25 DE SETEMBRO DE 2014
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sobreponha aos valores que enformam a nossa sociedade ou que se sobreponha aos direitos fundamentais de
mulheres e meninas que se veem condenadas a vidas de sofrimento, de servidão e de dependência.
A liberdade pessoal de cada um, o seu direito à autodeterminação, à reserva da vida privada, à proteção do
domicílio, o direito de ir à escola e de brincar na idade própria para o fazer, o direito de escolher casar ou não
casar, e de o fazer de forma livre e consciente com a pessoa escolhida e de preferência com a pessoa amada,
são direitos fundamentais do ser humano, assentes na sua dignidade.
Com estes projetos entendemos dar mais um passo na proteção destes direitos, porque é efetivamente de
direitos humanos que estamos a tratar.
Aplausos do PSD e do CDS-PP.
O Sr. Presidente (Ferro Rodrigues): — Para apresentar o projeto de lei do PS, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Isabel Alves Moreira.
A Sr.ª Isabel Alves Moreira (PS): — Sr. Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: Como já aqui foi dito, estamos,
de facto, a falar de direitos humanos, de direitos que podem ser resumidos ao livre desenvolvimento da
personalidade, que, por este mundo fora, tem vindo a ser negado a mulheres e a raparigas de uma forma
ultrajante.
Sabemos todos que uma coisa é a lei, outra coisa é a implementação da lei, o diálogo intercultural e as
medidas administrativas, e que o caminho para a conquista da igualdade de género e para o fim da violência
de género é um caminho duro, que não acaba na aprovação destes projetos de lei.
E se, nos últimos anos, Portugal e, muito especialmente, as mulheres portuguesas têm vindo a beneficiar
de importantes medidas que reforçaram a sua proteção face a diferentes tipos de discriminação e violência, se
são de referir, evidentemente, os cinco planos nacionais de prevenção e combate à violência doméstica e de
género aplicados desde 1999 no nosso País, bem como as várias melhorias introduzidas legalmente, numa
lógica de continuidade, pelos vários Governos, se é de referir também, repetindo o que já aqui foi dito, o facto
de Portugal ter sido pioneiro no plano internacional no desenvolvimento de políticas nesta área, tendo sido o
primeiro a ratificar a Convenção do Conselho da Europa conhecida como Convenção de Istambul, que entrou
em vigor no passado dia 1 de agosto, a verdade é que ainda falta fazer muito.
De facto, ainda falta fazer muito, como ressaltou no âmbito do grupo trabalho. Aproveito para saudar a
Deputada Carla Rodrigues, que presidiu ao grupo de trabalho criado para pôr em prática as obrigações
decorrentes da Convenção de Istambul, leia-se as obrigações penais decorrentes da Convenção de Istambul,
porque muito mais obrigações decorrem desta convenção. Queria, portanto, saudá-la, Sr.ª Deputada, nessa
qualidade, pelo excelente trabalho que levou a efeito.
A verdade é que nos concentrámos em fazer um trabalho relativamente à matéria penal, mas foi nossa
preocupação não ter um espírito de hiperpenalização. Isto é, há comportamentos que não têm de ter dignidade
penal, e a Convenção de Istambul, do nosso ponto de vista, é clara, por exemplo, relativamente ao assédio, e
há comportamentos que têm dignidade penal, como são os casos da perseguição e do casamento forçados,
que, como já aqui foi, dito, é uma prática absolutamente monstruosa. No que respeita à perseguição, saíram
hoje notícias sobre esta matéria, mas nós já tínhamos números absolutamente assustadores, nomeadamente
por parte da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV).
Assim, na presente iniciativa, propõe-se a criminalização da prática de perseguição, identificada como as
situações em que alguém, de modo persistente e indesejado, perseguir ou assediar outra pessoa, por
qualquer meio, direta ou indiretamente, de forma adequada a perturbar, constranger ou afetar a sua dignidade
— foi retirada do assédio esta expressão —, provocando medo, inquietação ou prejudicando a sua liberdade
de determinação. Ou seja, aquela parte do assédio que é tão forte que tem dignidade penal já está coberta
pelo tipo criminal de perseguição previsto quer no projeto de lei do PS, quer no projeto de lei do PSD e CDS.
Penso que deve ser entendido assim. O restante assédio está coberto pela lei laboral e não deve entrar no
Direito Penal.
A natureza específica e complexa deste novo crime, que é assumido, por isso, como semipúblico, justifica,
não obstante, à semelhança do que sucede, por exemplo, no crime de violência doméstica, e a par da moldura
principal, a previsão das penas acessórias que já aqui foram referidas e que são as mesmas.