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I SÉRIE — NÚMERO 105

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Tudo depende obviamente do desenvolvimento concreto da regulamentação, que importaria melhorar de

forma muito substancial ainda neste quadro prospetivo.

Acresce que muitas das cautelas e limitações que sobraram nas propostas do novo regime — e que

traduzem preocupações e propósitos muito positivos, que, aí, inteiramente acompanho — são, todavia, de

sustentabilidade muito duvidosa.

Com efeito, conhecidos que são os tratados e a jurisprudência dos tribunais europeus, o equilíbrio crítico

desta matéria face ao Direito Comunitário conduzirá facilmente ao seu derrube, ponto por ponto, a partir do

momento em que o Estado português tenha, pelo novo regime, abandonado aquela impecável e coerente

posição de princípio em matéria de restrições ditadas por fundamentos de ordem pública e de interesse geral.

O mesmo se diga quanto à aparente desigualdade nos tratamentos tributários, que poderá vir a forçar

evoluções sempre desfavoráveis para o interesse público e as receitas do Estado.

Creio também que esta autorização legislativa nunca deveria sair aprovada da Assembleia da República

antes de, ao menos, ter sido dada resposta cabal, ponto por ponto, às mais sérias preocupações manifestadas

nos pareceres que nos foram recentemente enviados, nomeadamente pela Santa Casa da Misericórdia de

Lisboa e pelo Comité Olímpico de Portugal, pareceres esses que deveriam ser esmiuçados e detidamente

aprofundados, em lugar de apenas lidos e arquivados. Este tratamento mais cuidado da matéria não pôde

acontecer no hiperacelerado processo legislativo com que fomos surpreendidos de supetão e que é

completamente inadequado a uma proposta reforma de tamanha envergadura e com impactos potenciais tão

significativos.

Preocupa-me, em especial, o dano que, numa imaginável derrapagem de declínio ano após ano, possa vir

a provocar-se à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e à obra social que conduz, bem como a tantos outros

programas sociais que, em todo o País, no âmbito de diferentes ministérios, são atualmente financiados pelas

receitas proporcionadas pelo exclusivo dos jogos que aquela tem titulado e gerido no interesse geral do País.

Preocupa-me também que possa desvalorizar-se nalgum momento o perigo que o jogo on-line sempre

representa em matéria de adição e de criminalidade económica e financeira (ou outra associada), e, nessa

sequência, que o regime concreto a estabelecer venha a afastar-se um milímetro que seja daqueles modelos

mais rigorosos, restritivos e controlados que alguns países europeus adotaram, ao regulá-lo.

Preocupa-me ainda o regime de publicidade e o da idoneidade dos operadores, não podendo transigir-se

com qualquer tipo de «benefício ao infrator», para usar uma linguagem desportiva, e, bem assim, que não

esteja prevista a reposição e o reforço da autoridade do departamento que sucedeu à antiga Inspeção-Geral

de Jogos, fortalecendo a sua independência face a quaisquer outros interesses de operação, neste contexto

de alargamento assinalável da oferta de jogo em Portugal e garantindo, assim, a sua maior capacidade quer

de ação própria, quer de cooperação com outras entidades estatais com competências nas áreas tributária e

de prevenção e investigação. Receio que o «quadro sancionatório sólido e eficaz», muito bem recomendado

pela exposição de motivos, não venha a ser nem uma coisa nem outra, sendo certo que esta é uma área em

que mais importa a prevenção, o impedimento e a dissuasão do que a mera repressão punitiva, por muito

severas que aparentem ser as sanções.

Olhando a outras ocasiões em que, na minha atividade política, tive que ocupar-me desta matéria da

política do jogo, não posso deixar de referir que sinto, hoje, de forma particularmente viva, a falta da Deputada

Maria José Nogueira Pinto, que foi também, entre outras funções públicas, Provedora da Santa Casa da

Misericórdia de Lisboa. Se ainda estivesse connosco na Assembleia da República, acredito que, hoje, haveria,

pelo menos, dois votos contra nas bancadas da maioria.

Resta-me a esperança nas declarações e na determinação dos governantes de que todos estes receios

são infundados. Oxalá!

Este meu voto contra é, nessa perspetiva, um investimento crítico, no sentido de contribuir para que o

regime concreto a regulamentar e implementar não rompa com a bem inspirada experiência portuguesa que

tão bons resultados tem dado. E não se afaste da experiência daqueles outros países europeus que partilham

os mesmos princípios fundamentais e cautelas e têm sabido tratar os modernos desafios, mantendo o

controlo, a disciplina e a rigorosa proteção do interesse público numa matéria tão importante quanto sensível.

O Deputado do CDS-PP, José Ribeiro e Castro.