I SÉRIE — NÚMERO 116
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A Sr.ª Presidente: — Srs. Deputados, está aberta a sessão.
Eram 15 horas e 10 minutos.
Podem ser abertas as galerias.
Dado que hoje não há expediente, vamos passar diretamente à ordem do dia, que consiste na discussão
do projeto de resolução n.º 346/XII (1.ª) — Garante o direito humano à água e ao saneamento (Os Verdes).
Os Srs. Deputados estão já informados de que, eventualmente, proceder-se-á à respetiva votação no final
do debate.
Para proferir a primeira intervenção, tem a palavra a Sr.ª Deputada Heloísa Apolónia.
A Sr.ª Heloísa Apolónia (Os Verdes): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: O País vive hoje sob a
intenção e a vontade expressa do Governo de privatização da água. É essa ameaça que leva Os Verdes a
apresentar a presente iniciativa legislativa, que garante o direito humano à água e ao saneamento.
Peço a atenção das Sr.as
e dos Srs. Deputados para a expressão «garante o direito». É a recusa de
entender a água como uma mercadoria; é a constatação de que a água é um recurso natural escasso,
essencial à vida, imprescindível, portanto, e não passível de ser recusado a alguém. A água é um direito.
Deve, por isso, ser gerida para garantir a sua preservação, o seu acesso e a sua eficácia de distribuição.
Privatizar a água significa torná-la uma mercadoria vendável, a preço de um mercado criado, e em função
de lucros que as empresas querem obter, ainda por cima com uma tendência de monopólios regionais ou
nacionais que implicam a inexistência de alternativas e de opções. Por isso, quem defende que a água é um
direito, defende, necessariamente, a gestão pública da água. É justamente o que Os Verdes defendem neste
projeto hoje apresentado à Assembleia da República e que consideramos imprescindível para o País e
inevitável para o seu desenvolvimento.
Privatizar a água é demasiado absurdo, conhecendo-se, ainda por cima, exemplos ao nível internacional
que se demonstraram desastrosos ao longo dos anos e que levaram, inclusivamente, em muitos casos, à
renacionalização da água, como aconteceu em regiões da Argentina, da África do Sul, da Alemanha, da
Bolívia, dos Estados Unidos, de França, entre outras.
Mas, é de tal maneira absurdo e perigoso privatizar a água que o próprio Governo de direita se recusa a
falar de privatização, de modo a aligeirar a sua intenção perante a opinião pública. Diz, então, a Sr.ª Ministra
do Ambiente que não vai vender a empresa Águas de Portugal, vai antes concessionar a gestão da água a
empresas privadas.
Segundo o que já nos foi dado conhecer, a intenção é fundir os sistemas existentes em alta em quatro
sistemas, portanto a uma escala enorme, dotá-los de uma verticalização, ou seja, incluindo-lhes a baixa (isto
é, o sistema que faz chegar a água às pessoas), retirando, assim, as autarquias dessa competência, entregar
a gestão desses sistemas, na íntegra, ao setor privado, através de subconcessões, e aplicar um tarifário
uniforme a todo o País, tomando como bitola, obviamente, os preços mais elevados que hoje se praticam. Não
se perceberam ainda muito bem todos os contornos desta proposta, designadamente se estas empresas
assumirão, por exemplo, o risco associado ao investimento.
Conclusão: não chamar a isto privatização é procurar maquilhar o que está em causa. Entregar a gestão da
água a privados é privatizar a água, porque gerir a água é dominar a forma de fazer chegar este recurso às
pessoas, é dominar os sistemas de abastecimento e saneamento, é ter o poder de decidir quem, como, onde e
quando tem acesso à água, logo, é deter o poder sobre o próprio recurso. Pode-se jogar muito com as
palavras, mas não restam dúvidas de que o Governo PSD/CDS quer privatizar a água em Portugal. É mau? É,
é muito mau!
A preparação do caminho para a privatização da água, Sr.as
e Srs. Deputados, em Portugal, já vem de
longa data, designadamente dos anos 90, com a criação legal dos sistemas multimunicipais.
O Governo anterior, do PS, trilhou mais caminho de forma determinada, arrogante e inqualificável,…
Protestos do Deputado do PS Carlos Zorrinho.
É verdade, Srs. Deputados.