, agora, com esta nova legislação, não vai acontecer o mesmo, tal como com a anterior legislação.
É evidente que vai acontecer. É evidente que foi o que aconteceu nalguns dos países da Europa onde esta alteração foi feita e levou à concentração da propriedade das farmácias e, provavelmente, em muitos casos, à