I SÉRIE — NÚMERO 74
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A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa tem obrigações de cariz social e não pode ser um especulador
financeiro, nem pode nem deve ser um gestor de carteira de participações qualificadas.
Por isso, tomámos boa nota, como também já aqui foi dito, de informação avançada pela Santa Casa, de
que as intenções de investir no Montepio se afastam muito dos 200 milhões de euros inicialmente avançados e
que se situam agora em menos de 10% desse valor.
No entanto, a análise que o Bloco de Esquerda faz destas intenções de investimento no Montepio são bem
mais abrangentes do que o aproveitamento que o PSD e o CDS têm feito, de forma oportunista, deste caso. A
discussão vai muito além daquilo a que a direita quer limitar ou fazer limitar este debate.
A questão que se coloca é sobre as obrigações da Santa Casa em termos de políticas de investimento. Entre
fundos de investimento mobiliário, entre participações financeiras, nas quais se incluem ações, e entre ativos
correntes, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa tinha, em 2012, 308 milhões de euros; em 2013, 365 milhões
de euros; em 2014, 477 milhões de euros; em 2015, 489 milhões de euros.
A primeira pergunta que se deve fazer é se faz sentido que a Santa Casa tenha aumentado os ativos
disponíveis de 300 milhões de euros para 500 milhões de euros, justamente nos anos em que a crise se fazia
sentir de forma mais grave na vida das pessoas.
A segunda questão é a de saber de que forma é que estes ativos estão investidos hoje e estiveram investidos
no passado. É porque PSD e CDS mostram-se muito indignados agora com 18 milhões de euros, mas a Santa
Casa tinha em fundos mobiliários, nos quais perderam dinheiro, em 2012, 100 milhões de euros, em 2013, 90
milhões de euros e, em 2014, 209 milhões de euros.
A Santa Casa da Misericórdia de Lisboa tinha em ações, em 2014, 16 milhões de euros e tinha, em Outras
participações, em 2012, quase 50 milhões de euros, em 2013, quase 50 milhões de euros e, em 2014, quase
50 milhões de euros e mais 18 milhões de euros em Outras participações não discriminadas.
A terceira questão é esta: algum dos Srs. Deputados sabe o que é que está nesta carteira de participações?
Podem garantir os Srs. Deputados do PSD e do CDS, que agora estão indignados, que, nesta carteira de 16
milhões de euros de ações, não estão participações noutros bancos portugueses? Podem garantir que nesta
carteira de participações não cotadas não estão participações em empresas privadas, que nada têm a ver com
o cariz e com o caráter social da Santa Casa e participações até superiores àquelas que são agora propostas?
Por isso, Srs. Deputados, a questão sobre a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa não é apenas a questão
do Montepio, é também a questão da carteira de investimentos da Santa Casa, de como é que se regula e se
define quais são os limites de investimentos financeiros da Santa Casa e de quais os montantes que a Santa
Casa deve ter disponíveis ou deve ter investidos na sua ação social.
Para responder a estas questões e para não nos deixarmos enganar pelo oportunismo discricionário e
momentâneo de quem se quiser lembrar, num momento ou noutro, de questionar um ou outro investimento,
conforme lhe dá mais interesse, e fechar os olhos a outros, se lhe der menos interesse, entendemos que o
Governo tem de reforçar o seu papel no escrutínio dos investimentos da Santa Casa, mas, mais do que isso,
tem de haver um código de conduta.
Por isso, recomendamos ao Governo que crie, à semelhança da portaria que já regula o Fundo de
Estabilização da Segurança Social, um quadro legal de regras de aplicação de fundos da Santa Casa, que limite
os ativos disponíveis não investidos em ação social, que discipline investimentos financeiros e que discipline
que tipo de investimentos podem ser feitos e em que tipo de ativos financeiros, por categorias de risco, para que
seja muito claro para toda a gente os limites e a política de transparência de uma instituição tão importante e
que gere tanto dinheiro como a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.
Vozes do BE: — Muito bem!
A Sr.ª Mariana Mortágua (BE): — Achamos que só assim é que teremos garantias de transparência e de
rigor e só assim é que teremos a certeza de que as políticas de investimento da Santa Casa são, de facto,
escrutinadas e não andam ao sabor de interesses oportunistas e discricionários.
Aplausos do BE.
O Sr. Adão Silva (PSD): — É a favor ou contra? Não sabe bem!