31 | I Série - Número: 083 | 15 de Maio de 2008
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A questão que se coloca, quando confrontamos o ensino privado com o ensino público, não é apenas a da empresarialização do sistema de ensino e a do consequente aumento de custos para os estudantes e famílias. Nem tampouco é apenas a da elitização do ensino, a da estratificação qualitativa dos estabelecimentos de ensino e a da exclusão das camadas mais empobrecidas.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — A questão que se coloca é, além dessas, a do pendor ideológico da escola.
A entrega da função de ensinar a interesses privados, empresariais, religiosos ou políticos, com financiamento do Estado, ou seja, de todos nós, compromete incontornavelmente a qualidade do ensino e a sua orientação.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O Estado deve assegurar uma escola pública gratuita e de qualidade para todos, em todos os graus de ensino, e deve ter perante o ensino privado um mero papel regulador da qualidade, no cumprimento da Constituição da República Portuguesa.
Aliás, o ensino privado deve apenas existir na medida em que possa servir de opção e nunca enquanto única escolha para milhares de jovens que não encontram vaga no ensino público.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — Isto já se passa no ensino superior e nas creches e jardins-de-infância, e a implementação de uma política como a que o CDS agora propõe alargaria essa situação a todo o ensino.
É uma velha teoria, esta, de velhos regimes, a de que o Estado deve estar limitado às suas funções políticas e jurídicas e de que tudo o resto, incluindo o ensino secundário, deve estar ao serviço da iniciativa privada.
O que o CDS se propõe fazer é assumir, com frontalidade, esta opção política de retirada do Estado e de desmantelamento do seu papel.
Ora, já o mesmo não se pode dizer do Governo, que pretende implementar uma política semelhante, mas de forma não anunciada.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O Governo do Partido Socialista legislou à margem desta Assembleia, à margem da Lei de Bases do Sistema Educativo e da própria Constituição, e assim traçou, por decreto, o fim da gestão democrática da escola pública, determinando a sua entrega aos interesses que se vão estabelecendo em torno da educação — e não são poucos, se tivermos em conta que a educação já movimenta, em termos financeiros, o dobro do sector automóvel — e acentuando a relação de poder que existe entre o Governo e o estabelecimento de ensino.
Podemos quase dizer que o CDS e o partido do Governo andam a buscar inspiração nas mesmas fontes, embora as materializem de formas um pouco diferenciadas.
O Sr. José Paulo Carvalho (CDS-PP): — Isso é ofensivo para nós!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — O Governo não anuncia o fim da escola pública, mas implementa um regime legal de estrangulamento da autonomia, de fim da democracia e de absoluta instrumentalização dos estabelecimentos de ensino,…
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!
O Sr. Miguel Tiago (PCP): — … enquanto gradualmente os coloca sob a «batuta» imperdoável do sacralizado «mercado de trabalho».