20 DE SETEMBRO DE 2017
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Este é um problema institucional prático, mas também há problemas institucionais não práticos, isto é, que
digam respeito apenas ao sistema português, e que têm a ver com o funcionamento do sistema.
O crédito que hoje existe para alimentar bolhas especulativas não é criado só pelos bancos, é criado fora
dos bancos, fora dos balanços, por derivados, por fundos de investimento, por alavancagem financeira, por
instituições que não estão sob regulamentação bancária, que agem livremente e que formam um sistema-
sombra que está à margem de todo o nosso edifício de supervisão bancária. Por isso, para além de um sistema
de supervisão capaz de reconhecer as novas realidades financeiras, é preciso alterar as regras do sistema
bancário.
Há, num estudo feito há pouco tempo por Reinhart e Rogoff — que não são propriamente economistas muito
ligados à esquerda mas que fizeram um livro muito interessante sobre crises bancárias no mundo —, um gráfico
impressionante, para o qual mapearam as diferentes crises bancárias ou a percentagem de países com crises
bancárias desde 1800, tendo chegado a duas conclusões muito interessantes: a primeira é que as crises
bancárias aumentam exponencialmente quando a mobilidade do capital aumenta exponencialmente (portanto,
quanto mais móvel e menos capaz de ser controlado for o capital, mais crises bancárias haverá); a segunda é
que, surpreendentemente, entre 1950 e 1980, não há praticamente crises bancárias no mundo e elas começam
a aumentar, de uma forma incrível, a partir de 1980.
Não é preciso saber muito sobre a história do sistema capitalista para se perceber que os 30 anos em que
não houve crises bancárias foram os anos em que o sistema foi mais regulamentado, em que houve uma
separação entre banca de investimento e banca comercial, em que houve controlo de capitais, restrições à
atividade financeira, à especulação e à atividade bancária. E foram também os 30 anos em que não houve
nenhum preconceito por a propriedade pública tomar conta dos destinos da banca, que se tentou que se
adaptasse um pouco mais ao sistema produtivo.
Aplausos do BE.
Por isso, Srs. Deputados, o desafio é que nos deixemos de tabus ideológicos e consigamos discutir, do ponto
de vista racional, como é que se faz para que a banca deixe de ser meramente um instrumento de especulação
e passe a ser um instrumento de apoio à economia produtiva. Como é que se limita a capacidade de
especulação? Como é que se limita a capacidade de alavancagem? Como é que se limita a capacidade
endógena que a banca tem para criar crises e para ser um mecanismo eternamente instável e capaz de provocar
instabilidade nas economias?
Entretanto, assumiu a presidência o Vice-Presidente Jorge Lacão.
O Sr. Presidente: — Peço-lhe o favor de concluir, Sr.ª Deputada.
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Termino, Sr. Presidente, dizendo que, sem discutir o funcionamento da
banca, vamos estar sempre a correr atrás do prejuízo. Mas, sobre esta matéria, o debate está muito no início e
o PSD teve, até agora, pouco a dizer.
Aplausos do BE.
O Sr. Presidente (Jorge Lacão): — Para uma intervenção, tem agora a palavra o Sr. Deputado Paulo Sá, do
PCP.
O Sr. Paulo Sá (PCP): — Sr. Presidente, Srs. Deputados: A supervisão bancária, no quadro do sistema
financeiro capitalista, é um mecanismo de controlo insuficiente e ineficiente. É insuficiente porque as condições
objetivas em que o supervisor desenvolve a sua missão não permitem uma presença intrusiva e um controlo
eficaz sobre as contas e práticas do sistema financeiro. É ineficiente porque o supervisor é uma emanação do
sistema bancário e não um instrumento público de escrutínio e de efetivo controlo.
Em Portugal, a supervisão não evitou o colapso de nenhum banco e nem sequer foi capaz de intervir no
sentido de impedir práticas fraudulentas da banca.