24 DE ABRIL DE 2015
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O autocultivo não prejudica ninguém, não prejudica terceiros e é um instrumento de combate ao tráfico. Os
clubes sociais existem noutros países e até são reconhecidos internacionalmente como uma experiência
exemplar — veja-se a posição da Organização Mundial de Saúde.
Portugal deu um exemplo, no início da década de 2000, ao despenalizar o consumo. Não há semana em
que o exemplo português não surja na imprensa internacional e nas revistas científicas como um exemplo
positivo. No entanto, este avanço deixou um paradoxo na lei: não é crime consumir, mas é crime ter uma
planta em casa para consumo próprio e é crime adquirir.
O autocultivo e os clubes sociais respondem a esse paradoxo. Em primeiro lugar, retiram os consumidores
dos circuitos clandestinos; em segundo lugar, retiram mercado aos traficantes; em terceiro lugar, controlam a
qualidade e, por isso, promovem a saúde pública; em quarto lugar, permitem o uso terapêutico, que vai sendo
reconhecido em cada vez mais países; em último lugar, promovem a informação e criam regras exigentes
onde hoje elas não existem.
Sr.as
e Srs. Deputados, se queremos regras, se queremos promover a saúde, se queremos
responsabilidade, deixemos a hipocrisia de lado, aprendamos com o mundo e tenhamos a coragem de aprovar
esta iniciativa do Bloco de Esquerda.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para apresentar o projeto de resolução do PCP, tem a palavra a Sr.ª
Deputada Paula Santos.
A Sr.ª Paula Santos (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: O consumo de cannabis tem evoluído de
uma forma preocupante no nosso País.
Depois da redução generalizada do consumo em 2007, constatou-se, em 2012, uma inversão, tendo
aumentado a prevalência do consumo na população em geral e com particular incidência na população
escolar. Aliás, a prevalência do consumo de cannabis pelos mais jovens apresenta uma tendência de
crescimento.
A isto, junta-se o aumento do consumo abusivo de cannabis e o aumento da população, que apresenta
sintomas de dependência também do consumo de cannabis.
Noutro plano, há uma maior procura de tratamento por consumidores de cannabis: 49% dos novos utentes
em tratamento em ambulatório são consumidores de cannabis e nas comunidades terapêuticas há já 24% de
utentes.
As nossas preocupações avolumam-se quando olhamos para esta realidade, ao mesmo tempo que a
capacidade de resposta dos serviços públicos na área da toxicodependência está comprometida, em resultado
das opções políticas do Governo de desestruturação, de desintegração da estratégia de combate à
toxicodependência e de desinvestimento público, que conduziu ao encerramento, à concentração de valências
e à enorme falta de profissionais de saúde, estando hoje as equipas multidisciplinares totalmente
depauperadas.
O que é urgente e necessário é reforçar o investimento público na prevenção, na redução de riscos e na
minimização de danos, no tratamento e na reinserção, garantindo a capacidade de resposta pública adequada
às exigências.
Para o PCP, a prioridade de intervenção passa pelo reforço na prevenção do consumo de cannabis, pela
adoção de medidas concretas dirigidas especificamente a cada grupo populacional e pelo reforço da
capacidade de resposta dos serviços públicos na área da toxicodependência, com a manutenção da
autonomia dos centros de respostas integradas, das unidades de desabituação e das unidades de alcoologia,
dotando-as dos meios financeiros, técnicos e humanos necessários e alargando as equipas de rua.
Propomos também que se atualize e se aprofunde o estudo científico relativo ao efeito do consumo de
cannabis na saúde, porque, por um lado, a produção de cannabis tem vindo a aumentar os teores THC, a
substância psicoativa responsável pelos efeitos nefastos na saúde, e, por outro lado, os estudos existentes
demonstram que o consumo de cannabis conduz a um maior risco de sintomas psicóticos e de perturbações
mentais.