19 DE OUTUBRO DE 2012
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Sr. Ministro, um outro assunto: quando este Governo fala em cortar na despesa é exatamente o mesmo
que dizer cortar nas políticas sociais, porque, para este Governo, as gorduras do Estado estão nos doentes e
nos alunos.
Também é do conhecimento público que o processo de privatização de diversas empresas, inclusivamente
as empresas tuteladas pela Economia, está a ser acompanhado, na sua fase preparatória, por diversas
entidades, onde se incluem, entre outros, escritórios de advogados.
Ó Sr. Ministro, isto é absolutamente necessário? O Estado não tem especialistas, nos vários serviços, que
façam esse trabalho? Concretamente, qual é o objeto desse trabalho, dessas consultadorias? Servem, afinal,
para quê? E, já agora, Sr. Ministro, qual o montante global envolvido nessas consultadorias? Que custos
representam para o Estado? Quanto?
Por fim, a concessão da ANA.
A concessão da ANA é, assim, uma espécie de truque que o Governo inventou, de forma, aliás, muito
singular — reconheça-se aqui a imaginação do Governo. O Governo quer concessionar à ANA um serviço
público que a ANA já faz. É espantoso! E esta opção vai exigir um endividamento da ANA, junto da banca,
porque a ANA vai pagar, antecipadamente, ao Estado a concessão de um serviço publico que já faz.
De facto, parece confuso, parece um golpe de malabarismo. Mas, «trocado por miúdos» e em termos
práticos, o que é que se passa? É que o Governo pretende usar a ANA para obter empréstimo, para se
autofinanciar. O Estado autofinancia-se, através da ANA, para ir buscar dinheiro a qualquer preço. E qual é o
preço? Estamos mesmo a ver: nós vamos ter uma empresa pública com um passivo, a que acrescem os juros
bancários que decorrem desta operação, com o risco da eventual privatização ocorrer «ao preço da chuva».
Sr. Ministro, para além da banca, quem é que fica a ganhar com este negócio? Era bom que o Sr. Ministro
não fizesse como há pouco, que não respondeu às questões que lhe coloquei, e agora se pronunciasse sobre
esta matéria, porque os portugueses têm o direito de conhecer os exatos termos desta operação e de saber,
sobretudo saber, quem ganha com o negócio.
A Sr.ª Presidente: — Para pedir esclarecimentos, tem a palavra a Sr.ª Deputada Lurdes Ribeiro.
A Sr.ª Lurdes Ribeiro (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Srs. Membros do Governo, este Governo
está, mais uma vez, a dirigir um ataque cerrado aos trabalhadores da Administração Pública e,
simultaneamente, aos serviços públicos.
O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Muito bem!
A Sr.ª Lurdes Ribeiro (PCP): — Por um lado, dizem que querem uma Administração Pública de qualidade,
eficiente, eficaz e moderna. Como é possível querer esta Administração Pública (que todos nós queremos) e,
ao mesmo tempo, retirar direitos aos trabalhadores da Administração Pública, no que concerne ao direito à
remuneração pelo trabalho extraordinário, à introdução do banco de horas, à mobilidade e a n coisas sem
conta? Até nos primeiros três dias em que fica doente, o trabalhador não vai ter direito a nenhum valor, o que
é grave, porque é quando estão doentes que os trabalhadores mais precisam de ajuda.
Dizem-nos que, realmente, isto é para ficar mais parecido com o regime dos trabalhadores do privado, mas
é mau! De facto, todos temos de admitir que, quando as pessoas estão doentes, precisam mais de ajuda do
que nunca, portanto não se deveria fazer isto, nem aos trabalhadores do privado nem aos trabalhadores da
Administração Pública!
Vozes do PCP: — Exatamente!
A Sr.ª Lurdes Ribeiro (PCP): — Esta situação não dá sinal de que queiramos, realmente, que os
trabalhadores se sintam mobilizados e incentivados para fazer o que todos nós queremos, que é ter uma
Administração Pública de qualidade e, consequentemente, um bom serviço público.
Recordo que, ainda antes de ser Ministro, o senhor escreveu um livro e, na pág. 511 desse mesmo livro,
dizia que «uma verdadeira reforma da Administração Pública terá de melhorar o serviço público, não piorá-lo.
Uma verdadeira reforma do Estado terá de incentivar a autoestima dos funcionários públicos».