I SÉRIE — NÚMERO 32
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Depois, há outras questões para salientar. Esta proposta também não concretiza da melhor forma o objetivo
a que se propõe. Porquê? Porque, a ser, então que fosse obrigatório, como aqui foi dito. Se não for obrigatório,
também não resolve completamente o problema.
Mais: qual é, de facto, a natureza das organizações? E as outras associações? E os clubes, associações
ambientalistas, animalistas, desportivas, solidárias? Ficam de fora? Também não é muito evidente.
Há, ainda, uma outra coisa que queria deixar claro: para nós — e, isto, sim, seria inconstitucional —, não se
pode envolver nesta matéria, em circunstância alguma, organizações de natureza religiosa. É uma fronteira
intransponível, porque está na Constituição, e, historicamente, percebe-se porquê. Perguntar às pessoas se
perfilham ou não determinada religião é inaceitável, inclusive historicamente, independentemente da confissão
ou da religião a que pertençam. Portanto, neste caso, há uma fronteira.
Por outro lado, a declaração negativa causa-nos alguma confusão. Ou seja, eu, cuja declaração acabei de
fazer — são conhecidas as minhas filiações partidárias e clubísticas, e mais não tenho —, sou obrigado a
declarar que não tenho filiação a organizações ou associações? Não me faz muito sentido, pelo que tenho
algumas dúvidas.
Para terminar, achamos, ainda assim, que a iniciativa é louvável e permite um debate que é importante e
relevante. E que fique aqui muito claro que não será pelo CDS que esta iniciativa não terá aprovação e não
chegará à especialidade. Por nós, esta iniciativa deve ser aprovada e chegar à especialidade, para aí tentarmos
limar estas dúvidas, arestas e dificuldades e chegarmos a uma solução que seja consensual e traga mais
transparência.
Aplausos do CDS-PP.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado Pedro Delgado Alves.
O Sr. Pedro Delgado Alves (PS): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: O debate para o qual hoje fomos convocados, através do projeto de lei apresentado pelo PAN, é, efetivamente, importante no quadro daquilo que
deve ser a forma como as instituições parlamentares e as outras instituições públicas encaram a transparência.
Muitas vezes me é dito, até, que tenho fama de ser daqueles que quer ir longe demais na transparência e,
às vezes, «levo na cabeça» do meu grupo parlamentar — penso que não é vergonha nenhuma dizê-lo, pois não
concordamos todos com o nível de extensão a que se chega em determinadas matérias —, pelo que,
seguramente, posso puxar de alguns galões para dizer que não se deve confundir, como o Sr. Deputado João
Cotrim de Figueiredo bem disse, transparência e voyeurismo.
Em matéria de direitos fundamentais, é necessário identificar — e é disso que se trata —, com clareza,
quando operamos restrições e quando as introduzimos na lei e, mais do que isso, é importante conhecer a
História, é importante conhecer o impacto da simbologia que colocamos nas iniciativas que fazemos.
Estranha forma esta de comemorarmos o bicentenário do constitucionalismo, sob o olhar atento de Manuel
Fernandes Tomás, uma obsessão minha nesta Câmara. Não é só o Sr. Deputado João Cotrim de Figueiredo
que elogia os liberais de 1820, também eu acho que lhes devemos a construção da democracia e do liberalismo,
a construção do constitucionalismo, a construção da República. Aliás, a iconografia que podemos ver nesta Sala
não é alheia às opções que tomamos e vertemos nas iniciativas legislativas.
De facto, o PAN apresenta-nos uma iniciativa sobre associações secretas ou «discretas». O Sr. Deputado
André Silva — ia chamar-lhe José Cabral, mas corrigi-me a tempo —, quando usou da palavra, deu nota, com
clareza, daquilo que identifica como alvo fundamental da sua iniciativa, que é a Maçonaria, tendo colocado em
cima da mesa argumentos que podem ser atendíveis sobre transparência, sobre a forma de sabermos se
vinculações externas à função parlamentar, ou a qualquer função política, devem ou não ser escrutinadas.
Mas, como já foi dito nesta Câmara por muitos Srs. Deputados, se o objetivo é pôr tudo a nu e em cima da
mesa — toda e qualquer filiação, toda e qualquer possível fonte de um constrangimento ao exercício do mandato
parlamentar —, então, esta iniciativa peca, manifestamente, por defeito. Pergunto onde estão as referências à
filiação clubística, tantas vezes tradutora de uma muito maior irracionalidade, tantas vezes tradutora de um muito
maior conflito de interesses, tantas vezes tradutora daquilo que pior a sociedade portuguesa tem, em
contraponto, eventualmente, com instituições, tenham elas pessoas boas ou más — todas têm, infelizmente, e