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I SÉRIE — NÚMERO 102

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Deixe-me dizer que há uma proposta que o Sr. Deputado fez, a qual não conta, no entanto, com a minha

concordância, que é, no fundo, a de transformar o Estado numa espécie de proprietário de dívidas que as

empresas possam ter perante o Estado.

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — Não é isso!

O Sr. Primeiro-Ministro: — É que, do nosso ponto de vista, isso poderia conduzir a uma espécie de

meganacionalização da economia portuguesa, que não consideramos que seja vantajosa.

Diz o Sr. Deputado: «Bom, temos um problema: não conseguimos que as empresas aumentem o seu

investimento, que expandam a sua atividade se estivermos em contração da procura interna.» Sr. Deputado,

respondo-lhe apenas com dois exemplos que, tenho a certeza, não merecerão a sua discordância.

O primeiro é o de que as empresas não vivem só para o mercado interno; vivem para o mercado interno e

para o mercado externo, e é importante que as empresas possam, progressivamente, orientar também a sua

atividade para a área competitiva e, portanto, para a área externa.

O segundo é o seguinte: o Sr. Deputado sabe, com certeza, que a economia tem tradicionalmente o lado

da oferta e o lado da procura. Tenho notado que muitos Deputados e muitos políticos, sobretudo dentro do

espectro da oposição, entendem que a economia se resume ao lado da procura. Realmente tem sido assim

desde há muitos anos a esta parte, as próprias políticas públicas desenvolvem-se como se só houvesse o lado

da procura.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Quem? Não conheço nenhum!

O Sr. Carlos Zorrinho (PS): — A oferta é cada vez menor!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas não há, Sr. Deputado! Há os dois lados: o da procura e o da oferta. Do

lado da procura, as pessoas, dentro das opções que podem tomar entre consumir ou poupar, fazem uma

escolha e muitas estão, em tempos de crise económica, inibidas nessa escolha. Porquê? Por quebra de

rendimento e, portanto, não podem escolher contrair a sua procura aumentando a sua poupança

simplesmente porque não têm rendimentos para esse efeito.

O Sr. Bernardino Soares (PCP): — Ora bem! Não pagam os subsídios!

O Sr. Primeiro-Ministro: — Mas há muitas outras que têm rendimentos para esse efeito e também fazem

a sua escolha.

O Governo tem dito que algum do efeito recessivo que se tem vindo a sentir na economia não está na

decorrência proporcionada das medidas restritivas sobre o rendimento, o que significa, portanto, que existem,

do nosso ponto de vista, agentes económicos que, por razão de expetativas formuladas, contraem a sua

procura aumentando a poupança. Esta perceção do Governo é consistente com os resultados que vamos

obtendo da evolução da poupança, seja da poupança agregada em termos económicos seja da que resulta do

rendimento disponível das famílias, e ambas aumentaram quase dois pontos percentuais do PIB nestes dois

anos. Isto significa que, à medida que a poupança aumenta, maior é a probabilidade de uma parte dessa

poupança vir a ser canalizada para o investimento ou para o consumo de outras famílias.

Protestos do Deputado do PCP Honório Novo.

Portanto, Sr. Deputado, não é assim, não é com uma visão maniqueísta sobre o funcionamento da procura

interna que ultrapassaremos o nosso problema estrutural. E digo «estrutural», porque há um contraexemplo,

que já dei várias vezes nesta Câmara, mas que o Sr. Deputado insiste em ignorar quando formula estas

questões: é que Portugal teve uma procura interna possante durante vários anos e isso não produziu uma

diminuição do desemprego; antes pelo contrário, aumentou o nível estrutural de desemprego e aumentou

também o nível de dívida nacional, o que significa, Sr. Deputado, que nem sempre ter uma pujante procura

interna se traduz numa perspetiva de crescimento sustentável.