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8 DE MARÇO DE 2014

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Todos bem sabemos como, apesar do compromisso do CDS, do nosso compromisso, do compromisso

desta Assembleia, do compromisso do Governo nesta Legislatura, a violência contra a mulher é uma realidade

que subsiste. Como também bem sabemos, em causa está não apenas uma cultura de tolerância para com a

violência e para com a desigualdade, mas também a legitimação e reprodução de uma estrutura social que,

sistemática e invisivelmente, continua a subordinar e a inferiorizar as mulheres, assim violentadas direta e

indiretamente.

Discriminação, impunidade e complacência, tolerada através da indiferença, do desconhecimento, da

ignorância e do medo.

O estudo da Agência para os Direitos Fundamentais, já aqui citado e divulgado no início desta semana,

mesmo que animador para Portugal particularmente no que se refere aos dados da perceção, o que significa

que as campanhas, de alguma forma, conseguem produzir e dar os seus frutos nesta matéria, a verdade é que

ratifica este diagnóstico.

Muito foi feito, muito está a ser feito, mas claramente muito há ainda para fazer. Assim, foi neste contexto

que Portugal se tornou no primeiro país da União Europeia a ratificar a Convenção de Istambul, sendo

exatamente neste contexto que o poder político e a sociedade civil têm promovido importantes debates e

reflexões sobre o que é que falta, então, fazer.

Olhando em concreto para a iniciativa em debate, impõe-se começar por dizer o seguinte: na minha

opinião, não entendo que decorre diretamente da Convenção de Istambul a obrigatoriedade concreta de

alteração dos tipos legais do crime em causa. Entendo, sim — e aqui reside o mérito da mesma —, nesta

questão em particular, concentrar-se na obrigatoriedade de analisar e de, eventualmente, repensar o modelo

vigente, tendo em vista um reforço da eficácia e consequentemente da proteção nestas matérias.

Dito isto, a proposta apresentada, e que vai para além da violência contra a mulher, suscita-nos muitas

dúvidas. Concentrando-me nas duas alterações mais relevantes, ou seja, do consentimento versus a violência

e, naturalmente, da natureza do crime, começo por dizer que não estamos de acordo com a afirmação de que

estes tipos legais de crime se bastam com a mera previsão do não consentimento. Julgamos, mesmo, que

este propósito poderá criar mais dificuldades na prova do crime.

Segundo o Bloco de Esquerda, a existência de violência ou ameaça grave não devem ser meios típicos de

constrangimento nas circunstâncias agravantes da pena, entendendo que a exigência do requisito da violência

descaracteriza o crime de violação que, ao ser um ato sexual não consentido, é, em si mesmo, um ato de

violência. Compreendemos, mas, como referi, temos dúvidas. A ausência de delimitação de um conceito de

violência, que sempre esteve presente no tipo, remeteu a jurisprudência o respetivo preenchimento, de facto,

nem sempre pacífico e muitas vezes gerador de jurisprudência contraditória.

Deste ponto de vista, aquilo que é proposto pelo Bloco de Esquerda poderá melhorar, mas apenas

teoricamente. Isto porque, na prática, a dificuldade principal continuará a ser a prova do crime e, já aqui foi

dito, do próprio preenchimento do conceito de consentimento.

Quanto à alteração da natureza do crime, semipúblico a público, depois de uma reflexão séria e não sendo

por princípio absolutamente contrária a esta transformação, a verdade é que, tendo por objeto de reflexão as

vítimas, seja no que se refere ao bem jurídico em causa, seja no que se refere ao atual enquadramento e

proteção do modelo processual penal vigente, há razões para duvidar desta bondade, salientando para o

efeito o argumento da revitimização, como, aliás, aqui foi muito bem exposto pelo Partido Socialista.

Em suma, reconhecendo, de facto, que são mais as dúvidas do que as certezas, na nossa ponderação,

vigorará o princípio da prudência, querendo, todavia, deixar bem claro que, olhando para o Código Penal, para

a jurisprudência e, naturalmente, para a doutrina há, sem dúvida, margem para melhorar.

Aplausos do CDS-PP, do PSD e do PS.

O Sr. Presidente (Guilherme Silva): — Para uma segunda intervenção, que terá de ser muito sintética, tem

a palavra a Sr.ª Deputada Cecília Honório.

A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Sr. Presidente, Sr.as

Deputadas Carla Rodrigues, Isabel Moreira, Rita Rato

e Teresa Anjinho, começo por agradecer os vossos contributos na reflexão, que reconhecem necessária,