I SÉRIE — NÚMERO 70
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O projeto de lei do PS pode ter algum enquadramento e tem algumas coisas que nós percebemos.
Agora, o que gostávamos que ficasse bem claro é a questão do prazo de 30 dias, que não se entende. Não
se entende como é que os arautos do Simplex acham que se demora 30 dias a registar os efeitos de um
casamento. Mas os senhores são os primeiros a perceber que os 300 dias são absolutamente importantes
porque afastam a presunção de paternidade se não tiverem decorrido 300 dias até ao segundo casamento.
Sr. Presidente, para terminar, quero referir que podemos, eventualmente, ainda discutir esta questão, mas é
de notar que existem aqui questões de burocracia que também devem ser atendidas. Não são questões de
preconceito moral,…
Vozes do BE e do PCP: — Não, não!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — … são questões de burocracia, porque, se não houver presunção
de paternidade — o que os senhores deveriam fazer, se fossem coerentes, era acabar com as presunções de
paternidade —,…
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — Bem lembrado!
A Sr.ª Vânia Dias da Silva (CDS-PP): — … vamos ter de ir todos ao registo registar as crianças e vamos ter
todos de andar a fazer testes de ADN, e não sei se sabem que isso custa dinheiro e que o Estado não vai
suportar.
Aplausos do CDS-PP e do Deputado do PSD Hugo Lopes Soares.
O Sr. Presidente (José Manuel Pureza): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado António
Filipe.
O Sr. António Filipe (PCP): — Sr. Presidente e Srs. Deputados, as iniciativas que hoje debatemos, que
visam determinar o prazo internupcial previsto no Código Civil, laboram num equívoco, pois, em vez de
resolverem qualquer problema existente, a serem aprovadas, viriam a criar problemas que hoje não existem e
só viriam a gerar demoras, complicações e despesas.
Senão, vejamos: será o prazo internupcial baseado em razões moralistas? Tê-lo-á sido! Tê-lo-á sido em
1966, mas já não nos parece que o tenha sido para o legislador que, em 1977, procedeu à revisão do direito da
família e o manteve.
Será o prazo de 300 dias para as mulheres baseado em razões discriminatórias ou funcionará como uma
base fáctica necessária para fazer funcionar a presunção de paternidade estabelecida no Código Civil?
As razões do prazo internupcial são muito bem explicadas por Pereira Coelho e Guilherme Oliveira no livro
Curso de Direito da Família nos seguintes termos: «(…), se um 2.º casamento imediato fosse possível o filho
que nascesse dentro dos 300 dias subsequentes à dissolução, (…) do 1.º casamento seria havido como filho do
1.º e do 2.º marido (…)».
O Sr. Hugo Lopes Soares (PSD): — É a verdade!
O Sr. António Filipe (PCP): — «É certo que a lei prevê a possibilidade de semelhante conflito de presunções
de paternidade, definindo um critério para a respetiva solução (…), mas há interesse em evitar que o conflito
surja e a exigência de um prazo internupcial serve esse interesse; (…)». E é apenas isto.
Qualquer razão de carácter moral que possa ser invocada para a existência de um prazo internupcial para
as mulheres é para nós irrelevante. O único facto que releva é o de esse processo servir para tornar possível a
existência de uma presunção de paternidade a favor do marido da mãe.
Haverá alguma vantagem em acabar com essa presunção? Nós não estamos a ver qual seja. Não vemos
vantagem nenhuma em obrigar uma mãe casada a ter de declarar quem é o pai do seu filho quando isso hoje
está resolvido com uma presunção legal.