I SÉRIE — NÚMERO 102
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O Sr. RenatoSampaio (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A descentralização de competências
para as autarquias é a base fundamental da reforma do Estado. Esta é uma reforma que todos proclamam,
todos reclamam, todos prometem, mas que, na prática, até hoje, nunca foi verdadeiramente concretizada. O que
hoje temos não passa de um mero estabelecimento de protocolos, de contratos-programa ou de outros
instrumentos administrativos entre a administração central e a administração local. Esta não é uma boa prática
de governação, porque não garante autonomia desejável do poder local, cria desigualdades entre municípios e
desresponsabiliza quem tem obrigação de executar projetos e de implementar políticas públicas essenciais.
Inventaram-se modelos de organização territorial que nos faziam crer que a descentralização passava por
aí, como foi o caso particular da reforma imposta da administração do território, que falhou, porque imposta e
implementada sem a participação dos vários decisores políticos e contra os cidadãos.
Portugal é um dos países menos descentralizados da Europa, onde impera o centralismo, que nos tem
conduzido a um Estado burocratizado, feito de lentas decisões, de duplicação de estruturas de gestão e de
desresponsabilização dos gestores públicos.
A descentralização enquanto modelo de organização do território pode ser concretizada por duas vias: pela
regionalização ou pela transferência de competências para a administração local. O PS sempre defendeu a
regionalização e não abdica dela, não abdica deste desígnio e sobre esta matéria não recebe lições de ninguém.
Mas a regionalização está hoje muito comprometida pela imposição do referendo vinculativo constitucionalmente
consagrado.
Resta-nos, de momento, a transferência de competências para as autarquias locais, se quisermos e se existir
a vontade política de concretizarmos esta importante reforma.
Por parte do Governo e do Grupo Parlamentar do Partido Socialista, existe essa vontade política de construir
um amplo consenso nesta Câmara, por forma a garantir a estabilidade destas políticas, um bem maior do Estado
democrático, e assim fazer com que esta reforma não esteja à mercê das maiorias conjunturais que se venham
a formar no futuro. Temos consciência de que as autarquias, por estarem mais próximas dos cidadãos, da
tomada de decisões e pelo conhecimento que têm da realidades locais e dos seus territórios, estão em melhores
condições para executarem políticas públicas essenciais, com maior eficiência, melhores critérios de
transparência e confiança, maior racionalização dos recursos disponíveis, contribuindo assim para o
desenvolvimento local efetivo, para a coesão económica e social do território, reforçando ainda a solidariedade
intermunicipal, promovendo políticas ativas para a valorização do interior e a fixação de pessoas nestes
territórios.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados, hoje, o poder local é uma realidade consistente que nos permite
promover uma descentralização adequada, efetiva e necessária à realidade dos diversos territórios, potenciando
uma governação de proximidade e o uso eficiente dos recursos locais. Todavia, para este desígnio se
concretizar, é necessário desenvolver um novo quadro de financiamento da administração local para
acompanhar o reforço das competências das autarquias, convergindo, conforme a meta estabelecida no
programa nacional de reformas, para a média europeia em termos de participação das autarquias nas receitas
públicas.
Foi o que o Governo fez com a apresentação de uma proposta de alteração à Lei das Finanças Locais,
compatibilizando assim as novas competências com o novo modelo de financiamento.
O Sr. Presidente: (José de Matos Correia) — Tem de terminar, Sr. Deputado.
O Sr. Renato Sampaio (PS): — Temos em processo legislativo um conjunto de propostas do Governo com
o objetivo de transferir novas competências para as autarquias locais, bem como uma profunda alteração à Lei
das Finanças Locais.
A esta Câmara está atribuída a responsabilidade de aprovar esta decisiva reforma da Administração Pública.
O Grupo Parlamentar do PS quer contribuir para que se crie um amplo consenso nestas políticas e, assim,
estamos disponíveis para trabalhar com todos — com todos sem exceção — para promovermos uma verdadeira
descentralização do Estado.
Aplausos do PS.