I SÉRIE — NÚMERO 12
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Esta falha teve e tem um custo inimaginável, insuportável, inédito. Cento e dez portugueses perderam a vida
e todos, sem exceção, nos unimos na dor de familiares e amigos.
Milhares de pessoas viveram horas de agonia, em risco de vida, tentando salvar-se a si e aos seus bens
mais essenciais, esperando e desesperando por uma ajuda que não chegava, que não chegou. E cada um de
nós viu e ouviu relatos mais próximos ou mais distantes mas que podiam ser o nosso ou dos nossos.
Mais de 500 habitações ficaram perdidas, mais de 500 000 ha arderam. A maior área ardida de sempre,
espalhada pelo País fora. Centenas de empresas, da indústria à hotelaria, da agricultura aos serviços, perderam
tudo.
Não há neste País um de nós que não tenha um familiar, um amigo, um conhecido que nos tenha feito um
relato doloroso, na primeira pessoa.
O Estado português falhou, como todos reconheceram, desde o Presidente da República ao Governo, a
todos os partidos sem exceção, mas não falhou de forma abstrata, numa conjugação de azares excecionais,
falhou de modo muito concreto, teve dias e horas precisas. Falhou porque os seus responsáveis políticos não
souberam preparar, não souberam coordenar, não souberam executar uma política eficaz de prevenção e de
combate aos fogos.
Foi um falhanço do Governo, órgão de soberania que no nosso sistema democrático tem a condução
executiva do Estado e a responsabilidade máxima pela Administração. Governo que sabia das condições
meteorológicas dificílimas que em vários momentos se verificaram no nosso território. Condições extremas, mas
não inesperadas, condições que exigiam preparação e prontidão suplementares. Neste País, onde é bem
conhecida a tendência para diluir culpas numa amálgama de não responsáveis, é preciso dizer, como dissemos
desde a primeira hora: há que apurar responsabilidades políticas até às últimas consequências porque, em
política, essa é a única forma de prestar homenagem a quem perdeu a vida às mãos de um Estado incompetente.
É isso que fazemos aqui hoje.
O relatório da Comissão Técnica Independente que procedeu à análise e ao apuramento dos factos relativos
aos incêndios que ocorreram na área de Pedrógão é claro quanto a essas falhas e quanto às responsabilidades
por essas falhas: era possível ter evitado a propagação do incêndio, era possível ter evitado ou limitado
fortemente a tragédia, tivessem sido cumpridas as normativas e empenhados os meios delas decorrentes.
Por que razão não foi acionado o segundo meio aéreo ainda no combate inicial? Por que razão o incêndio
esteve duas horas sem qualquer meio aéreo, duas horas em que poderia ter sido controlado?! Por que razão
não foi mobilizado o único meio pré-posicionado, da Força Especial de Bombeiros de Castelo Branco, como
deveria ter sido, quando se passou à fase de ataque ampliado?! O relatório é lapidar, e cito: «não se verificou
incremento algum de meios, como seria expectável»; «não se encontraram razões explícitas que poderiam ter
justificado a não mobilização deste grupo»; «o único [meio] formatado, posicionado num distrito vizinho, em
estado de prontidão imediato, não é mobilizado» ou, ainda, «não se encontrou justificação racional para esta
decisão».
O Governo falhou, porque os erros apontados pelo relatório da Comissão Técnica Independente são
injustificados e só podem resultar de uma profunda incompetência e descoordenação aos níveis político e
operacional. Foi o falhanço de uma estrutura pensada e estruturada pelo ex-Ministro da Administração Interna
António Costa e nomeada, agora, pelo Primeiro-Ministro António Costa, de acordo com o critério da amizade e
não o da competência.
Aplausos do CDS-PP.
O Governo falhou porque o Primeiro-Ministro se recusou obstinadamente a alterar a sua composição
governamental, recusou-se a pedir desculpa pelo sucedido, recusou-se a chamar as famílias das vítimas para
as indemnizar, recusou-se a assumir qualquer responsabilidade, culpando o clima e a floresta e os próprios
portugueses pelo sucedido.
O Governo falhou porque, perante uma catástrofe daquelas dimensões, se exigia, da parte do Governo, uma
ação rápida para garantir que a época que se estava a iniciar em junho não voltaria a ter episódios trágicos. E
o Governo ignorou o curto prazo. Como se pudéssemos passar por cima do verão, esperou por conclusões de
relatórios para agir, como se a catástrofe não aconselhasse uma resposta rápida, urgente, já para este ano! E
o desastre voltou a acontecer em outubro.