46 | I Série - Número: 100 | 28 de Junho de 2008
Ora, se tais princípios devem presidir a uma reforma desta natureza, analisando a proposta de lei em discussão tenho de confessar que nos assaltam algumas perplexidades, que decorrem de conteúdos às vezes pouco claros e de regulamentações que surgem já anunciadas para mais tarde na proposta de diploma.
Bom seria que, em matéria de protecção social dos funcionários públicos, e apesar da bondade dos princípios, o Governo não enredasse os trabalhadores/beneficiários e os serviços que irão processar as prestações sociais em inextricáveis medidas e em orientações, que apenas confundem e que deviam ser meridianamente cristalinas.
Em matéria de alterações da vida profissional dos funcionários públicos, este Governo já cometeu muitos erros: já se atolou em incontáveis contradições; já deu azo a múltiplas omissões; já anunciou verdadeiras reformas que só ele descortinou e ninguém mais.
Vozes do PSD: — Muito bem!
O Sr. Fernando Antunes (PSD): — Convém que, no caso vertente, no caso das novas regras de protecção social dos funcionários públicos, o Governo diga tudo, seja rigoroso, em nome da transparência que se exige de um governo sério e competente.
Aplausos do PSD.
O Sr. Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Mota Soares.
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Sr. Presidente, Srs. Ministros, Sr.as e Srs. Deputados: O Governo anunciou esta reforma da revisão do sistema de segurança social dos funcionários públicos de acordo com um princípio que anteriormente o Partido Socialista questionava, mas que agora parece aceitar. Trata-se do princípio da convergência de regimes entre o público e o privado.
E se quanto ao princípio o CDS nada tem a apontar, já quanto à sua concretização parece-nos que esta reforma está a ser feita de forma atabalhoada, descompassada e, mais grave do que isso, criando uma divergência de regimes que é, a todo o título, criticável.
Continuamos sem perceber como é que o Governo quer fazer uma convergência de regimes mas salvaguarda sistematicamente para o Estado uma posição de supremacia. Se isso foi muito evidente na proposta de lei anterior, aqui mantém-se absolutamente evidente.
O Governo quer que, no caso de um privado, e bem, a entidade empregadora, se não pagar, tenha uma responsabilidade efectiva, que pode até ser uma responsabilidade pessoal e criminal, mas não diz nada quanto à responsabilidade do Estado e, pior, remete para uma suposta regulamentação — mais um tropeção numa reforma que perdeu o seu sentido, porque deixou de ser global e coerente.
O Sr. Paulo Portas (CDS-PP): — Muito bem!
O Sr. Pedro Mota Soares (CDS-PP): — Convém que lembremos, Sr. Ministro, que estamos a falar de um regime que tem um feixe de obrigações de parte a parte. Há uma natureza sinalagmática nos regimes de protecção social. O Estado tem obrigações, mas tem também deveres. E também os titulares deste regime têm obrigações, nomeadamente de pagamento das suas contribuições, mas têm, acima de tudo, direitos.
E o que se passa neste caso é que o Governo, sistematicamente, a meio do jogo, muda as regras e não faz uma alteração que tenha «cabeça, tronco e membros». Pior: o que o Governo hoje propõe aos funcionários públicos é um regime de «leve agora e paga depois» e todos sabemos que nestes regimes, quando se vai pagar, paga-se sempre com juros e em piores condições.
Há aqui, assim, um conjunto de erros. O Governo optou por fazer esta reforma de forma desgarrada, entrando parte da reforma em vigor em 2006 e outra agora, supostamente em 2009, sem existir uma lógica e uma coerência.
Por isso mesmo é essencial que haja respostas a perguntas, como a que há pouco coloquei e que ainda não foi respondida: qual é a responsabilidade para o Estado no caso de não pagamento das contribuições?