35 | I Série - Número: 107 | 17 de Julho de 2008
Trata-se de objectivos ambiciosos, para depois se vir dizer, com alguma candura, que é apenas um chip de curto alcance, meramente local, que só permite o simples reconhecimento dos veículos. Não é verdade, Sr.as e Srs. Deputados! Das duas uma: ou o chip — o tal dispositivo electrónico da matrícula — não serve para os objectivos enunciados, pois o Governo não prova a sua real necessidade e tudo o que anuncia é possível hoje fazer-se sem o chip, ou, então, o Governo está a tentar fazer «passar gato por lebre», o que é extremamente grave em matéria de direitos, liberdades e garantias dos cidadãos.
Sr.as e Srs. Deputados, continuamos a não saber quais são as características dos equipamentos, o que, Sr.
Secretário de Estado, foi dito pela Comissão Nacional de Protecção de Dados e que o Governo não incluiu no diploma! Esse foi o ponto central referido pela Comissão Nacional de Protecção de Dados e que está por esclarecer. Queremos saber quais são as características técnicas dos equipamentos e os senhores remetem para portaria posterior — vai tudo para portaria! Outra questão fundamental: segundo a Comissão Nacional de Protecção de Dados, Sr. Secretário de Estado, não sabemos que entidade é que vai tutelar as bases de dados que — veja-se! — vão ter conexão com bases de dados públicas e privadas. Não estou a inventar. Está escrito na proposta de lei.
Sr. Secretário de Estado, este diploma apresentado pelo Governo ou é uma grande fraude ou estão a querer enganar os portugueses e as portuguesas com mais uma proposta que se inclui na tal «política securitária» que o PS diz que não quer, mas que, na prática, faz todos os dias!
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Manuel Alegre): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Bruno Dias.
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo: Começamos por sublinhar que, para o PCP, a segurança rodoviária e a questão da segurança em geral não é nem nunca foi um problema menor ou sem importância e que devem ser analisadas seriamente as medidas que, no escrupuloso respeito pelos direitos, liberdades e garantias democráticas, contribuam, de forma efectiva, para a fiscalização, a presença dissuasora, a prevenção da sinistralidade.
Mas não é isso que temos com esta proposta do Governo. A verdade é que estamos perante um diploma que nos merece as maiores reservas e que coloca perspectivas profundamente preocupantes de controlo e vigilância sobre os cidadãos.
Nesse sentido, é verdadeiramente lamentável que um assunto com as implicações e o melindre que aqui temos seja tratado desta maneira, com uma autorização legislativa que remete este processo para os gabinetes do Governo. E é, por outro lado, inaceitável que, ainda por cima num assunto destes, o Governo diga que a Comissão Nacional de Protecção de Dados foi ouvida acerca desta proposta e, depois, nem sequer apresente o parecer que lhe dá fundamento, violando o n.º 2 do artigo 188.º do Regimento da Assembleia da República.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Exactamente!
O Sr. Bruno Dias (PCP): — Tinha obrigação de o apresentar à Assembleia e a todos os Deputados. Não foi isso que fez! O que o Governo vem propor é que todos os veículos — todos! — automóveis, seus reboques, motociclos, ciclomotores, triciclos, quadriciclos, máquinas industriais e máquinas rebocáveis, tenham obrigatoriamente um dispositivo electrónico que permita a sua identificação, a fiscalização e o pagamento de portagens.
E o Governo bem pode jurar a pés juntos que «a salvaguarda do direito à privacidade não é posta em causa com este sistema»; até pode escrever na lei que «não pode, em caso algum, essa identificação permitir a localização geral e permanente dos veículos a partir da leitura do dispositivo», porque aqui a pergunta é, muito simplesmente: quem nos garante? Com que garantias? Vai ou não haver um registo centralizado, uma base de dados com esta informação (que, ainda por cima, será cruzada, de acordo com o artigo 2.º, «com outras bases de dados de entidades públicas e privadas»)? Rejeitando-se apenas a «localização geral e permanente», pode ou não haver diligências «específicas e momentâneas» de localização?