I SÉRIE — NÚMERO 45
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Para apresentar o projeto de lei do Partido Socialista, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr.ª Presidente, Sr.as
e Srs. Deputados: A Lei n.º 32/2006, cuja
alteração hoje discutimos, representou um passo determinante em matéria de procriação medicamente
assistida, regulando o recurso de milhares de famílias às respostas que a investigação científica lhes oferece
para ultrapassar as barreiras que a infertilidade coloca à constituição de família.
No entanto, é fundamental e urgente ponderar igualmente a valorização da igualdade, da autonomia e da
liberdade individual na construção do regime jurídico da PMA, eliminando as normas que hoje constrangem,
de forma discriminatória, o acesso às técnicas de procriação assistida.
É isto, e apenas isto, que hoje se trata nesta Câmara: eliminar os obstáculos discriminatórios que vedam o
acesso à PMA a mulheres solteiras e a casais do mesmo sexo, alargando o número de beneficiários que, de
forma livre e esclarecida, podem optar pelo recurso às respostas que a ciência hoje oferece a todos.
Numa sociedade livre e democrática, orientada pelo respeito pela liberdade individual, pelo princípio da
igualdade e empenhada na realização dos direitos fundamentais, é uma solução que tarda e que se impõe.
Assim sendo, propomos o reconhecimento da PMA como técnica complementar de procriação e a
consequente supressão das exigências relativas ao estado civil ou à orientação sexual dos beneficiários.
Não se trata, nesta sede, de definir ou reorganizar a oferta das técnicas de PMA no Serviço Nacional de
Saúde — é um debate relevante e estruturante, mas que não é o debate que hoje realizamos —, mas tão-
somente de estipular a quem é lícito o recurso à PMA, em Portugal, eliminando uma inconstitucionalidade que
tarda em desaparecer.
É apenas esta dimensão da realização da felicidade individual de muitos portugueses e portuguesas que
nos deve convocar para o tema de hoje, permitindo a Portugal respeitar a Constituição e acompanhar o quadro
de direito comparado que, consensualmente, se tem construído neste sentido.
Não é, hoje, possível encontrar uma justificação para negar a uma mulher solteira a tomada de decisões
sobre a sua vida familiar, devendo suprimir-se a ideia menorizante de que precisa de estar casada para poder
ser autorizada a tomar decisões fundamentais nesta sede.
Como também não é possível encontrar justificação para desqualificar os casais do mesmo sexo, em
função da sua orientação sexual, negando-lhes também a capacidade de realizarem os seus projetos
familiares.
Permitam-me, para terminar, uma breve nota e uma ligeira divagação quanto ao que deve ser o papel do
Direito numa sociedade democrática. Nas paredes da faculdade em que me licenciei, à entrada, magníficos
painéis de Almada Negreiros dão-nos uma perspetiva da História do Direito, desde a Antiguidade até aos
codificadores do século XIX. Nestes painéis dos grandes juristas não se encontra representada uma única
mulher.
Não quero fazer aqui uma apreciação crítica dos painéis — a História é o que é, temos de viver com ela —,
mas inquestionavelmente temos de nos perguntar qual é o interesse desta referência.
A resposta é simples: a História que ali é contada diz muito sobre as perspetivas em que, hoje, continua a
assentar a construção da ordem jurídica e do Direito, uma construção feita por homens e para homens e na
qual, infelizmente, nem sempre se reconhece a autonomia plena que deve ser reconhecida às mulheres.
E é a subsistência desta construção que devemos ser capazes de ultrapassar, eliminado discriminações e
também conceções que já não pertencem ao século XXI.
O voto favorável é um bom caminho para começarmos.
Aplausos do PS.
A Sr.ª Presidente (Teresa Caeiro): — Tem, agora, a palavra a Sr.ª Deputada Helena Pinto para apresentar
o projeto de lei do Bloco de Esquerda.
A Sr.ª Helena Pinto (BE): — Sr.ª Presidente, Sr.as
Deputadas e Srs. Deputados: A lei de 2006 sobre a
procriação medicamente assistida (PMA) veio preencher um vazio legislativo que não fazia sentido, tendo em
consideração as possibilidades que estas técnicas clínicas permitem.