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I SÉRIE — NÚMERO 59

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Em Portugal, há um amplo consenso político, transversal a todas as governações, que permitiu construir um

quadro legislativo exigente de prevenção e combate à violência de género. Está em vigor o Plano de Ação para

a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e à Violência Doméstica, no quadro da estratégia

nacional Portugal + Igual.

Há, atualmente, instrumentos que resultam de recomendações internacionais, do Conselho da Europa, como

as do GREVIO (Group of Experts on Action Against Violence Against Women and Domestic Violence), e de

recomendações nacionais, como as da Equipa de Análise Retrospetiva de Homicídio em Violência Doméstica,

que nos indicam os caminhos, que não existiam e por onde seguir.

As mulheres, hoje, têm mais coragem para denunciar e começam a perder o medo e a vergonha que as

levava a silenciar estas agressões, mas muitos desses apelos são desvalorizados.

Temos uma rede e um sistema de proteção estruturado e apoios territorializados em todo o País, temos

formação para públicos estratégicos, temos uma nova lei, de 2017, para proteger as crianças em situações de

violência doméstica entre os seus pais que, devidamente aplicada, reforça a comunicação entre os tribunais de

crime e família, temos um programa de educação para cidadania generalizado, este ano letivo, a todas as

escolas, mas, segundo o GREVIO, apesar de Portugal ter dado passos significativos contra a violência

doméstica, ainda há muito trabalho a fazer.

Nomeadamente, há uma cultura judicial muito desculpabilizante deste tipo de agressões; há um sentimento

forte de impunidade relativamente a este tipo de crime; há uma dupla vitimação sofrida pelas mulheres e filhos

quando são obrigadas a fugir das suas casa e a refugiarem-se em casa de abrigo; há baixas taxas de

condenação — 85% das queixas não resultam em acusações.

Fala-se hoje, e o GREVIO di-lo, de falsas queixas, mas esse grupo também diz que as falsas queixas são

poucas. Essa é uma falsa questão e os números estão aí para o provar.

Sr. Primeiro-Ministro, colocou forte este impulso político para se fazer este combate ao mais alto nível. A

pergunta que lhe quero deixar é a seguinte: no respeito pelo princípio da separação de poderes, que mais se

pode fazer, além de tudo o que tem vindo a ser feito, para diminuir a impunidade dos agressores?

Aplausos do PS.

O Sr. Presidente: — Para responder, tem a palavra o Sr. Primeiro-Ministro.

O Sr. Primeiro-Ministro: — Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Elza Pais, precisamente, logo a seguir a esta

Sessão, terei a oportunidade, conjuntamente com a Sr.ª Ministra da Presidência, a Sr.ª Ministra da Justiça, a

Secretária de Estado Adjunta e da Administração Interna e outros membros do Governo, de reunir com a Sr.ª

Procuradora-Geral da República, os comandantes e diretores nacionais das forças e serviços de segurança,

com o responsável pela comissão de análise retrospetiva do crime e com os elementos da comissão técnica,

criada na semana passada, para o desenvolvimento e a análise desta situação.

Vamos precisamente procurar identificar quais são as questões práticas que podemos resolver para,

independentemente daquilo que já está disposto na lei, evitar que o conjunto destes factos não seja devidamente

valorizados em toda a cadeia processual até à fase da condenação.

Obviamente, devemos respeitar o princípio da separação de poderes na fase de julgamento, mas não

podemos deixar que, na fase de denúncia, na fase de inquérito, na fase de investigação, esses dados não sejam

devidamente considerados. E muitas vezes isso acontece, como tem vindo a ser detetado pela comissão que

tem feito a análise retrospetiva, pela forma como a prova é recolhida, tratada e conservada, ao longo de todo o

processo. O que, aliás, é muitas vezes simples de compreender, pelo seguinte: uma coisa é a emoção com que

cada um de nós depõe, outra coisa é a frieza com que esse depoimento é naturalmente passado a escrito; uma

coisa é a forma como nós ouvimos de viva voz o testemunho, outra coisa, completamente distinta, é como lemos

um depoimento que foi passado a escrito; uma coisa é aquilo que a testemunha diz ou a queixosa diz, a quente,

no momento em que está a sentir a dor, em que teve a coragem de romper e de ir ter com as autoridades e

pedir auxílio e outra coisa é, porventura, o que dirá, meses depois, quem sabe até num contexto familiar já

distinto, às autoridades quando vem ser ouvida, numa fase ulterior do processo.