I SÉRIE — NÚMERO 5
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O Sr. José Luís Ferreira (Os Verdes): — Por fim, e considerando que a Assembleia da República tem
atualmente um papel meramente decorativo no processo de nomeação dos administradores, como, aliás, ficou
visível com a postura do Governo anterior, que teimou na nomeação de administradores, apesar do parecer
negativo desta Assembleia, Os Verdes pretendem reforçar o papel da Assembleia da República nestes
processos, nomeadamente atribuindo uma natureza vinculativa ao parecer desta Assembleia e reforçando o
regime de incompatibilidades dos administradores destas entidades.
Por nós, fizemos a nossa parte. Esperamos agora que as restantes bancadas façam o seu trabalho com vista
a moralizar os salários dos administradores das entidades administrativas.
Aplausos do PCP.
O Sr. Presidente: — Para apresentar o projeto de lei do Bloco de Esquerda, tem a palavra o Sr. Deputado
Heitor Sousa.
O Sr. Heitor Sousa (BE): — Sr. Presidente, Srs. Deputados e Sr.as Deputadas: Iniciamos hoje os nossos
trabalhos com a discussão de três projetos de lei que incluem propostas comuns na parte relativa a algumas
alterações à Lei-quadro das entidades reguladoras independentes, mas que, no caso do projeto de lei n.º
179/XIII (1.ª), do Bloco de Esquerda, incide também sobre alterações ao Estatuto do Gestor Público, regulado
pelo Decreto-Lei n.º 71/2007, de 27 de março.
As propostas que fazemos são claras, precisas e concisas e visam dois objetivos claros, precisos e concisos:
um primeiro, relativo à redução das enormes desigualdades salariais no Estado e também no País, num País
que é o quinto mais desigual na União Europeia a 25 em matéria de rendimentos monetários pessoais; e um
segundo objetivo, que contribuirá para eliminar privilégios inaceitáveis dos gestores públicos, reforçando a
aplicação de princípios de transparência na determinação dos salários dos gestores de topo do Estado.
As propostas do Bloco de Esquerda foram suscitadas por um facto singular tornado público a 1 de fevereiro
de 2016. Ficou então a saber-se que os salários dos membros do Conselho de Administração da ANAC tinham
sofrido um aumento de mais de 250%. Tudo porque a Comissão de Vencimentos alegou que os vencimentos
estão conforme a lei-quadro, pois o anterior instituto público, o INAC (Instituto Nacional de Aviação Civil), tinha
passado a ser uma entidade reguladora independente, a ANAC, a 1 de abril de 2015.
Portanto, a ligação entre os salários destes gestores e a lei-quadro não decorre de uma qualquer mania de
perseguição do Bloco de Esquerda a estes administradores, mas, sim, da própria deliberação da dita Comissão
de Vencimentos.
E, neste ponto concreto, a Comissão de Vencimentos teve razão. De facto, a partir do momento em que a
ANAC passou a ser uma entidade reguladora independente deveriam aplicar-se os critérios de fixação de
remunerações incluídos na respetiva lei-quadro.
Só que, após uma série de audições em sede de comissão parlamentar, de várias comissões de vencimentos
e de entidades reguladoras independentes, e apesar de a lei-quadro incluir vários critérios para os salários dos
seus administradores, entre os quais se conta uma referência ambígua ao salário do Primeiro-Ministro, a verdade
é que, por um lado ou por outro, por cima ou por baixo, as audições realizadas e as grelhas salariais consultadas
continham uma única referência para a definição dos salários das administrações das entidades reguladoras
independentes: o salário do vice-governador do Banco de Portugal.
O que é que um salário de um ilustre vice-governador do Banco de Portugal tem a ver com uma qualquer
entidade reguladora independente? Zero!
Como se sabe, o Banco de Portugal é uma autoridade monetária especial que, em termos estatutários, não
se enquadra na Lei-quadro das entidades reguladoras independentes e funciona sob a tutela conjunta do Banco
Central Europeu e do Estado português.
Apesar disso, as várias comissões de vencimentos usaram e abusaram dessa referência para justificar
salários milionários nas entidades reguladoras independentes.
Ficou assim demonstrada a inutilidade dos critérios para a determinação das remunerações, a inutilidade das
comissões de vencimentos e a conivência das suas deliberações na fixação de salários milionários para esses
gestores, os quais configuram um insulto à democracia, ao povo e ao País.