41 | I Série - Número: 042 | 1 de Fevereiro de 2008
D. Carlos bem merece, pelos ataques imerecidos feitos à sua vida, em que quase tudo foi falseado e pela cilada em que recebeu a morte — o cognome de Sacrificado.» Teófilo de Braga disse: «D. Carlos pagou pelos erros da sua dinastia e porventura foi o menos culpado.» Era um homem simples que confessava os seus defeitos, procurando corrigi-los. Foi previdente, querendo emendar velhas fórmulas, patriota, desejando engrandecer o seu país, Rei consciente dos seus deveres, tal como o soldado ao qual confiaram um posto e não o abandona, expôs-se a tudo para a salvar a instituição e o trono dos filhos, pai que ambicionou legar exemplos de dignidade e a ideia de que um soberano ungido só perde a coroa quando perde a vida.
D. Carlos, morrendo da forma como a historia assim o ditou, transformado quase em lenda é, sem duvida, uma referência paradigmática da Monarquia portuguesa e a figura do Homem e do Patriota que os portugueses jamais esquecerão.
Com efeito, do Rei D. Carlos se pode afirmar que, além de representar o Homem Português na sua verdadeira dimensão, interiorizou bem as vivências transmitidas pelos seus antecessores e antepassados, que sempre tiveram subjacente o lema de Viriato «a pátria está na liberdade, a riqueza segura no valor de cada um».
Mataram o Rei! Mas não os desastres da Monarquia! Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Quando subiu ao trono, com apenas 26 anos de idade, D. Carlos confrontou-se com um País mergulhado num défice político preocupante, mercê de um sistema partidário viciado pela oscilação governativa entre dois partidos únicos.
Consciente dos perigos de um rotativismo «bicéfalo», movido mais pelo clientelismo do que pelo interesse nacional, D. Carlos determinou-se em promover uma verdadeira regeneração nacional, devolvendo ao País uma vida pública moralizada.
Pois bem! Foi pela moralização do sistema político, fundamental para a regeneração do tecido sociopolítico e socioeconómico, pelo reconhecimento da necessidade de encontrar partidos sólidos capazes de se apresentarem como alternativa política, pela luta contra o clientelismo e pela defesa do interesse de todos os portugueses que, 100 anos depois, nesta nobre Sala, recordamos o assassinato do Rei D. Carlos e do seu filho.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Os factos que o motivaram, hoje agudizam-se.
O abismo entre os ricos e os pobres é cada vez maior. É o próprio Presidente da República quem o reconhece, o denuncia e reclama, em nome da igualdade, da liberdade e da fraternidade.
A utilização vulgarizada dos meios públicos para fins e interesses privados, esquecendo o serviço público, relegando as carências socioculturais, os equipamentos e a gestão cuidada da coisa pública, traindo as legítimas expectativas dos cidadãos e afastando-se das verdadeiras razões que o levaram ao poder, são manchas indeléveis que, a não serem continuamente resolvidas, conduzirão ao descrédito esta mui respeitosa Assembleia, porventura a menos culpada, tornando-a alvo da mais cobiçada e torpe mentira.
Pugnamos pela credibilidade da nossa democracia; respeitamos a coisa pública, o mesmo é dizer, a res publica.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta insigne Assembleia recebe aqui, no seu seio, um pequeno partido, de inspiração monárquica, que a enriquece e enaltece.
A obra descentralizadora e renovadora de D. Carlos, nomeadamente no âmbito da criação da primeira autonomia dos Açores, em 1895, fez-nos sempre olhar para as pequenas regiões e defender a regionalização em toda a sua dimensão.
Entendemos não ser possível supervisionar os meios de produção sem que se assegurem os critérios de avaliação nos domínios da economia, das finanças e dos serviços, que não devem estar centralizados num Estado todo-poderoso, desresponsabilizando as autoridades locais e esquecendo a diversidade sociocultural de cada região, que, por si só, valorizaria a República.
No caso concreto da segurança, a criação de polícias regionais contribuiria de forma inequívoca para a sua crescente responsabilização e menor contaminação dos fenómenos criminógenos.
Conforme o ambicionado pela opinião pública, pelo exercício da cidadania e até pelo desejo de mudança que há 100 anos este Parlamento legitimou, reclamamos o diálogo plural e o respeito pelas diferenças ideológicas.