I SÉRIE — NÚMERO 66
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O primeiro problema é o cadastro. Hoje é consensual que aquilo que constitui a maior ameaça à floresta é
fruto da desertificação, da alteração demográfica, da vida e de a utilidade económica da floresta ter vindo a
diminuir para a generalidade dos seus proprietários. Temos um País em que 90% da floresta é privada, grande
parte dela em regime de minifúndio e onde, portanto, a rentabilização da sua valorização económica é diminuta,
e isso tem conduzido ao seu abandono.
É por isso que a identificação do cadastro é essencial. O cadastro é absolutamente estratégico para criarmos
bases para a valorização económica da floresta. O conjunto de diplomas nesse sentido — a maioria deles virão
à Assembleia da República — visam, por um lado, reforçar as zonas de intervenção florestal para a associação
livre entre produtores florestais que querem desenvolver e valorizar em conjunto a sua floresta. Por outro lado,
visa a criação de entidades de gestão florestal, de natureza muito diversa, cooperativa ou societária, de forma
a podermos ter um aproveitamento económico mais eficiente da floresta; um pacote de benefícios fiscais tendo
em vista incentivar o investimento na floresta e, também, o seu aproveitamento para outros usos,
designadamente para a sua valorização energética através das centrais de biomassa.
A nossa convicção é a de que só uma floresta que seja uma base económica sólida atrai e fixa populações,
permite a sua manutenção, reforça a sua resiliência ao risco de incêndio. Por isso, esta é uma reforma que deve
ter o consenso mais alargado possível nesta Assembleia da República.
Sabemos bem que são escolhas difíceis, e não é por acaso, nem por má vontade, que há quase dois séculos
o cadastro está parado a norte do Tejo. Não é por acaso, é porque sabemos que é difícil.
Sabemos que é difícil enfrentar as limitações que o minifúndio e a estrutura da propriedade colocam na
rentabilização do investimento na manutenção da floresta, mas temos de encontrar forma de o fazer em diálogo
com as populações, com os proprietários, explicando e mobilizando as pessoas para a compreensão de que
investir na floresta é investir na rentabilização e na valorização do seu próprio território.
É por isso que temos de dar um novo papel às autarquias locais. Ninguém cuida melhor da nossa casa do
que nós próprios e ninguém cuida melhor do seu território do que cada autarquia, porque o território é a casa de
cada uma das autarquias locais.
Aplausos do PS.
Finalmente, é por isso que temos de ter um quadro de ordenamento que permita o máximo de
descentralização com o maior rigor técnico possível. Os planos de ordenamento florestal, cuja capacitação
técnica exigem a mobilização do melhor do saber e do rigor e que não beneficiam nem mais, nem menos com
a proximidade, têm de estar confiados às autoridades centrais do Estado, designadamente ao Instituto da
Conservação da Natureza e das Florestas (ICNT).
Mas, a sua aplicação e fiscalização no terreno ganham em tudo com a proximidade e têm tudo a perder com
a distância. Quem está em cada uma das terras, seja no município, seja na freguesia, está necessariamente em
melhores condições de fiscalizar do que quem está em Lisboa ou numa direção regional, ainda que seja numa
capital de uma das regiões.
É por isso que temos de saber aproveitar aquilo que é a mais-valia resultante da concentração do saber
técnico num instituto como o ICNF (Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas) e simultaneamente
a capacidade de desmultiplicação que as autarquias locais têm para fiscalizar e, também, para poderem
mobilizar aqueles que têm de ser os primeiros defensores da floresta, que são aos habitantes do território.
Não podemos continuar a ter a floresta a ser vista como inimiga das populações, pelo contrário queremos
que seja uma riqueza querida e, por isso, defendida e protegida pelas populações. É esse o desafio que todos,
em conjunto, temos de conseguir ganhar.
Aplausos do PS.
O Sr. Presidente: — Também em nome do Grupo Parlamentar do PS, tem a palavra a Sr.ª Deputada
Gabriela Canavilhas.