I SÉRIE — NÚMERO 52
24
Propomos o quê, entre outros aspetos? Que um Deputado não pode acumular funções numa empresa
onde o Estado tenha participação ou capitais minoritários; não pode, por si ou através de sociedade
profissional de advogados, prestar serviços ao Estado ou a pessoas coletivas públicas ou empresas
concorrentes a concursos públicos; não pode, no plano das incompatibilidades, ser membro de comissão ou
entidade de nomeação governamental, qualquer que seja esta comissão ou entidade, nem membro do
conselho de gestão de qualquer empresa com participação do Estado ou de empresas concessionárias do
Estado.
Estas são algumas das propostas contidas nestas duas iniciativas legislativas que tocam os dois aspetos
estruturantes quer no plano das incompatibilidades quer no plano dos impedimentos.
Propomos ainda, relativamente ao quadro legal dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, a
extensão do período de nojo, na transição de funções, para seis anos — consideramos que esta medida é
determinante — e que gestores e administradores executivos de empresas públicas, sociedades anónimas de
capitais públicos sejam considerados titulares de altos cargos públicos e abrangidos por este mesmo regime
jurídico.
O apelo que fazemos é este e é determinante que esta Assembleia, hoje, mostre a sua disponibilidade e a
sua responsabilidade política perante um quadro de suspeitas, que se vai agravando crescentemente, muito
cavalgado pelo discurso populista, infelizmente fundamentado em algumas situações concretas. Nós
queremos mesmo é acabar com as suspeitas e para isso oferecemos estas soluções.
Aplausos do BE.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Para apresentar a iniciativa do PCP, tem a palavra o Sr. Deputado
João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A promiscuidade entre o poder
político e os interesses económicos é um problema da democracia. É um problema de tanta gravidade que a
própria Constituição prevê, no artigo 80.º, que o poder económico se deve subordinar ao poder político.
Ora, é certo que este problema assume maior gravidade quando tratamos de funções políticas executivas,
nomeadamente ao nível governamental, mas não é menos verdade que este é um problema que se manifesta
também com alguma gravidade no que se prende com as condições concretas em que é exercido o mandato
na Assembleia da República pelos Deputados aqui eleitos pelo povo.
O projeto de lei que o PCP agora traz à discussão tem precisamente como objetivo impedir essa
promiscuidade entre o poder político e interesses económicos, sobretudo na perspetiva da subordinação do
poder político ao poder económico.
Sabemos bem que a lei não é suficiente, há sempre uma dimensão de exercício pessoal do mandato e de
disponibilidade pessoal para cumprir o exercício desse mandato em condições de liberdade e independência,
um elemento relevante para que assim aconteça, mas entendemos que a Assembleia da República não pode
ficar desligada da necessidade de aperfeiçoar a lei e levar mais longe a clarificação e a exigência dos
requisitos e das limitações que são colocados ao exercício do mandato de Deputado, particularmente no que
diz respeito ao aperfeiçoamento do Estatuto dos Deputados.
Sr.as
e Srs. Deputados, o que o PCP pretende é impedir que entre pela janela aquilo que se procurou
impedir que entrasse pela porta. Temos o Estatuto dos Deputados que, na sua essência, data do início da
década de 90 e que muitas vezes, confrontado com a dinâmica da vida e a alteração da vida económica e
social, se tem manifestado verdadeiramente insuficiente relativamente às limitações e à concretização das
limitações que esse Estatuto prevê.
Um desses exemplos, que se tornou mais claro a propósito de uma situação concreta ocorrida há uns
anos, tem que ver com limitações que, do ponto de vista individual, impedem os Deputados do exercício de
algum tipo de atividades, nomeadamente de natureza económica, mas que, quando essas atividades são
exercidas por interposta pessoa, por intermédio de sociedade, nomeadamente por intermédio de sociedades
de advogados, afinal de contas, as regras do Estatuto dos Deputados já não são suficientes.
O mesmo acontece, por exemplo, em relação a determinadas limitações que, do ponto de vista individual,
são eficazes, impedindo os Deputados de participarem, terem intervenção ou atividade económica em