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23 DE MARÇO DE 2018

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O Sr. Bruno Dias (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Há um ponto de partida incontornável

para nós neste debate, que é o da exigência de superar as crescentes dificuldades de um País mais periférico,

dependente e vulnerável, dificuldades que se acentuaram com a adesão ao euro; é o da necessidade de

recuperação dos instrumentos políticos e económicos perdidos que se revelem indispensáveis ao seu

desenvolvimento, no plano económico e monetário, das relações comerciais e do desenvolvimento do setor

produtivo e da defesa da produção nacional e do emprego; é o da necessidade de garantir a sua soberania e o

pleno direito do povo português de decidir do seu próprio destino e de ver assegurada a prevalência dos

interesses nacionais.

Há avanços tecnológicos a operarem-se a grande velocidade e com impactos significativos na organização

do trabalho e na sociedade e com previsíveis desenvolvimentos num futuro próximo. A questão é que, com ou

sem aplicação de progressos tecnológicos, estes têm sido pretexto, em nome da competitividade, da

concorrência, da globalização e da internacionalização, para impor cada vez mais uma política de exploração

da força do trabalho e do empobrecimento geral. São disso expressão o aumento das desigualdades; a redução

do peso dos rendimentos do trabalho na distribuição do rendimento nacional; o crescente incremento da

subcontratação através de cadeias de distribuição e produção globais; a liquidação do direito de contratação

coletiva e de outros direitos; a pressão para a substituição dos sistemas de segurança social por medidas

assistencialistas; as medidas de política fiscal que aliviam os lucros e penalizam o trabalho, como, entre outras,

o alargamento do horário normal de trabalho e também a exigência de disponibilidade 24 horas por dia e de

flexibilidade de horário.

A este propósito, regressam as velhas teses em torno do «fim do trabalho» ou de um «trabalho sem futuro».

Apresentam estas teses como uma inevitabilidade, como uma alteração profunda do modo de produção ou uma

«modernização» das relações de trabalho, embrulhada em conceitos que mais não são do que formas de

trabalho precário, que acentuam a sua natureza exploradora. Dão como adquirido o desaparecimento de 45%

a 60% de postos de trabalho nos países do sul da Europa.

Nós nem vamos perguntar o que fariam, nessa «sociedade sem trabalho», à produção resultante dessa

proclamada revolução tecnológica, nem perguntaremos quem a iria consumir. Nem vamos, agora, discutir se as

contas estão certas nesse «deve e haver» entre o emprego perdido e muito novo emprego que inevitavelmente

se criará.

O problema está em saber se o aceitamos, se tal for verdade, e se estamos condenados a essa suposta

inevitabilidade. Se os trabalhadores, os povos e os países estão condenados a aceitar o seu projeto de

desenvolvimento caótico e desumano e a sua consideração ou inconsideração em relação aos problemas

sociais.

É óbvio que o avanço das forças produtivas é, em si mesmo, altamente desejável e o nosso País bem precisa

desse avanço e dessas oportunidades para promover o desenvolvimento. Mas o progresso tecnológico tem de

ser acompanhado por um progresso social e político que verdadeiramente não se verifica, pelo contrário esse

progresso tecnológico é cada vez mais usado como pretexto para novas e mais perigosas ofensivas e extorsões.

E este é um problema central — o da apropriação dos ganhos do desenvolvimento tecnológico pelo capital

monopolista e multinacional. Uma apropriação que se alarga às mais diversas áreas da nossa vida coletiva,

através de patentes e da propriedade intelectual, que se traduzem em reais bloqueios na transferência e

disseminação do conhecimento e que representam, por exemplo, atrasos e retrocessos na erradicação de

doenças e de tragédias sociais.

As causas dos flagelos sociais não estão na aplicação das tecnologias ou do desenvolvimento tecnológico.

O problema do desenvolvimento tecnológico é o de saber a quem serve e ao serviço de quem está. Se o

desenvolvimento tecnológico é apropriado por uma minoria cada vez mais restrita, mais rica e mais poderosa

ou se é apropriado ao serviço do ser humano e do desenvolvimento geral. Se ele serve para libertar a

humanidade, em harmonia com a natureza, ou para uma minoria exercer o seu domínio, controlo e subjugação.

Se ele está ao serviço de alguns e não dos trabalhadores e dos povos.

A inovação, a ciência, as tecnologias são a oportunidade para criar riqueza e distribui-la. Elas são uma

componente essencial, no programa de desenvolvimento do País que preconizamos, para combater as suas

fragilidades, a sua dependência, os défices estruturais, as debilidades dos seus setores produtivos e da

economia, o elevado desemprego, as nossas insuficientes respostas sociais.