I SÉRIE — NÚMERO 71
16
vista à redução do preço do gás de botija, processos em curso que acompanharemos atentamente nos próximos
meses.
Regista-se também positivamente o fim da atribuição de tarifas subsidiadas nas novas licenças para centrais
produtoras. Mas o Bloco de Esquerda identificou, e tem apresentado publicamente, um conjunto de novos
subsídios, autorizados pelo anterior Governo, nos seus últimos meses de mandato. No seu conjunto, essas
autorizações correspondem a mais de 200 milhões de euros de encargos para os consumidores ao longo de 15
a 20 anos. Impõe-se, portanto, no atual quadro, o completo escrutínio dessas promessas e a sua reversão. E
se é indispensável impedir a instalação de um novo rentismo no sistema energético, esse compromisso do
Governo não é suficiente só por si. O velho rentismo continua instalado: 85% da energia produzida, em Portugal,
beneficia de rendas ou subsídios administrativos. O Governo tem respondido ao Bloco que as rendas vindas do
passado são hoje intocáveis, que estas remunerações estratosféricas são questão de respeito pela estabilidade
contratual.
Mas, Sr. Secretário de Estado, as famílias gelam e a economia sufoca sob os custos da energia. E não é só
o Bloco que o diz. No seu recente relatório económico sobre Portugal, a OCDE é taxativa: «No setor energético,
uma série de reformas melhorou a regulação e eliminou a possibilidade de remuneração acima dos preços de
mercado, mas apenas para novos operadores. (…) Uma ação mais forte para reduzir esquemas de remuneração
herdados do passado — através da renegociação desses contratos anteriores e da aceleração do calendário de
retirada dos esquemas de preços garantidos — poderia resultar em preços da energia mais competitivos».
É a OCDE que o diz: é preciso reabrir os contratos e cortar nas rendas de energia garantidas às grandes
elétricas.
Aplausos do BE.
Nos anos 90, para valorizar a privatização da EDP, o Governo assegurou duas a três décadas de negócio
sem risco. Mais tarde, em nome da «livre concorrência», foi antecipado o fim destes contratos, mas foi
estabelecido o pagamento às elétricas, até 2024, de enormes subsídios. Assim nasceu o mercado liberalizado.
Ora, o peso destes subsídios, os famosos CMEC, tem representado cerca de um terço dos lucros da EDP
antes de impostos. São taxas de remuneração de 14% ao ano, ao nível das PPP (parcerias público-privadas)
mais ruinosas. Em 2017, estas rendas vão atingir 300 milhões de euros na fatura dos consumidores.
Como se não bastasse, as renováveis reproduziram estes velhos vícios. Se os produtores renováveis
praticassem em Portugal os preços que são obrigados a praticar em Espanha, o alívio na fatura dos
consumidores seria de 500 milhões de euros por ano.
É preciso tocar onde dói. O que pode permitir libertar recursos para a eficiência energética e para baixar a
fatura é isso mesmo. É isso que pode permitir apoiar a economia e o emprego e dar algum alívio às vítimas da
pobreza energética.
Sr.as e Srs. Deputados: Termino esta intervenção referindo-me ao projeto de lei ontem entregue pelo Bloco
de Esquerda para a reposição do controlo público sobre o planeamento e a Gestão Técnica Global do Sistema
Elétrico, funções de soberania e segurança hoje concessionadas à REN.
O Presidente da REN já se apressou a vir responder muito diligentemente, atirando o debate para o terreno
da ameaça de apagões e de cortes de abastecimento futuro, se esta proposta do Bloco de Esquerda fosse
aplicada.
Vamos concentrar-nos na matéria.
A perversidade da privatização da REN evidencia-se logo na fase do planeamento da expansão e
modernização da rede. O chumbo sucessivo, pelo regulador, de todos os planos de investimento apresentados
pelo operador privado teve sempre a mesma razão: planos excessivos, gastos acima das necessidades de
desenvolvimento e segurança da rede. E para quê? Apenas para maximizar a remuneração da concessionária,
definida por uma taxa cuja base aumenta a cada novo investimento. Quem faz o plano, ganha com o
investimento. E, por esta razão, o grupo de trabalho, entre o Bloco de Esquerda, o Partido Socialista e o Governo,
propôs que estes planos passem a ser sempre debatidos e escrutinados no Parlamento, como agora passou a
acontecer.
Mas, além do risco de um planeamento gastador, a privatização destas funções estratégicas coloca sérios
riscos de falta de transparência e conflito de interesses.