I SÉRIE — NÚMERO 5
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O debate autárquico confirmou, aliás, a importância da prioridade e da urgência na implementação de uma
nova geração de políticas de habitação.
Coexistem hoje problemas antigos de acesso à habitação pelas famílias em situação carenciada, que a
erradicação das barracas não eliminou, com problemas novos que têm excluído das cidades as classes médias,
em especial as novas gerações, que foram sendo condenadas ao adiamento da sua autonomia, ao
endividamento ou ao abandono do centro das cidades.
Este não é um problema exclusivamente nacional. A excecionalidade portuguesa tem sido a ausência de
uma resposta das políticas públicas às crescentes pressões do mercado.
Todos sabemos que não há «balas de prata» para este desafio, que exige uma ação concertada e medidas
abrangentes direcionadas a diferentes segmentos da população e a desencontros concretos entre a oferta e a
procura.
Aprovámos, por isso, esta manhã, em Conselho de Ministros, um conjunto de três diplomas e, ainda, para
debate público, uma nova geração de políticas de habitação, que será promovida em estreita articulação com
os municípios e que se traduz na mudança: em primeiro lugar, de uma política centrada na oferta pública de
habitação para os mais carenciados para uma política orientada para o acesso universal a uma habitação
adequada; em segundo lugar, de uma política de habitação cujos principais instrumentos assentaram na
construção de novos alojamentos e no apoio à compra de casa própria para uma política que privilegia a
reabilitação urbana e o arrendamento; em terceiro lugar, de uma política de habitação centrada nas «casas»
para uma política que coloca no seu centro as «pessoas»; em quarto lugar, de uma política centralizada e setorial
para um modelo de governança multinível, integrado e participativo; e, por fim, de uma política reativa para uma
política proactiva, com base em informação e conhecimento partilhado e na monitorização e avaliação dos
resultados.
São assumidas duas metas concretas, a atingir num prazo de oito anos, que permitirão aproximar-nos ou
concretizar as médias europeias: por um lado, reduzir a taxa de esforço das famílias com as despesas de
habitação de 35% para 27%, o que corresponde à média europeia; por outro lado, aumentar o peso da habitação
com apoio público, na globalidade do parque habitacional, de 2% para 5%, o que, representando um acréscimo
de 170 000 fogos, ainda nos deixará a meio caminho da média europeia.
Aplausos do PS.
Esta é bem a medida do atraso que acumulámos durante décadas em políticas públicas de habitação e é
também a medida da urgência de concretizar o que está por concretizar.
Para alcançar estas metas, propomos um conjunto alargado de instrumentos que procuram responder aos
problemas diagnosticados em três dimensões fundamentais.
Em primeiro lugar, dar resposta às famílias que vivem em situação de grave carência habitacional.
Erradicámos as barracas, mas continuamos a ter famílias excluídas de uma habituação adequada e de
condições de vida dignas. Será assim criado um novo programa, que designámos por «1.º Direito», direcionado
para este objetivo. A resposta a esta dimensão inclui também a necessidade de alojamento urgente em resultado
de acontecimentos imprevisíveis ou excecionais, como catástrofes ou fenómenos migratórios de grande escala.
A segunda dimensão é a de tornar a reabilitação na principal forma de intervenção no desenvolvimento
urbano, em detrimento da construção nova. Foi para isso aprovado o projeto Reabilitar como Regra, que prevê
a revisão do enquadramento legal da construção, de modo a adequá-lo às exigências e especificidades da
reabilitação de edifícios. Está ainda previsto o aprofundamento e articulação entre os seis instrumentos
existentes de apoio ao investimento em reabilitação, em particular para o arrendamento habitacional.
Mas queria deter-me na dimensão que é o objetivo primeiro e mais distintivo deste conjunto de medidas:
garantir o acesso à habitação aos que não têm resposta por via do mercado e que hoje já não são apenas as
famílias mais carenciadas. Falo das classes médias afastadas dos centros urbanos que, ficando cada vez mais
longe do trabalho, agravam a sua qualidade de vida e o paradigma de mobilidade nas áreas metropolitanas, falo
dos jovens que adiam sucessivamente os seus projetos de vida por não terem casas a preços que consigam
pagar.