I SÉRIE — NÚMERO 19
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Estamos a falar da violação de um princípio fundamental num Estado de direito democrático; não estamos
a falar de um problema da nossa Constituição! Estamos a falar de um princípio basilar: a confiança no Estado,
a confiança do contrato estabelecido pelos cidadãos com o Estado, que é algo inalienável e inviolável.
Mas estamos a falar aqui também de uma outra questão. Já sei que, a seguir, virão falar-me da troica, do
Memorando, do lobo mau, do Capuchinho Vermelho e até da bruxa má,…
Protestos do PSD e do CDS-PP.
… só que os vossos argumentos não colhem e os portugueses já perceberam que o problema é mais
fundo, que é um problema político.
Até nos vieram falar de diálogo e de consenso… — e é disso que estamos aqui também a tratar! —,
quando apresentamos aqui uma proposta fundamental, a da prorrogação do subsídio de desemprego, porque
já temos metade dos desempregados sem qualquer tipo de apoio, esta proposta é recusada pelo Governo e
pela maioria parlamentar que o suporta. Então, que diálogo há? Que conversa?
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente: — Muito obrigada, Sr.ª Deputada Isabel Santos.
Tem agora a palavra o Sr. Deputado António Filipe, do PCP.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A redução
remuneratória, a cinicamente chamada «contribuição extraordinária de solidariedade» imposta aos reformados
e os cortes nas pensões de sobrevivência são das medidas mais emblemáticas desta proposta do Orçamento
do Estado para 2014.
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — É verdade!
O Sr. António Filipe (PCP): — O Governo propôs que todos os funcionários públicos que ganhem por mês
mais de 600 € ilíquidos sofressem cortes salariais. Vem a maioria e diz: «Não, 600 € ilíquidos é um exagero!
Mas se ganharem 675 € brutos já são ricos e já podem sofrer cortes salariais!»…
Cortar o salário a quem, ao fim de um mês inteiro de trabalho, não chega a levar para casa 600 €, Srs.
Deputados, não é só inconstitucional, não é só imoral, não é só injusto, é verdadeiramente desumano!
A Sr.ª Rita Rato (PCP): — Exatamente!
O Sr. António Filipe (PCP): — É disso que estamos a falar, de uma total falta de respeito pela dignidade
da pessoa humana!
Pedimos a avocação destas disposições a Plenário, propondo a sua eliminação, porque entendemos que
quem votar estas medidas no Orçamento do Estado para 2014 tem de assumir aqui, em Plenário, perante os
portugueses e perante o País, a responsabilidade por aquilo que aqui está a votar.
A responsabilidade pelos cortes dos salários e pelos cortes nas pensões é do Governo que os propôs e é
dos Deputados que os vão votar. A responsabilidade por este confisco não pode ser atribuída a outrem. Não
venham dizer que a culpa é da Sr.ª Merkel, que a culpa é da troica, que a culpa é das agências de rating, que
a culpa é dos mercados, que a culpa é do estado do tempo…! Não, a responsabilidade por estes cortes é
deste Governo — do Governo de Passos Coelho e de Paulo Portas — e dos Deputados do PSD e do CDS-PP
que aceitarem impor estes cortes salariais.
E, Srs. Deputados, deixem-se de falsidades: estas não são medidas transitórias, são medidas definitivas
enquanto este Governo estiver em funções. A única forma de impor a transitoriedade destas medidas é demitir
este Governo e revogar as medidas que agora que impor.
Estes cortes são uma violação grosseira de princípios fundamentais do Estado de direito democrático, não
são proporcionais, são restrições inaceitáveis de direitos fundamentais e violam o mais elementar princípio de
confiança ao mexerem em pensões que já foram atribuídas e que já estavam a ser pagas.