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14 DE JULHO DE 2018

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Em Portugal, se é um facto que temos diminuído o desemprego, o défice e melhorado alguns indicadores de

reposição de rendimentos, é também factual que, no último mês, atingimos a capacidade máxima de

regeneração dos nossos ecossistemas. Ou seja, se todos os países tivessem os níveis de consumo de Portugal,

precisaríamos de dois planetas.

Estes dados são claros e preocupantes, pois estamos todos a viver a crédito. Sim, em Portugal, vivemos

acima das capacidades do planeta.

Levanta-se, assim, a questão: o que nos leva como nação, ano após ano, governo após governo, a

implementar políticas económicas tão devastadoras para o ambiente?

Assistimos, e assistiremos, neste debate sobre o Estado da Nação ao fenómeno de uma classe política em

claro estado de negação.

Negamos que continuamos a fazer crescer a economia à custa do bem mais precioso que temos: o ambiente.

O cenário é negro! Segundo a Agência Portuguesa do Ambiente, todos os sistemas de águas subterrâneas do

País estão poluídos devido aos efeitos da agropecuária intensiva.

Nesta matéria, o Governo e o Parlamento têm andado de mãos dadas, incentivando e apoiando

financeiramente estes setores, porque para estes os resultados do produtivismo sobrepõem-se aos valores

ambientais.

A CAP (Confederação dos Agricultores de Portugal) manda, o Parlamento obedece, o Ministro do Ambiente

não se opõe e o Ministro das Finanças passa o cheque: eis a equação perfeita da política agrícola nacional. A

fatura da degradação galopante dos ecossistemas, essa, pagamo-la todos nós.

Pelo contrário, a Estratégia Nacional para a Agricultura Biológica apenas existe no papel, sem qualquer apoio

para a sua implementação. Trata-se de um paradoxo, na medida em que o País continua a não investir em

formas sustentáveis de produção de alimentos saudáveis, uma fileira em franco crescimento em toda a Europa

que Portugal não está a acompanhar. O debate sobre a agricultura em Portugal resume-se à quantidade dos

milhões que vamos ou não conseguir aos fundos comunitários.

O estado de negação reflete-se também no que diz respeito à política energética. É inegável que houve uma

mudança no discurso político. Se inicialmente a narrativa do Primeiro-Ministro e do Ministro do Ambiente

passava meramente por conhecer os recursos geológicos do País, hoje o Governo já assume a contradição de

querer descarbonizar a economia e cumprir as metas de Paris, explorando petróleo na costa portuguesa. Mas

mais incompreensível é estarem a ser ignorados os apelos das populações, dos municípios e da comunidade

científica para travar esta exploração.

Surpreendentemente, e em contracorrente, o Governo socorre-se dos pareceres da APA (Agência

Portuguesa do Ambiente), que não mais é que um departamento do Ministério da Economia, para nos fazer

acreditar que as opções energéticas do País são apenas técnicas e não políticas.

Também no turismo se vive o estado de negação. Queremos crescer a todo o custo e os resultados são a

gentrificação das cidades, o brutal aumento das rendas de quem nasceu e sempre viveu nos bairros e a

massificação insustentável da oferta turística. E a este cenário de desordenamento acresce a aposta errada do

Governo na construção do aeroporto do Montijo sem a realização de uma avaliação ambiental estratégica. Mais

uma vez, os valores ambientais estão a ser subjugados pelos interesses económicos.

Uma vez que a memória não é curta, é impossível não recordar os incêndios do ano passado. Os infratores

saem impunes, ainda não existem faixas de segurança em todo o território, os municípios, como já nos

habituaram, aliás, não querem assumir responsabilidades, os bombeiros operam sem os meios devidos, faltam

vigilantes da natureza e os sistemas de comunicação em casos de emergência não são fiáveis. Mas o problema

de raiz está na forma como olhamos para floresta: apenas como um mero bem económico em vez de a

encararmos como um ativo ecológico.

Mesmo a nível macroeconómico e financeiro, continuamos em estado de negação. Em vez de optarmos por

iniciar o processo de negociação da dívida externa, libertando assim o País do peso dos juros e acrescentando

liquidez à economia, aguardamos o aval dos omniscientes mercados e da omnipresente burocracia europeia.

Neste impasse, o Governo continua com dificuldades em financiar o Serviço Nacional de Saúde, em concretizar

o descongelamento na progressão das carreiras dos docentes e em priorizar, de uma vez por todas, o setor da

cultura.

Sr.as e Srs. Deputados, Sr. Primeiro-Ministro, Srs. Membros do Governo, termino, alertando para o facto de

o défice que Portugal enfrenta ser, sobretudo, de natureza ecológica. De nada nos vale tentar solucionar as