I SÉRIE — NÚMERO 32
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à Assembleia da República, mas não só, a defesa da transparência no exercício de funções públicas é um
caminho que importa e se impõe continuar por todos os motivos e até por uma cultura de responsabilidade
democrática. Uma defesa, aliás, que é ou deve ser um dever central num Estado de direito democrático.
Portanto, face ao que fica dito, temos muitas reservas sobre o contributo real e efetivo desta proposta no que
se refere à transparência que deve nortear o exercício de cargos políticos e de cargos públicos. Essas reservas
não decorrem do facto de a proposta consagrar um campo autónomo para a menção negativa da filiação em
associações ou organizações discretas, no âmbito da declaração única de rendimentos, património, interesses,
incompatibilidades e impedimentos, mas, sim, pelo facto de essa proposta manter a natureza facultativa dessa
referência ou menção.
De qualquer forma, dando o benefício da dúvida, Os Verdes não votarão contra esta proposta do PAN.
O Sr. Presidente (António Filipe): — Apelo aos Srs. Deputados presentes que ainda não tenham tido oportunidade de se registar que o façam, para que se proceda à verificação final do quórum, embora tenhamos
já quórum mais do que suficiente.
Para uma intervenção, tem a palavra o Sr. Deputado João Oliveira.
O Sr. João Oliveira (PCP): — Sr. Presidente, Sr.as e Srs. Deputados: Esta iniciativa do PAN é um contributo para uma reflexão que devemos procurar continuar a fazer em torno das condições que garantam a máxima
transparência possível no exercício de cargos políticos e altos cargos públicos. Diria que essa reflexão nunca é
negativa, mesmo que não haja concordância com as iniciativas propostas.
Naturalmente, há situações que têm de balizar a discussão que estamos a fazer, porque julgo que alguns
dos exemplos dados e das situações concretas trazidas a debate fugiram muito à discussão que teremos de
fazer a partir da proposta do PAN. Situações que constituam a prática de crimes de corrupção, de tráfico de
influências e outras que tais não são objeto desta iniciativa. Essas situações terão de ter o devido combate e
repressão do ponto de vista penal, e é nesse ponto de vista que têm de ser colocadas.
Não é do ponto de vista da transparência que se pode encontrar resposta a problemas criminais, da prática
de corrupção e tráfico de influências, até porque a resposta a esses problemas estaria muito para lá daquilo que
a iniciativa do PAN propõe. Manifestamente, esta iniciativa não seria adequada para combater essas situações,
porque, em termos penais, era preciso muito mais do que o que o PAN propõe.
O que o PAN propõe remete-se a uma outra matéria, que tem que ver com as condições de transparência
no exercício de cargos políticos e altos cargos públicos, o que justifica uma reflexão aprofundada.
Queria, agora, partir para a clarificação de uma interpretação errada, que registei em algumas intervenções
e que acho que deve ser corrigida. Aquilo que já hoje existe não é uma declaração facultativa relativamente às
matérias que o PAN aqui traz, aquilo que hoje existe na obrigação declarativa que já está prevista na lei é uma
declaração obrigatória. Repito, obrigatória! O preenchimento daquele quadro que já hoje existe, nas outras
situações, não tem caráter facultativo, tem caráter obrigatório e refere-se a situações que possam gerar
incompatibilidades e impedimentos.
Portanto, o que hoje existe é a obrigação de preenchimento de um quadro relativo a outras situações que
podem gerar incompatibilidades e impedimentos.
Ora, aquilo que o PAN propõe não se sobrepõe a isto. O que o PAN propõe pode ser, quando muito,
complementar ao que já hoje existe e que é uma declaração facultativa da pertença a determinado tipo de
organizações, que o PAN caracteriza como «discretas», e que vai para lá das incompatibilidades e dos
impedimentos, já não se remete apenas a estes aspetos. Portanto, seria uma declaração que permitiria a
menção, ainda que negativa, à filiação ou à ligação a associações ou organizações que exijam aos seus
aderentes a prestação de promessas de fidelidade ou que, pelo seu secretismo, não assegurem a plena
transparência sobre a participação dos seus associados.
Ainda assim, aquilo que o PAN descreve como uma realidade à qual se aplica esta possibilidade de
declaração não é uma realidade homogénea, é uma realidade, digamos assim, que comporta dois tipos de
circunstâncias relativamente à pertença a determinado tipo de organizações.
Primeiro problema que temos pela frente: a declaração deve ser facultativa ou obrigatória? O PAN apresenta
a solução possível, porque, criando uma obrigação declarativa relativamente a estas situações, dificilmente se
consegue ultrapassar problemas de inconstitucionalidade, que são fáceis de identificar e que, em alguns