I SÉRIE — NÚMERO 84
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com negligência grosseira ou dolo. O decisor discricionário, sem escrutínio possível, depara-se com duas
classificações à escolha com um elemento comum, o dolo. O princípio da legalidade trava e travará,
certamente, este lapso.
A transferência compulsiva como uma pena acessória das principais, como a suspensão, viola o artigo 30.º,
n.º 4 da Constituição. Os efeitos das penas traduzem-se materialmente numa verdadeira pena, sujeita aos
princípios conhecidos, premissa que se aplica em sede de ilícito disciplinar.
O recurso hierárquico necessário previsto no artigo 120.º da proposta de lei em discussão é um caso, a
nosso ver, de inconstitucionalidade superveniente. Com a revisão constitucional de 1989, o artigo 286.º deixou
de fazer referência à necessidade de o recurso contencioso ser interposto contra atos definitivos e executórios.
E acabo como comecei: não se pode ser institucionalista na disciplina e ferir de morte os pressupostos do
cumprimento da missão da GNR, ainda que com a pátria na lapela.
Aplausos do PS.
Entretanto, reassumiu a presidência a Presidente, Maria da Assunção Esteves.
A Sr.ª Presidente: — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr.ª Presidente, Sr. Ministro, Srs. Secretários de Estado, Srs. Deputados:
Como que de propósito, estamos a discutir a proposta de lei, do Governo, de alteração ao regulamento de
disciplina da GNR quando há poucos dias se soube do início do cumprimento por parte do Presidente da
Associação dos Profissionais da Guarda (APG/GNR), de uma sanção de 25 dias de suspensão. Foi uma
«sanção disciplinar» aplicada por delito de opinião, enquanto presidente da maior associação socioprofissional
da GNR.
A questão que coloco, Sr. Ministro, é a de saber se 40 anos depois do 25 de Abril é admissível uma
instrumentalização desta gravidade de um regulamento disciplinar de uma força de segurança.
Aplausos do PCP.
A Sr.ª Cecília Honório (BE): — Muito bem!
O Sr. António Filipe (PCP): — Qual foi a acusação que impendeu sobre o Presidente da APG — aliás,
qualificado como tal na notificação que recebeu, ou seja, o arguido, Presidente da Associação dos
Profissionais da Guarda? Foi a de ter prestado declarações à SIC dizendo que tinha havido indicações para
poupar gasóleo, mas que se tratava de situações pontuais.
Qual é a outra acusação? Num artigo do Correio da Manhã com o título Defender o futuro!, foi tecida uma
opinião sobre a natureza da GNR do seguinte teor: «A GNR é a única força de segurança da Europa cuja
estrutura de topo pertence às Forças Armadas, um modelo que foi corrigido noutros países por ser
manifestamente desadequado, sendo que, no caso da GNR, é impeditivo que oficiais oriundos da Instituição
progridam na carreira e que tenham possibilidade de a dirigir.» Isto é objetivo!
Como é possível que pelo facto de se terem feito afirmações desta natureza alguém tenha sido punido?
Falamos de um dirigente máximo de uma associação que foi punido com 25 dias de suspensão de funções
com perda de vencimento, configurando uma infração disciplinar grave. Sr. Ministro, não é possível!
Esta atitude, por parte do comando da GNR e do MAI (Ministério da Administração Interna), que tem a
tutela da GNR, representa uma gravíssima instrumentalização do regulamento disciplinar da GNR com o
objetivo de perseguir e de intimidar os dirigentes associativos da GNR.
O cabo de cavalaria César Augusto de Almeida Nogueira, Presidente da APG, está classificado na 1.ª
classe de comportamento da GNR, nos termos do regulamento disciplinar em vigor. Nada lhe é assacado
relativamente à sua competência profissional, ao seu relacionamento com os cidadãos, à sua postura
enquanto profissional da GNR. A única acusação que lhe é feita é que é dirigente associativo e que, nessa
qualidade, presta as declarações que são devidas a quem representa os seus associados e que tem o dever
estatutário de defender os seus associados e de colocar as questões que dizem respeito à GNR.