21 DE FEVEREIRO DE 2020
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Mas queremos também deixar claro que esta proposta em nada, em absolutamente nada, contribui para
reduzir, aligeirar ou desresponsabilizar o Estado relativamente ao seu dever de garantir o acesso dos doentes
aos cuidados paliativos e de assegurar uma boa rede de cuidados continuados, com o objetivo de prevenir e
aliviar o sofrimento físico, psicológico, social e espiritual, e melhorar o bem-estar e o apoio aos doentes e às
suas famílias, quando associados a doença grave ou incurável, em fase avançada e progressiva. Os Verdes
continuarão, como fizeram até agora, a lutar pelo alargamento e pela melhoria da rede de cuidados continuados
e paliativos.
Que fique igualmente claro que esta proposta não implica obrigar ninguém a escolher antecipar a sua morte.
Ninguém é obrigado, nem sequer incitado, a fazer essa opção. De resto, a garantia de não influência ou pressão
de qualquer ordem sobre a pessoa em causa é um pressuposto que o Partido Ecologista «Os Verdes» acautela
na proposta que apresenta.
E não só ninguém é obrigado a optar, como também, na perspetiva de Os Verdes, tanto deve ser respeitada
a vontade de uma pessoa que, perante uma situação-limite de dor e sofrimento intolerável, causados por doença
terminal, não concebe a antecipação da sua morte, como a vontade de outra pessoa que, nessa mesma
situação, decide que a mesma acabe, breve e tranquilamente, através dos procedimentos da morte
medicamente assistida.
É a vontade da pessoa, portanto, que deve ser respeitada e, para isso, o Estado, a nosso ver, não deve
proibir a possibilidade de se fazer essa opção, em situações e processos muito bem definidos. O que se visa,
efetivamente, garantir é que o princípio de proibição de atender à liberdade e à vontade da pessoa dê lugar ao
respeito pelo princípio da sua dignidade, da sua autonomia e da sua soberania, enquanto pessoa capaz e
consciente de determinar e escolher o que quer e o que não quer da sua vida.
Mas, na mesma linha de pensamento, não se obrigam os profissionais de saúde a acompanhar e a auxiliar
na antecipação da morte de uma pessoa que padece, em absoluto sofrimento, de doença fatal, no caso de esse
ato ferir os seus próprios princípios e convicções, sejam eles de que ordem forem. Por isso, o Partido Ecologista
Os Verdes prevê o direito à objeção de consciência por parte dos profissionais de saúde.
Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: A nível médico, e a nível da prestação dos cuidados de saúde, ao
mesmo tempo que se exige o reforço e o investimento na capacidade de tratamento e de resposta perante a
doença grave, a autodeterminação do doente tem feito o seu caminho, sendo hoje inadmissível a permanência
absoluta do paradigma herdado de Hipócrates, que menoriza o doente na sua vontade e na sua dignidade.
Exemplo disso é a previsão do consentimento informado, a definição do regime das diretivas antecipadas de
vontade, designadamente sob a forma de testamento vital, e também aqui se pode enquadrar a rejeição da
obstinação terapêutica.
A morte medicamente assistida consiste na possibilidade de o médico facultar, de forma controlada, uma
morte digna, em paz, sem sofrimento, a quem a pede, encontrando-se em estado de doença terminal ou com
profunda incapacidade, incurável, em agonia intolerável. E, como naturalmente se exige, o pedido do doente
não pode ser considerado leviano, irrefletido ou precipitado.
Se é verdade que estamos a falar do bem jurídico que mais proteção jurídica deve ter, que é a vida, também
é verdade que, em bom rigor, tão importante bem jurídico não se restringe apenas ao direito à vida, inclui também
o direito a decidir como e quando se quer terminá-lo, e, se se decidir abreviá-lo, uma vez que não existe o dever
ou a obrigação de viver, também se torna compreensível que se entenda restringir essa possibilidade a situações
excecionais e a um processo ponderado, cuidado e respeitador sobretudo do doente, mas também da sua
família.
Deve, neste ponto, referir-se que, das audições que a Assembleia da República levou a cabo no âmbito da
apreciação e exame da Petição n.º 103/XIII, que pretendia a despenalização da morte medicamente assistida,
ficou claro, para Os Verdes, que não existe qualquer impedimento de natureza constitucional à despenalização
da morte medicamente assistida.
É contudo, bem sabemos, uma decisão extrema, que não pode ser banalizada, e que, como tal, deve ser
rodeada das mais devidas cautelas e garantias, mas que, simultaneamente, não se pode eternizar num inferno
burocrático que aumente a ansiedade e o sofrimento do doente.
Deve ser, na perspetiva do Partido Ecologista Os Verdes, um processo clínico, cujo desenvolvimento, não
prescindindo de um médico titular do processo que o acompanhe até ao final, deve envolver outras instâncias,